Fernando Alves é, desde há muitos anos, a voz que mais gosto de ouvir na rádio. Os sinais que todos os dias invoca, que todos os dias envia, são despertadores que me ajudam a ficar mais atento  e, sobretudo, a descobrir o que sem ele dificilmente descobriria. Hoje falava de Clemenceau e de uma frase sua que veio ao meu encontro: " O que me interessa é a vida dos homens que falharam, pois tentaram ir além das suas possibilidades."

O meu apóstolo predilecto não é João, é Pedro. Pela sua humanidade. Coração demasiado perto da boca, excesso de voluntarismo, pouca percepção da realidade, a loucura destemida de quem acha que tudo é possível e o tardio enfrentar da realidade, sempre com uma grande dose de arrependimento, sempre com uma grande necessidade de conversão, sempre com a promessa que desta vez é que vai ser, deixando que a parca percepção, o voluntarismo e a loucura dêem início a um novo processo que, inevitavelmente terá o mesmo fim. É um homem cheio de coração, de peito cheio, como costumo dizer, cuja racionalidade é imposta pela vida e pelos tantos que o acompanham e o aconselham, não raras vezes sem discussão acesa. Não tem a beatitude de João, não tem a sageza de Paulo, aparentemente tudo lhe falta e no entanto, é a Pedro que Jesus escolhe para dirigir a Sua Igreja. Mais uma vez, a inversão da lógica do poder, mais uma vez, a opção pelo menos evidente, mais uma vez a escolha da vida vivida em vez do calculismo. Uma Igreja que se quer viva e vivida não se pode escudar no calculismo, no seguro, no conforto, no cómodo. Muitas vezes tem que ser toda coração, tem que agitar águas e incomodar, atrapalhar o status quo e catapultar para além das fronteiras do medo e da insegurança. Tem que confiar. Ter fé. Caminhar sobre as águas, sabendo que os limites dos homens são apenas limites, aparências, de limites, que podem ser ultrapassados por pessoas que se deixam mexer por dentro.

Soube ontem que uma amiga, freira, deixou o convento. Vai ser mãe. Solteira, porque o pai da criança preferiu seguir a sua vida. Quando o disse à família, houve divisão. De um lado, choro e ranger de dentes. Para eles, ela era a freira, motivo de orgulho da família até há pouco tempo, que alardeavam nos locais católicos bem pensantes. É agora motivo de vergonha, que tentam varrer para debaixo do tapete. Do outro lado, a alegria. Para eles sempre foi a S. a irmã, a prima, a amiga batalhadora e particularmente sensível alegre e feliz, que agora tem a coragem de assumir um novo rumo com a mesma felicidade, a mesma alegria e uma ainda maior sensibilidade. E com a fé de sempre: "eis a Serva do Senhor..."

As maiores lições de vida vêm quase sempre do aparente fracasso.
Ou não andasse eu de cruz ao peito.

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