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A mostrar mensagens de junho, 2011
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Tive, ontem, uma experiência fantástica. Fui à Eucaristia ao Hospital de S. João. Já não o fazia há muito tempo - fi-lo durante alguns anos porque cantava num coro que ainda agora lá canta - o que acabou por remeter a experiência da fragilidade que lá se vive para o baú das recordações. Ontem, porém, voltou. Um dos pacientes, rodeado pela sua família, pediu a Santa Unção porque hoje vai ser sujeito a uma operação complicada. É impossível não nos sentirmos tocados por uma fragilidade assim. Pela inevitabilidade de um dia sermos nós próprios a colocarmo-nos nas mãos de outros, pela presença, comovida mas sem alarde, da família, pelo facto de o sacramento ter sido ministrado lá, no nosso meio, e não no recato da solidão ensinando-nos que, também pelo sofrimento, estamos unidos num só corpo... Nestes últimos tempos também eu tenho lidado com a fragilidade. A minha avó está cada vez mais velhinha, a minha sogra foi recentemente operada, a Tia Micas morreu há pouco tempo. São experiênc
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Não é coisa simples, amar alguém. Não me refiro à forma sublime de amar que é a da pura amizade, onde tudo é gratuitidade, nem do amor paternal, qe nos sai das entranhas e é quase obsessivo e irracional. Falo do amor a uma pessoa só, em exclusividade, em compromisso, em doação plena e voluntária de vida. Não é coisa simples, amar alguém. Principalmente hoje, no nosso tempo, em que se procura (e bem) a felicidade acima de tudo, o usufruir acima de tudo e se foge do compromisso e das dificuldades a sete pés. Num tempo em que se vende o "foram felizes para sempre" com demasiada felicidade como se duas pessoas absolutamente distintas pudessem encaixar uma na outra como que por magia, sem deixar nada para trás. Num tempo e que se pensa que a felicidade é um direito e não uma conquista, em que se dá na medida do que se recebe esquecendo que recebemos na exacta medida em que nos entregamos. Num tempo em que se esquece que amar alguém implica vontade: vontade de amar, vontade de c
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Sou muitas vezes acusado, principalmente por quem gosta muito de mim e me conhece melhor, de ter poucas referências absolutas na minha vida. É a mais pura das verdades. Talvez por não ter tido uma educação devidamente estruturada, fui construindo a minha própria escala de valores à medida que fui vivendo. Às vezes tive a sorte de uma boa influência e fiz as escolhas certas, noutras, porém, as minhas escolhas foram acontecendo à força da cabeçada na parede. Armado em sempre-em-pé lá ia avançando, de tombo em tombo, fazendo disso o meu próprio caminho. Hoje, não são muitas as coisas nas quais acredito com convicção. Acredito no papel absolutamente estruturante da família, acredito nessa pura forma de amar que é a amizade, acredito na enorme importância de se ser feliz na profissão e acredito num Deus nos ama de tal forma que dá sentido a tudo aquilo em que acreditamos. Ah, e também muito importante para mim, sou intrinsecamente portista. Defendo há alguns anos que somos felizes qu
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Há uma velha frase que diz que não se deve voltar ao sítio onde já se foi feliz. Naturalmente, não compro. Nunca compro estas frases feitas, apesar de por vezes gostar mesmo muito delas. E nunca compro porque não há como a vida. No sábado voltei a um lugar onde já fui muito feliz. Vi pessoas que me dizem muito, de quem gosto muito, e às quais voltaria de muito bom agrado... se a minha vida fosse outra. Nunca lhes consegui explicar isso. Nunca lhes disse, de forma a que me entendessem, porque saí, porque não voltei, porque não voltarei. Nunca lhes disse que, justamente porque são uma parte muito especial de mim próprio, não conseguiria nunca ser pela pela metade, na retranca, a olhar por cima do ombro. Nunca lhes consegui explicar que nestas coisas  da fé ou estou todo ou não consigo estar, e com eles, não me era possível estar mais. Por muito que o quisesse. Por muito que o queira ainda. Na semana passada, em conversa com a Pat, explicava que tinha aprendido a amar à distância, se
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Por vezes esqueço-me que também eu tenho dias assim. O final do dia foi caótico, a noite francamente má e acordei com aquele sabor a papel de música que me dá cabo das manhãs. A viagem de metro até aqui, que costuma ser tão revigorante, hoje soube-me a sacrifício. Acabrunhado, encatrafiei-me no meu LG ao longo da viagem, refugiando-me no meu pequeno mundinho feito de blogues e notícias recheadas de coisa nenhuma. Ás tantas, lá pelos lados da Trindade, levantei o olhar para Te tentar descobrir. Nada. Absolutamente nada. Se viajavas àquela hora, comigo não era de certeza. Apenas consegui ver pessoas igualmente acabrunhadas, igualmente refugiadas, igualmente recolhidas nos seus próprios pretextos para não Te encontrar. Eu era apenas mais um. Voltei a mergulhar, de cabeça, no google reader até que chegasse a Casa da Música. Chegou. Levanto-me, mochila às costas, subo as escadas estranhando a Tua tão pouco habitual ausência. Letárgico, subo as escadas e deparo-me com a chuva. Bonito. Só fa
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Não consegui resistir. Não é nada meu costume colocar por aqui coisas com destinatário. Aliás, normalmente nem penso nisso: escrevo o que me dá na real gana e o máximo que acontecerá é referir-me a algo que ainda anda cá por dentro na sequência de uma conversa mais interessante. É o caso. Em determinada altura da nossa vida queremos muito ser bem acolhidos. Em nome desse desejo comprometemo-nos com o que não gostaríamos de nos ter comprometido, dizemos e fazemos coisas das quais nos arrependemos antes sequer de abrirmos a boca. Tudo em nome da "normalidade". Como digo algumas vezes - não muitas, depende da qualidade do meu interlocutor - essa normalidade foi-me vedada à partida. Porque gaguejo sou anormal, e porque já o sou por essa via, qualquer tentativa de ser normal sempre me pareceu descabida. Claro que houve alturas em que não foi (não é) fácil lidar com os risinhos e o baile que apanhava, mas cedo me apercebi que gaguejar era, à partida, uma ferramenta muito boa
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Não acredito nada nessa coisa do Destino. Acredito que Deus tem um plano com o nosso nome, mas que nos cabe decidir se o cumprimos ou não. A cada momento. Acredito por isso no ficar atento às oportunidades que nos vão sendo colocadas no caminho e acredito que é Deus quem as coloca por intermédio de outras pessoas. Cabe-nos escolher, a cada momento, quais as que queremos seguir ou não. Se calhar, também por causa disso, nunca fui muito de correr à procura do futuro, de fazer grandes planos, mas dei sempre muita atenção ao que me ia acontecendo, àquelas pequeninas coisas que passam muitas vezes despercebidas mas que acabam por se revelar decisivas ao fim de algum tempo. Vem isto a propósito da poesia. Houve um tempo - há tanto tempo! - andava eu no 9º ano, que, despertado pelo professor Mário Soares, me apaixonei pela poesia. Nas aulas ele declamava como nunca ouvira declamar, como nunca pensara ser possível declamar. Nunca esqueci os poemas que ele nos oferecia nas aulas: Cântico Neg
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Lembro-me que quando comecei a tocar viola ficava muitas vezes intimidado com aquilo que outros, muito melhores que eu, tocavam. Em vez de isso me levar a aprender mais, a empenhar-me mais para tocar melhor, desmotivava-me por completo. Ficava dias inteiros sem lhe pegar até que o bichinho voltava e lá estava eu com a menina ao colo. Isso acontece muito, ainda. Quer com a viola, quer com a escrita, quer com outras mil e uma coisas, porque, com a Graça de Deus, vivo rodeado de pessoas cujas capacidades estão léguas acima das minhas. É frequente, por isso, ficar completamente embevecido quando leio um bom texto, oiço uma boa música, ou acompanho o nascimento de um extraordinário desenho a partir dos seus primeiros esquissos. Dou muito valor a quem o faz e normalmente faço-o sentir com facilidade. O facto de conhecer os meus próprios limites não me impede, contudo, de saborear os dons dos outros. Nem sequer me tira o gozo de escrever, nem de tocar, nem de fazer outras coisas que faço
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Lembro-me que quando comecei a tocar viola ficava muitas vezes embasbacado com aquilo que outros, muito melhores que eu, tocavam. Em vez de isso me levar a aprender mais para tocar melhor, desmotivava-me por completo. Ficava dias inteiros sem lhe pegar até que o bichinho voltava e lá estava eu com a menina ao colo. Isso acontece muito, ainda. Quer com a viola, quer com a escrita, quer com outras mil e uma coisas, porque, com a Graça de Deus, vivo rodeado de pessoas cujas capacidades estão léguas acima das minhas. É frequente, por isso, ficar completamente embevecido quando leio um bom texto, oiço uma boa música, ou acompanho o nascimento de um extraordinário desenho a partir dos seus primeiros esquissos. O facto de conhecer os meus próprios limites não me impede, contudo, de saborear os limites dos outros, Nem sequer me impede o gozo de escrever, nem de tocar, nem de fazer outras coisas que faço mal mas dão-me prazer. Ajuda-me a colocar nos meus tamanquinhos, impede-me de me coloc
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Uma das minhas maiores dificuldades -e, creio, dos nossos dias - é conseguir fazer tudo aquilo que gostaria. E é uma grande dificuldade! Assoberbado pelo trabalho, curioso pelo que vai acontecendo de último grito tecnológico e livreiro, inapelavelmente atraído pela malta nova, absolutamente viciado em notícias, a sensação que tenho muitas vezes é a de que o dia não me chega para viver. Mais ainda: quando alio tudo isto à idade que, inexoravelmente, vai avançando, sinto muitas vezes que a própria vida não me chega para o que me falta ainda viver. É terrível, isto. É terrível a sensação que a vida se nos escapa por entre os dedos, que o tempo não volta para trás, que algures está a acontecer alguma coisa que eu gostaria de fazer, onde eu gostaria de estar, com quem gostaria de estar, mas que tenho que me limitar à minha própria finitude. É ainda mais terrível para quem, como eu, tem fé. Porque sei que esta minha vida me foi dada, não para mim mas que possa ser para os outros. Mas ent
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"Estávamos diante de uma pessoa generosa e inteligente. A Maria João perguntou há quanto tempo lá trabalhava: há nove meses. Parecia, pelo entusiasmo, que era há nove minutos. Perguntámos se a congratulavam por ser tão rápida. "Sim", respondeu. Mas, quando insistimos ("Toda a gente?"), ela desabafou, contra vontade: "Não, há pessoas que passam por mim como se eu fosse um avião." É uma grande frase. É um grande pecado não ver as pessoas que são visíveis. As pessoas que lavam as casas de banho; que pintam os muros da praia; que limpam as ruas. Ou os velhos e as criancinhas que passam por nós.   São as pessoas invisíveis, a quem não falamos, que são o anjo Elias entre nós, os outros eus de Lévinas; os convidados inesperados que, se dermos por eles e nos lembrarmos deles, hão-de ajudar a salvar as nossas pobres e comprometidas almas." Miguel Esteves Cardoso, Público 2011-05-29 Até para ver como param as modas, tenho andado apostado em descob