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A mostrar mensagens de fevereiro, 2018
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Como tenho a sorte de, por volta desta altura, estar sempre em Taizé, apenas sinto a Quaresma quando prepara a Via Sacra para a Uma Noite ComTigo. Há, naquele último percurso de Jesus, muitos dos nossos caminhos, muitas das nossas falhas, muitas das nossas dores. Quando, com cerca de quinze anos despertei para estas coisas da fé, tive uma primeira abordagem à Palavra através da Bíblia em imagens, uma espécie de banda desenhada, que eu devorei de ponta a ponta. Lembro-me de me ter impressionado a história de Job, que desde logo assumi como minha, ou como uma das minhas mais fortes possibilidades de futuro. Desde então, quando as coisas apertam, lembro-me dele, da sua resiliência, da sua firmeza na fé contra tudo e contra todos, e esforço-me - em vão, mas esforço-me - para seguir o seu exemplo. Confesso que não nasci para sofrer. Prefiro, de longe, viver o lado B da vida, voltar-me para o sol, para a luz, escolhendo quase sempre tentar ignorar a vida nas minhas costas. À custa dis
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Durante imenso tempo, achei que era tremendamente inútil aquele silêncio provocado nas eucaristias para nos recordarmos dos que nos tinham morrido. Não percebia para quê. Ontem, na eucaristia, dei comigo a não ter tempo para me recordar de todos aqueles que gostaria de recordar e que me morreram no último par de anos. Familiares, amigos, companheiros de noites despertas e testemunhas oculares de amanheceres inolvidáveis. Progressivamente, vão-me ocupando não apenas as memórias dos vivos mas aquelas que se associam à nostalgia do irrepetível. Desde sempre que temo o para sempre. Recordo-me que antes de casar era isso o que mais me assustava. Para sempre é muito tempo, implica muitas variáveis, pressupõe a aceitação definitiva de demasiadas incertezas, alicerçadas numa confiança que, na maioria das vezes, tem tanto de fanfarronice como de inconsciente. Por isso há bem pouco tempo, numa daquelas alturas em que me pedem para discursar e lhes sai o tiro pela culatra, disse a dois rec
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Eu gosto da Quaresma. Gosto do deserto, do silêncio do olhar para dentro, do voltar a medir-me e a afinar-me pela Palavra, pelo que disse e fez Aquele que eu tento seguir. Gosto da possibilidade de recomeçar, do seu interesse genuíno em saber para onde quero ir, onde quero chegar, sem que para isso tenha que desfiar um rol de justificações que muitas vezes apenas soam bem e evitam perguntas incómodas. Gosto de me sentir mais um, incluído, amado, desmarcado, sem qualquer outro peso que não aquele por vezes tremendo que a própria consciência me impõe. Gosto da leveza, da profundidade, da escuta, da perscruta, do respirar fundo enquanto a vida me aquenta, e me ampara, e me desarma, e me entrega. Gosto de me reconhecer assim, pequeno, impuro, incapaz, e de me sentir reconhecido e amado assim, inteiro, apesar de pequeno, impuro, incapaz, sem qualquer fingimento, sem qualquer escondimento, sem qualquer medo, de corpo inteiro mas numa incompletude que me ultrapassa, sempre, e me deixa es
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Nunca tive um Taizé assim. Sem desespero. Sem baba e ranho. Sem vontade de me reconstruir, de me refazer, de me sentir perdoado. Sem aquela necessidade premente de me sentir acolhido, amado, recolhido nos braços do Pai que me ama. Foi calmo. Extraordinariamente calmo. Inusitadamente calmo. Como se já pertencesse. Como se já fosse amado. Como se já fosse completo. Talvez seja. Talvez a enorme convulsão que me habitou todos estes anos, que me levou ao desespero total e absoluto, que me roubou noites e dias e semanas e meses, tenha chegado, finalmente, ao fim. Taizé foi muito presente. essencialmente presente. Hoje. Aqui e Agora. E passado. Muito passado. Revisitado. Nas pessoas, nas conversas, nos passeios, nas partilhas íntimas, nas mútuas entregas e descobertas. Num recordar sem dor, sem lamento. Integrador. E futuro. Ânsia de futuro. Projeção de futuro. Construção de futuro. O meu Deus em Taizé, este ano, foi, por tudo isto, um Deus diferente. Não um Deus que me acolhe no desespe
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Não percebo porque tanto tememos. Porque confiamos tão pouco. Não percebo porque teimamos em chamar a atenção para o acessório como se fosse o importante. Não percebo porque gostamos tanto de dar tiros nos pés. Eu não acredito numa Igreja de portas fechadas. Se temos que ter portas, que as escancaremos, que deixemos vir todos, os que querem e os que não querem, os que precisam e os que desdenham, os que vêm por bem e os que querem recolher algo para si, os que crêem e os que julgam que não crêem. Porque eu acredito que, se de entre todos "os que não" houver um homem justo, foi para ele que as portas foram abertas, e não para "os que sim". Tardamos em aprender o mais básico do básico de Jesus: todos têm lugar. Todos. Absolutamente todos. Dá confusão? Claro que sim. Temos montes de relatos no evangelho que manifestam a confusão e o aglomerado das pessoas que se juntavam para ver Jesus. Não temos condições para as acolher? Claro que temos! Bastam cinco pães e dois p
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Quem me conhece sabe que, no que toca a pessoas, eu não gosto de catalogações, de etiquetagens, que mais não fazem que limitar e fechar o que deve ser ilimitado aberto à vida. Provavelmente por habitar todos os dias em meios quase diametralmene opostos, apercebo-me com facilidade que, uma vez despidos os preconceitos, descascadas as camadas com que laboriosamente nos cobrimos e nos servem de proteção, não há muito de diferente nas pessoas, que na sua essência são mais parecidas umas com as outras que aquilo que gostariam de admitir. A mesma necessidade de amar e ser amado, de reconhecer e ser reconhecido, de pertencer e sentir-se digno de pertença, os mesmos medos, as mesmas fragilidades, as mesmas grandezas, diferindo, uns e outros, apenas em intensidades, como ramos que seguem caminhos diferentes mas permanecem dependentes da mesma árvore. E alimentados pela mesma raiz. Daqui advém uma enorme dessacralização de cargos e títulos, e uma maior atenção a quem posso ter, realmente,
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Eu gosto de mulheres. Muito. Fortes, discretas sensíveis, inteligentes, multifacetadas, extraordinárias. Admiro-as. Bastante. A sua capacidade de adaptação, a sua resiliência, a sua natural dádiva de si, como leoas a tratar dos seus. São destemidas, extraordinariamente argutas, desarmantes. Nada como nós, homens, bacocos ostentadores de capacidades que não temos, exibidores de plumas e cores e músculos apenas para podermos desfrutar da atenção daquelas que verdadeiramente admiramos. Digo-lhes  muitas vezes em tom de (mais ou menos) brincadeira, quando se queixam de nós, que elas é que escolhem mal porque eu jamais me apaixonaria por um homem. Vi o filme The Post. Que não é sobre um jornal nem sobre a liberdade de imprensa nem sobre o controlo político. É sobre uma mulher. Uma dondoca que a determinada altura tem que assumir uma vida que não escolheu e nunca pensou vir a ser a sua. Uma mulher que vivia num meio masculino numa época em que elas eram pouco mais que bibelots. É fdabul