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A mostrar mensagens de maio, 2020

202005311530

Acabei de ler, referindo-se a alguém, que era um bom cristão. Eu não sei o que é ser um bom cristão. Ou melhor, eu sei o que é querer ser bom cristão, agora, ser bom cristão... Pegando no exemplo de alguém que me interroga muitas vezes, judas, eu tenho uma série de questões que ainda não se silenciaram porque ainda não se viram resolvidas. Eu acho que judas era efetivamente um homem de bem. Seguia Jesus, admirava Jesus, e provavelmente quando O entregou julgou estar a fazer o melhor. Ao ponto de se ter suicidado por não conseguir lidar com a vergonha que os seus atos originaram. Era uma pessoa má porque tomou uma decisão má? Não sei! Não sei mesmo. Assim como não sei o que levou os dois ladrões a serem crucificados com Jesus. Sei que para Ele isso não foi importante, apenas a vontade de um deles em acreditar e, esgotado o tempo de o poder fazer cá por baixo, de O seguir no que se seguiria. Para Jesus apenas isso contou. Na verdade, isto complica bastante o esquema. É-nos instintivament

202005210847

Lentamente, os dias vão voltando a ser dias. Na normalidade possível, na nova normalidade, como agora se diz, o ritmo vai regressando às manhãs, tomando conta do acordar. Hoje a VCI tinha já o movimento parecido ao do tempo de férias escolares: em fila mas sem paragens. Há mais gente nas ruas, mais gente nos transportes e, não fora o uso generalizado de máscaras, dir-se-ia que estávamos num qualquer dia de julho ou agosto. Não estamos. É maio, mesmo. Mas creio que, ao fim de quase três meses de vida esquisita, ansiamos todos pela normalidade.  Ainda ontem, quando, pela primeira vez nos últimos três meses, passeávamos no Parque da Cidade, víamos alguns dos nossos alunos a fazer parte da imensa multidão que mandava o confinamento às malvas e se agrupava para conviver. E a Isabel dizia que haverá muita gente que preferirá viver neste regime, onde há mais tempo e menor tensão. Há uma notória dicotomia em todos nós. Por um lado, parecemos drogados viciados, adictos em trabalho, em rotinas,

202005191015

Recordo-me que já vi este filme. Há uns anos, numa das conversas com o meu sogro, ele punha-me perante a sua perspetiva do tempo: "já viste que se eu viver até aos 85 viverei apenas mais 15 anos?" Até porque ele veio a falecer repentinamente pouco tempo depois, nunca me esqueci dessa conversa. Desta vez foi a minha sogra: "já viste como há tanta gente que esteve no vosso casamento que já não está cá?". Começamos a contar, por alto, e 3 mãos não chegavam. Entre eles, alguns amigos, mais novos que eu ou da minha idade. A finitude e a morte têm vindo a fazer parte da minha vida. Durante anos fugi dela mas, inevitavelmente, as chapadas na boca forçaram-me a enfrentá-la. Nalguns casos com imensa surpresa, dor e consternação, noutros mais naturalmente, assumindo e aceitando a morte como algo fundamental da vida. Recentemente, um amigo disse-me que estava a ser tratado no IPO. Cancro. Chapada na boca, novamente. Fico sempre abananado quando isto acontece. A vida adquire um

202005150924

Começamos o dia como gostamos: pequeno almoço seguido de uma boa caminhada, desta vez por terras de são pedro da cova. Enquanto caminhamos fazemos o que nos é fundamental: falamos de tudo o que nos vem à cabeça, sem filtros, sem escolha de assuntos ou de palavras. Falamos de coisas importantes e de coisas nenhumas, que é a massa de que é feita a nossa vida. Desta forma, naturalmente, sem disso estarmos plena e permanentemente conscientes, juntamos a massa, misturamos a massa até que ela seja uma só para que possa ir levedando durante o dia. Ao longo deste confinamento estive uma semana sem caminhar. O joelho inchou e fui despachado a gelo, anti-inflamatório e repouso. Foi a única semana em que discutimos, não faço ideia a que propósito, mas sei bem porquê: estávamos ambos em casa mas, porque não caminhávamos, porque não íamos de carro para o colégio, não estávamos juntos. Ao longo dessa semana estivemos ambos com as orelhas mergulhadas nos nossos computadores, cheios de trabalho à dist

202005132346

Tenho lido poesia. A que consigo. Como consigo, que é mal. Roubando o que à poesia não se pode roubar: o tempo. Na verdade, não sou ainda um leitor de poesia, mas um consumidor de poesia. Ainda pego num poema sem nele me deter o suficiente para que ele ecoe em mim. Como a música. Acumulo, não oiço. Guardo para um dia, sabendo que esse dia dificilmente chegará. Só se eu mudar muito. Só se eu for já outro. Só se eu der já tempo ao tempo e parte desse tempo à poesia. E à música. Será outro tempo. Será outro eu. Mas sendo o tempo outro tempo e sendo eu outro eu, eu continuarei sem saber ler poesia.

202005121039

Se me dissessem, há trinta anos, que ao fim de trinta anos estava como estou, eu não acreditaria. Trinta anos de casado vai muito para além daquilo que eu imaginaria possível em mim. Não porque não os quisesse, não porque não os sonhasse, mas porque os temia tanto que me pareciam impossíveis! Não me recordo de muitas coisas do dia do nosso casamento - o fotógrafo foi assaltado nessa noite e nem fotos temos! - e a sensação que tenho sempre que penso nisso é a de que vivia um sonho. Recordo sim que, no final do dia anterior, ao ir daquela que seria a nossa casa para a minha casa de solteiro, ia em pânico: casar era tão para além daquilo que eu merecia na minha vida que eu tinha a certeza que iria ser atropelado porque uma coisa boa dessas não me poderia acontecer. Talvez por causa disso andei nas nuvens no dia do casamento e tudo o que recordo seja muita cantoria, muita alegria, muita dança e festança como convém à dona constança. E a verdade é que não andava muito longe do que temia. A

202005011838

Estava agora mesmo a atualizar os meus contactos. Dos alunos com quem trabalho, principalmente. Dos do 12º ano, em particular. À medida que ia passando por cada um deles ia revisitando os seus rostos e, sobretudo, os nossos momentos. Este 12º foi - ainda é, mas para mim, que não dou aulas, já foi - especial. A quantidade deles que estava envolvido nos Projetos, no ComTigo, nas orações formais e informais, nas conversas formais e informais, torna esta covid particularmente difícil. E injusta. Normalmente, por esta altura, estaríamos a pensar em mais um encontro, em mais um H'Ora Bem, a preparar a sua eucaristia de finalistas, tantas vezes falada ao longo do caminho para e de Taizé, e que agora vemos gorada. Tenho pena. Muita pena. Uma pena que, se medida, apenas perderia para a saudade.