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A mostrar mensagens de maio, 2014
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Aqui há uns tempos disse a uma amiga que poderia morrer porque tinha a sensação que tinha cumprido a minha vida. Não é que me apeteça morrer, ou que ache que nada mais tenho a fazer. Nada disso. É que já fiz um filho, já plantei uma árvore e, se não escrevi livros, farto-me de o fazer por essa blogosfera fora. Sinto muitas vezes que a minha vida tem enredo suficiente para poder ter sido muitas vidas. E tem-no, efetivamente. Frequentemente, questiono-me o que seria a minha vida se, em vez de ter virado à esquerda o tivesse feito á direta; se, em vez de dizer sim, tivesse dito não; se, em vez de me atirar de cabeça, tivesse tido mais juizinho, como tantos me pediam. Por várias vezes estive próximo do abismo, por várias vezes estive os píncaros, por várias vezes habitei a lua, nos lugares mais improváveis para um puto de Contumil. Ainda esta semana, enquanto me deliciava na Casa da Música, pensei nisso: quem diria que um miúdo meio amedontrado, meio abismado, estaria, naquela altura,
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Quem de nós, hoje, ao acordar, pensou: "hoje vou ser pequeno."? Quem de nós, hoje, ao escolher a roupa, escolheu: "hoje vou ser pequeno."? Quem de nós, hoje, ao conduzir na azáfama matinal, decidiu: "hoje vou ser pequeno".? Quem de nós, hoje, podendo, tendo a força, tendo a forma, tendo a capacidade de o fazer, optou ser o  pequeno, aquele que faz o que mais ninguém se dispõe a fazer, aquele que diz o que mais ninguém se dispõe a dizer, aquele que vê o que mais ninguém se dispõe a ver e deixa que todos, absolutamente todos, usem e abusem possam ser o que quiserem ser como quiserem ser quando quiserem ser. Quem de nós, hoje, se deixa utilizar e se deixa manipular, servindo-se, e aceita depois ficar de lado ignorado completamente ignorado, ostensivamente ignorado como se nunca sequer tivesse existido? Quem de nós, hoje, ao acordar pensou: "hoje quero ser pequeno... ...como o meu Deus!"?
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Nem de propósito! Queixava-me eu que precisava do belo e ontem tive a rara oportunidade não só de o ver como de o sentir a envolver todos os meus sentidos. Fomos à Casa da Música assistir ao espetáculo com o Rodrigo Leão e o Olafur Arnalds. Se já conhecia e sou profundo admirador do primeiro - daí este presente de Natal da minha mais-que-tudo - o segundo foi uma extraordinariamente agradável surpresa. Ás tantas, enquanto escutava aquela gestão do silêncio, perguntava-me porque não fazíamos estas coisas mais vezes: um bom jantar, um bom namoro, um bom espetáculo, e saímos renovados na nossa humanidade. Por vezes deixamo-nos enredar no quotidiano, numa emaranhado de compromissos connosco e com os outros que esquecemos que estas coisas também .nos trazem humanidade. Não chegam, é certo, mas contribuem para que demos Graças pelo que somos. Recordo-me de um extraordinário filme sobre a Segunda Guerra que começa justamente por um quarteto de cordas a tocar numa vila destroçada. Sempre
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Confesso que já o esperava há muito tempo! E finalmente chegou! O "ele agora não nos liga nenhuma, já não escreve nada nem quer saber de nós" estava-me destinado. Merecidamente, claro, que a boca que o proferiu não é de deitar palavras à rua. Eu sorri, tentei uma justificação trapalhona, como todas as minhas justificações, mas sabíamos todos que tinha sido certeiro. E merecido. A questão é que eu preciso de muito para publicar o que escrevo. Não aqui, onde nada me obriga nem me impele a não ser esta necessidade de botar carateres, muitas vezes à toa. Mas num qualquer outro sítio, num qualquer outro blogue, numa qualquer outra plataforma que, de certa forma, vincule outros que não eu, aí a coisa pia mais fino. E a verdade é que não tenho conseguido ter disponibilidade mental nem para ver nem para escrever coisas que valham a pena serem lidas. Logo após ter escutado a boca, deu-me uma enorme saudade do belo. Não era nada normal em mim isto acontecer. Se calhar porque se li
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Tento sempre não cristalizar. Ficar atento ao que me rodeia, ver com olhos de descobrir, ponderar e voltar a ponderar, soltar-me as amarras. O vício do novo acompanha-me desde que sou gente: as notícias, a informação, as últimas tendências, exercem sobre mim um fascínio que não consigo explicar. Ao mesmo tempo, no entanto, e contraditoriamente, um enorme respeito pelo velho, pelo sábio, pela história, da vida e das pessoas, constitui uma âncora absolutamente imprescindível que me impede de navegar ao sabor das marés. Tentar conciliar estas minhas duas vertentes torna-me contraditório e difícil de ler aos olhos alheios. Tenho um lado inato para ser advogado do diabo. Numa discussão, se muita gente puxa para um lado, a minha tendência natural é ver o outro lado da questão. Têm-me acontecido alguns olhares surpreendidos à custa disso. Como eu os compreendo!
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O próximo numero do Poço é sobre a santidade. Artigo de fundo: Zé. Ri-me logo: só pode ser ironia!. Desde que me lembro que contesto os processo de santidade do Vaticano. Tive a sorte de conhecer algumas pessoas que, aos olhos do Deus que eu amo e me ama, não duvido que sejam santas e estejam, nesta altura, sentadas junto do Pai. Não precisaram nunca de processos de canonização, de estudos teológicos caríssimos, de descobertas de milagres que a ciência não consiga explicar. Aliás, todas elas, se alguma vez, em vida, lhes tivesse sido proposto algo desse género, tinham caído para o lado de susto. Em primeiro lugar porque não era essa. de todo, a imagem que tinham delas próprias, mas a oposta, a de simples e pecadores que precisavam mais do perdão do Pai que dos altares. Depois, porque todos eles se sentiam, invariavelmente, pequenos. Aos olhos de Deus mas também aos olhos dos homens. eram formiguinhas, trabalhadoras, preocupadas, sempre atentas, para que nada do que pudessem fazer ou
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Eu escrevi um poema triste E belo, apenas da sua tristeza. Não vem de ti essa tristeza Mas das mudanças do tempo, Que ora nos traz esperanças Ora nos dá incerteza... Nem importa, ao velho Tempo, Que sejas fiel ou infiel... Eu fico, junto à correnteza, Olhando as horas tão breves... E das cartas que me escreves Faço barcos de papel! Mário Quintana Acontece-me por vezes ficar triste comigo mesmo. Que é diferente de ficar zangado. E mais grave! Fico zangado quando falho com alguma coisa. Fico triste quando falho com alguém. É muito diferente! Quando falho com alguma coisa, não me é muito complicado encaixar essa falha. Não sou uma máquina, tenho sempre mil e uma coisas para fazer, ando sempre a correr de um lado para o outro e, cá por dentro, não espero ter o grau máximo de eficácia. Esforço-me ao máximo, empenho-me ao máximo, mas sei que tenho limites e que chego até eles muitas vezes. Zango-me comigo quando as falhas são evidentes e deveriam ter sido por mim previstas.
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Ao jantar, em Santiago, conversava com o Padre Almiro sobre as diferenças entre o Caminho e a Peregrinação a Fátima. Antes que eu formulasse a minha recém descoberta constatação, ele confirmou-a: "a peregrinação a Fátima é espiritual, nasce da dor e complementa-se na oração; o caminho de Santiago tem outro tipo de espiritualidade, nasce do próprio caminho. Mas não é devoção." Este ano, em que no espaço de 15 dias tive a oportunidade de caminhar para ambos os destinos, não mudou o que sinto. Se me convidassem para fazer ambas as peregrinações, optaria sempre por Santiago. Tem muito mais a ver comigo. O caminho mais como descoberta e menos como cumprimento de promessa; o caminho mais como partilha e menos como sofrimento silencioso, e silenciado; o caminho mais como alegria de sentido e menos como sentimento de dor. Isso não quer dizer, no entanto, que não tenha um profundo respeito pelos peregrinos de Fátima. Num recente programa de televisão, entrevistaram uma série de p
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Perguntam-me algumas vezes se o facto de trabalharmos juntos não é um entrave para o nosso casamento. Particularmente por causa do Centro onde, desde há um ano para cá, a minha-mais.que-tudo é a minha coordenadora, a minha chefe, e isso faz confusão a muita gente. Respondo que não, claro. Para começar, eu fui um dos que a indicou para chefe: reconheço nela capacidades evidentíssimas de desempenhar essa função, bem melhores que aquelas que eu próprio tenho. Depois, eu sempre fui muito melhor como número dois que como número um. Adoro a fase de discussão das ideias, de apresentação de projetos, de procura de alternativas, a confusão ordenada do brainstorming que está na origem do que fazemos. Mas depois, passada fase da discussão, sou muito melhor a fazer que a coordenar. Como disse alguém que também tem a função de me coordenar num outro lugar, eu confio em demasia nas pessoas, sou demasiado otimista em relação àqueles que comigo fazem coisas e tenho dificuldade em avalia-los com jus
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Quando chegamos a casa, a pergunta impunha-se: "já imaginaste o que é viver sem futuro?" Poucos minutos antes tínhamos estado com um casal amigo, com quem fizemos um CPM há uns anos. Gente boa, simples, despretensiosa, da que dá o devido valor à vida vivida. Sabíamos que ela andava com problemas por causa de um cancro, mas não tínhamos voltado a estar juntos desde então. Eles lá andavam satisfeitos, às compras no Modelo, tal como nós, como se nada se passasse. Não fosse a máscara na cara e o cabelo ralo e, como de costume em mim, nunca me teria lembrado da história do cancro. Cumprimentamo-nos, rimos juntos, conversamos, perguntamos pelos filhos uns dos outros, com a cumplicidade natural dos casais que, fruto da preparação do CPM, já partilharam muita coisa da vida pessoal de cada um, e continuamos o nosso caminho. Do cancro, nada. Não falamos, não perguntamos, não desejamos as melhores, nem força ou coragem. Acontece-me por vezes desvalorizar o testemunho sem palavras.
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Não se pode afirmar que tenha sido uma conversa inócua. Não tinha que o ser. Não convém nunca sê-lo, quando essa conversa acontece entre duas pessoas que fazem questão de partilhar como vivem: sem nada na manga. Perla enésima vez ouvi, nestes últimos tempos, sempre dito por quem, de alguma forma, de ama, que estou diferente. Desta vez foi acrescentado o "desde que foste para o Centro". Apesar de toda a abertura, apesar de todo o caminho, apesar do todo que nos une, a sensação com que fiquei, até pelo veio depois, foi que algo tinha escapado da boca para fora, vindo diretamente de dentro. Ainda bem. Como sempre acontece com o que considero verdadeiramente importante, o "estás diferente" armou tenda e acampou. Sim, eu sei. Eu próprio noto essa diferença. Não sei ainda se é coisa boa, má ou assim assim, mas eu noto essa diferença. E também noto que, como me foi dito, estou menos tolerante com coisas que antes aceitava na maior, e encaixo outras com maior facilidad
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«Está aqui um rapazito q ue tem cinco pães de cevada e dois peixes. Mas que é isso para tanta gente?» Jesus respondeu: «Mandai-os sentar». Havia muita erva naquele lugar e os homens sentaram-se em número de uns cinco mil. Então, Jesus tomou os pães, deu graças e distribuiu-os aos que estavam sentados, fazendo o mesmo com os peixes; e comeram quanto quiseram. Sempre me fascinou esta passagem do Evangelho, que é a de hoje. Fazer muito do quase nada que se tem é, no fundo, o destino de todos nós. Conheço muita gente boa que desconhecia os seus dons, as suas capacidades. Que toda a vida lhe fora dito que era pequena, e que se devia manter pequena, deixar o importante para quem sabe e pode. E que depois desabrochou, explodiu, e se tem multiplicado e feito outra gente boa com a sua partilha. Há uns anos conheci um grupo paroquial que desta passagem fazia vida concreta, de todos os dias. cinco famílias organizavam-se e ajudavam outras duas em dificuldades. Apoiavam-na em tudo o que fos