Mexeu comigo e apontei: "Nos céus de França, a descida para a morte durou oito minutos. 480 segundos. Em que é que se pensa neste tempo? Quem abraçamos? Por quem gritamos? Gritamos?" Foi escrito por Bernardo Ferrão, no Expresso Curto do dia 25 e, inevitavelmente, levou-me a fazer-me as mesmas perguntas. Em que pensaria eu nos meus últimos 480 segundos de vida? Em quem pensaria? Quem abraçaria, física ou espiritualmente? Gritaria? Confiaria? Rezaria?

Em alguns dos Dias de Reflexão do secundário perguntamos o que sentiríamos se, juntamente com a data de nascimento do cartão de cidadão estivesse também a data de óbito. Tal como as perguntas colocadas pelo jornalista, também esta é pura retórica. Não é para responder. É para fazer pensar. No que temos de mais importante, no que somos de mais importante, quem temos de mais importante, para quem somos mais importantes. Serve apenas para nos questionarmos porque corremos tanto, em nome de quê corremos tanto, onde queremos nós chegar com tanta correria. E se essa tanta correria vale a pena. Tem apenas a utilidade de colocarmos a nossa própria vida em perspectiva. As conclusões, na medida em que nos é possível tirarmos conclusões, são apenas nossas. E hipotéticas. Meramente hipotéticas. Porque nos é inimaginável viver uma situação dessas.

Creio que para quem é pai, ou mãe, ou avó ou avô, ou tio ou tia, ou irmão ou irmã, ou filho ou filha, o primeiro pensamento irá para aqueles que dependem de nós. Qualquer que seja a sua idade. Qualquer que seja a nossa idade. Qualquer que seja a nossa relação circunstancial com a nossa família mais chegada, mais próxima, mais forte, creio que seriam esses os destinatários primeiros dos nossos pensamentos. E preocupações. Creio que naquela altura, mesmo naquela altura, pensaríamos como irão sobreviver aqueles que dependem de nós. Que marcas lhes deixaremos. Como sobreviverão à perda de nós. Que memórias permanecerão. E pediria a Deus a Sua protecção para eles. Depois, se houvesse tempo, pensaríamos nos que amamos de borla, nos que nos amam de borla, sem qualquer outra dependência que não seja a do puro gozo da companhia, a do puro amor: os nossos amigos. Talvez não pensássemos já como sobreviverão sem nós, mas com sorte recordaríamos alguns dos sorrisos, algumas das caminhadas, algumas das conversas, algumas das imensas partilhas que vivemos juntos. E louvaria a Deus por eles. Finalmente, gostaria que o último pensamento, o meu último desejo, aquele que aconteceria mesmo antes do derradeiro embate, fosse o de Jesus: Pai, nas Tuas mãos entrego o meu espírito.

Hoje, aqui e agora, é em todos eles que eu penso.
Porque tenho tempo.
Mas também porque sei bem quem me é importante.

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