Desde muito cedo que aprendi que é Deus quem vem ao nosso encontro e que nos preocupamos em demasia em sermos nós a proporcionar esse encontro com Deus. Provavelmente terá sido isso que Deus me queria dizer sempre que aquela miúda giríssima interrompia o nosso jogo de futebol de rua e passava, como se todos fossemos invisíveis, a caminho do ensaio que iria inaugurar a capela nova. Tantas vezes ela passou, tantas vezes tivemos que interromper o jogo por sua causa, que acabei por ir atrás dela tentar a minha sorte, e apaixonar-me, numa espécie de dois em um, porque através dela descobri uma outra forma de vida, até então perfeitamente inacessível a todos os meus sentidos. Apaixonei-me por essa miúda, teria catorze ou quinze anos, e apaixonei-me por Jesus e a minha vida mudou. Ela foi a árvore que Deus colocou no meu caminho à qual tive que trepar para ver o meu Deus que passava diante dos meus olhos.

Pensava nisto enquanto, numa daquelas belíssimas manhãs cheias de sol, caminhava pelo parque do lago, em Taizé. Por todo o lado se viam miúdos, sozinhos, em silêncio, nas suas multiplicidades de encontros. Não tinham ninguém junto deles, a vigiá-los, a mandá-los calar, a ensinar-lhes a ficar em silêncio, a dizer-lhes no que deviam pensar, em quem deviam pensar, como deveriam rezar. Eram eles e apenas eles... e Deus!

Lembrei-me do que Deus disse a Moisés quando este Lhe perguntou em nome de quem ordenaria ao Faraó para libertar o Seu povo. Sabemos todos como Deus respondeu: "Eu sou Aquele que sou". Não tenho dificuldade em imaginar que hoje Deus teria dito para o Moisés se deixar de histórias, que o nome é uma necessidade dos homens, que precisam do nome e da sua individualidade para se sentirem especiais e únicos, mas que Ele, sendo único, não precisa do nome para nada. Que os nomes que Lhe damos não passam de uma tentativa de nos apoderarmos d'Ele, de O fazermos apenas nosso, quando Ele é de todos e para todos. Que, enfim, nunca aprendemos com as nossas próprias asneiras.

E ao ver aqueles miúdos, ao partilhar o silêncio com eles, sabendo que alguns deles - tantos de nós! - não sabiam o que era o som do silêncio a não ser quando lá chegaram, sabendo que alguns deles  - tantos de nós! - nunca tiveram catequese ou nunca lhes ligaram puto, sabendo que alguns deles - tantos de nós! - apenas tinham ido sem saber muito bem ao que iam e depois se deparavam consigo próprios, pensava no que rezariam, como rezariam, se rezariam ou se apenas se deixavam estar, pensando na vida, nos testes, nas famílias, nos amigos, encontrando-se justamente - e a Deus! - enquanto pensavam nos amigos, nas famílias, nos testes, na vida!

Esse será, talvez, o grande segredo de Taizé. Não dá nome a Deus. Não O espartilha, não O limita, não O condiciona às necessidades dos homens. Taizé facilita, abre portas, cria condições, desperta os sentidos. Taizé diz-me, sempre: vem cá, senta-te, canta, deixa que te envolva, silencia-te. Porque no silêncio encontrar-te-ás, sempre, e Àquele que É. Qualquer que seja o Seu nome. Qualquer que seja o teu nome. É-o para ti. Para que O possas ser para os outros.

E sou sempre muito feliz em Taizé!

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