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A mostrar mensagens de janeiro, 2019
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É o Paradoxo, assim mesmo, com letra grande, como a inquietação que produz. Nada me faz pensar tanto na vida como a morte. A mim e à generalidade dos mortais, penso eu de que. A questão não será portanto, pensar na morte e na vida, mas o que fazemos com o que temos: a inevitabilidade.
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Juntamo-nos uma noite destas, por altura do Natal, apenas para... jantarmos. Em tempos, o arroz de frango ao sábado à noite era um ritual. Qualquer que fosse a casa, qualquer que fosse o tempo lá fora, qualquer que fosse o programa de fim de semana, nada nem ninguém escapava ao arroz de frango. Depois vieram os filhos e as educações diferentes do filhos e as dificuldades dos filhos nas partilhas dos brinquedos e as manias dos pais com os filhos e começou a haver sábados sem arroz de frango e arroz de frango sem sábados, cada um em sua casa. No entanto, quando nos juntamos, sempre que nos juntamos, é como se não tivesse existido interregno, é como se tivesse assim desde sempre, para sempre.  Estarmos juntos como se não tivesse existido tempo nem distância parece-me ser um excelente barómetro para o amor. Sabemos todos que a vida se vai instalando sobre os nossos desejos, os nossos anseios e até as nossas escolhas preferidas e que às tantas descobrimo-nos a correr atrás do p
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Há dias assim. Ontem, pela reação dos meus filhos, ganhei um novo estatuto: sou oficialmente velhote. Pela primeira vez terei que tomar medicamentos a um ritmo diário para tentar controlar uma enfermidade.  Não será nada de especial - espero eu - mas o entreolhar dos meus filhos à mesa do jantar foi profundamente reveladora. Se eles forem como eu pensam que os pais não envelhecem. Eu próprio, daqui a pouco, estarei próximo da idade que ainda penso sempre que o meu pai tem, à volta dos sessenta. Creio que fui um pai muito energético. Sempre o primeiro nas brincadeiras, sempre o primeiro a rebolar pelo chão sem limites, sempre o primeiro a chegar à pista de dança, sempre o primeiro a não temer as figuras tristas da galhofa. E isso ficou-lhes na memória e no corpo. Por isso, mais recentemente, quando me nego nas brincadeiras mais físicas ou me afundo no sofá , recebo invariavelmente os seus olhares de soslaio e as suas bicas da reação. Por isso a sensação que tive ontem foi de qu
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Faz-me sempre alguma confusão quando, em alguns foruns, dizem mal das redes sociais. Se o WhatsApp deixasse de funcionar, a minha vida, a nossa vida familiar, seria bem mais difícil. Chegamos a uma altura da vida em que alguns dos nosso filhos andam espalhados, como bom semeador faz acontecer com a semente. Se estão neste ou noutro país, se estão mais a norte ou a mais a sul, até se ainda estão lá em casa ou não, chega a não ser assim tão importante porque a maioria das vezes o diálogo mútuo, para acontecer com todos ao mesmo tempo, tem mesmo que ser via rede social. Mesmo com os que veremos no final desse dia, ou nessa semana, porque acordamos e saímos a horas desfasadas, os bons dias são dados no espaço da família no WhatsApp. As coisas que vão acontecendo, as notícias que vamos lendo, o que nos causa espanto, riso ou inquietação é aí colocado, às vezes até de forma mais espontânea, e que muitas vezes tem a arte de me comover. Basta que um exame não corra como esperado, ou que s
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«Procurar reconciliação e paz implica uma luta dentro de si. Não é um caminho fácil. Nada de duradouro se constrói facilmente.» Ir. Roger Tem sido uma constante nos últimos anos: por força das inscrições, conversas, combinações, preparativos vários, começo a antecipar Taizé na minha alma. É um regresso a uma das minhas casas da fé, que a vida já me permitiu ter várias. Há a casa casa, a Capela de São José, onde tudo começou e onde tenho as minhas raízes; há a casa lá de casa, a Igreja de São Pedro, onde lancei - lançamos - as sementes que são, hoje, as raízes do nós; há a casa de todos os dias, a Capela do Colégio, onde todos os dias me recolho, ainda que por breves instantes; e há a casa do eu mesmo, a Igreja de Taizé, onde iniciei o percurso, nunca acabado, de reconciliação comigo próprio. Todas são a minha casa, em todas encontro, invariavelmente, refúgio, todas elas sabem a reencontro, todas elas me impulsionam. Todas elas são memórias e orações e
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"Solitude is for me a fount of healing which makes my life worth living. Talking is often torment for me, and I need many days of silence to recover from the futility of words." – Carl Jung Conversava com alguns miúdos como gostamos de o fazer. Eu, que quando tinha a idade deles jamais me atrevi a conversar com um adulto, calculo que lhes seja pelo menos tão saboroso como para mim fazê-lo. É um dos verdadeiros privilégios da minha vida: poder conversar com quem quer partilhar de forma despretensiosa, eliminando as barreiras que cada um de nós se impôs. Na altura falávamos de Taizé e do silêncio e eu partilhei a minha experiência de silêncio no retiro dos jesuítas e de como isso me soube bem. Hoje, tinha esta foto e esta frase de Jung - alguém cujo pensamento vou descobrindo à medida das necessidades - e desde logo fiquei cativado. Na realidade, é um pouco assim que me gosto de imaginar no futuro. A calma, o silêncio, a borda da água, os papéis na mão - o cachimbo tam
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Se perder não dói, não se perde, deixa-se ir. Não há perda sem dor. Qualquer que ela seja. qualquer que seja o seu tamanho, o lugar que ocupa, a importância que lhe damos. Pode doer um pouco menos, por relativamente pouco tempo, ou pode arrastar-se dias, semanas, meses, anos a fio, sem que aquela sensação de aperto nos permita voltar a encher os pulmões de vida. Fazem-me alguma confusão aqueles que permanentemente encolhem ombros. Que não se ligam. Que não batalham. Que apenas habitam a superfície e não conhecem outro horizonte senão aquele se lhes apresenta ao olhar. Até têm metas e objetivos e elaboram rotas para os alcançar, mas ficam-se por aí, sem ousar, sem arriscar, sem descobrir o âmago, a intensidade, a alegria esfuziante do ganho, a dor desesperante da perda. Porque viver intensamente é também sentir intensamente. É arriscar muito, é ganhar muito, é perder muito, é assenhorar-se do futuro, ainda que ilusoriamente e por breves momentos, porque logo a seguir é-se dono de c
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Conversávamos de como ainda somos construção. Supostamente, a esta idade, tudo deveria estar já consumado. Acabadas as preocupações, acalmadas as tarefas, sossegadas as inquietações, tudo deveria estar a convergir para a sabedoria e correspondente serenidade. Mas não. Quase todos os dias sou surpreendido por novidades, dentro e fora de mim, que me obrigam a corrigir rotas, redefinir atitudes, alterar procedimentos. Raras são as semanas em que algo não é desconstruído, seja pela realidade interior, seja por imposição externa. Penso sempre no modo de fazer do Pateta, esse filósofo da vida contemporânea que me acompanhou desde sempre. O Mickey, ao vê-lo de cinzel na mão perante um bloco de granito, perguntou-lhe o que ia fazer e ele respondeu "um elefante". "Mas sabes esculpir um elefante?" "É fácil, basta retirar do bloco tudo o que não é parecido com um elefante!". Recentemente, uma das minhas inquietações mais profundas consistia em saber como me iria
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Sou da palavra. É curioso, porque normalmente apresentam-me como alguém da música, mas a palavra tem, em mim e comigo, um peso substancialmente superior. Acredito, verdadeiramente, no poder da palavra. Uma boa conversa, se possível com a mutualidade do olhar, uma boa escuta, por vezes até uma discussão aguerrida em busca de um consenso, constituem algumas das memórias mais gratificantes da minha vida. Mesmo quando caminho sozinho dificilmente o faço em completo silêncio. Há um diálogo entre mim e eu próprio, entre mim e o meu Deus, entre mim e os meus outros, ainda que apenas dentro de mim, que muitas vezes me serena e me ajuda a encontrar as respostas para o meu quotidiano.   No entanto, não tenho a palavra como definitiva. Porque a palavra por vezes não basta. E até é dispensável. Apesar de ser da palavra, prefiro por vezes o silêncio, o calar, o deixar que a vida e o tempo falem. Numa discussão demasiado exaltada o silêncio é preferível. Numa discussão unilateral, em que