Uma das coisas que mas aprecio naquilo que agora vou fazendo - a que tenho muita dificuldade em chamar trabalho, tal é o gozo que me tem dado - é o processo de constante reinvenção. Ainda ontem, numa tardia reunião de programação de trabalhos, quando começamos nenhum de nós tinha mais que uma vaga ideia do que iríamos fazer. Depois, com naturalidade, à medida que a conversa vai surgindo, vem uma pista de um, despoleta um raciocínio de outro, e às tantas tínhamos já todo o processo devidamente delineado com a respetiva distribuição de tarefas devidamente assente. Adoro este tipo de processos. Adoro irmos descobrindo juntos o melhor caminho, que por vezes vai até em sentido contrário ao que tínhamos pensado. Adoro quando alguém dá uma boa ideia, ou emite uma opinião que nos faz a todos ver o que antes estava escondido. Adoro quando nenhum de nós se agarra a si próprio nem se vangloria por ter sido dele a primeira abordagem ao caminho seguido, mas todos nos esquecemos de quem partiu a ideia original porque tudo é de todos e como tal é assumido. Eu, que sempre me vi como um solitário - e por vezes preciso mesmo dessa solidão para conseguir pensar - descubro-me afinal a vibrar intensamente com este tipo de descobertas.

Há outras descobertas, no entanto, mais raras, mais olhos nos olhos, muito mais privadas, que me seduzem ainda mais. Lembro-me do fascínio que, era ainda miúdo, a maiêutica socrática exerceu imediatamente em mim. A ideia de sermos meros parteiros e todo o processo para conseguirmos que o conhecimento dê à luz é algo que ainda hoje me fascina plenamente. Quando começamos a conversar e, em diálogo, vamos descobrindo pistas, vamos descobrindo verdades que até aí permaneciam encobertas; quando essas verdades são afinal simples e iluminam a vida numa altura em que tudo permanecia escuro; quando essa luz se traduz num sorriso - finalmente um sorriso! - num olhar antes fechado e perdido, sinto sempre o meu dia como plenamente justificado. E o melhor de tudo é quando percebemos que isto apenas acontece com aqueles que nos abrem as portas da intimidade e nos deixam habitar em si, numa mútua partilha que tem tanto de profunda como de intensa.  O melhor de tudo é quando confirmamos que há laços que não são apenas laços mas nós, que a vida já não consegue desatar.

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