Creio que esta terá sido a minha sétima presença nos últimos dez anos em Taizé. Recordo com especial carinho todas as descobertas da primeira vez, desde que saímos do Colégio: a descoberta de uma nova forma de ver as pessoas que julgava já conhecer, a conversa partilhada ao longo da viagem, a batida do Delicate de um ainda desconhecidíssimo Damien Rice a bater-me nos ouvidos com ligação direta ao mais fundo dos fundos, a chuva miudinha enquanto saíamos de Lourdes rumo a Taizé. Chegamos lá era noite escura de domingo, perdêramos a oração da noite, mas fui atrás de uns alunos que, mal chegáramos, correram para a capela. E não percebi porque tinham corrido tanto. A capela era feia, estava despida, e não tinha nada a ver com aquilo que esperava. O que aconteceu depois é conhecido: caí de queixos, chorei baba e ranho, e senti-me remexido por Deus e completamente renovado. Nunca, como nessa altura, me tinha sentido verdadeiramente abençoado por Deus.

É sabido que a primeira vez não se esquece. O que não significa que as seguintes percam sabor. Pelo contrário. Tirando os momentos iniciais da segunda vez - em estava demasiado à espera de um remake - rapidamente aprendi a deixar-me ir e a saborear o que me ia sendo dado a descobrir. Uns anos foram mais pessoais, outros mais partilhados, noutros os alunos exigiam mais vigilância e inquietação, e noutros ainda os meus estados interiores não conseguiam encontrar eco no que se passava fora de mim. Em todos esses anos adorei Taizé, aprendi imenso com as partilhas, conheci pessoas fabulosas que alimentaram e reforçaram ainda a minha gratidão e necessidade de louvar a Deus por trabalhar onde trabalho e com quem trabalho. Recentemente tive que engolir um "dizes isso todos os anos" porque, na realidade, sinto isso todos os anos. Deixo-me embriagar pelo melhor dos outros com extraordinária facilidade e esta sensação de pequenez diante de quem é muito mais do que eu faz-me sempre sentir um privilegiado. Sou-o, evidentemente.

Mas há alturas na vida em que parece que os astros se alinham e tudo conflui. Será, provavelmente, quando necessitamos todos de um olhar mais atento, de uma palavra certa, de uma fragilidade partilhada que precisa de respostas, ou de um ombro, ou de um sorriso, ou de lágrimas. A sensação que tenho é que todos estávamos em sintonia este ano. Todos precisávamos uns dos outros, de nos ouvirmos, de nos escutarmos, de nos redescobrirmos, de nos aprendermos. Uns nos outros. Que todos tínhamos a palavra certa para dar e a pessoa certa para a receber. E que todos a fomos dando, e todos a fomos recebendo, cada um no seu tempo, cada um na sua sabedoria, cada um na sua fragilidade, e que nos fomos colocando, todos, na nossa sabedoria e na nossa fragilidade, em cima da mesa para que cada um se servisse dela, consoante a sua necessidade. E todos, absolutamente todos, fomos, simultaneamente, servos e senhores, uns dos outros, uns nos outros.

Há memórias que o tempo não se atreve a me apagar. Que uso como referência quando tento explicar como é o Reino de Deus, como é viver na alegria partilha, como é importante encontrarmos refúgio fora de nós, como é importante partilharmos o que verdadeiramente somos, sem medos ou subterfúgios, sem porcarias que nos roubem de nós próprios e dos outros.

Agora tenho mais uma. E estou imensamente grato, a todos, por isso.

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