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A mostrar mensagens de abril, 2017
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Por muito estúpido que seja, o meu epitáfio sempre me foi importante. Imaginar o que dirão de mim na altura da minha morte é algo que sempre me ocupou o espírito. Claro que é estúpido. e é estúpido principalmente para um homem de fé, principalmente para quem, como eu, confia tanto no amor do Pai que à hora do epitáfio já estarei no lugar onde apenas importa o que verdadeiramente importa e epitáfios não será, com certeza. Provavelmente isto seria até divertido se não tivesse implicações na forma como vivo a minha vida. Estar permanentemente atento ao que pensam e dizem de mim pode ser importante para aferir o meu grau de estupidez natural e o seu impacto nas vidas dos que me rodeiam, mas não me pode levar a viver a vida em função das opiniões e das expectativas alheias. E esta tensão entre o que sou, o que gostaria de ser e o que os outros gostariam que eu fosse é permanente e nem sempre bem resolvido. Por vezes, nos dias bons, tudo flui com enorme naturalidade e eu questiono-me com
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Cabe. em todo o processo pascal, a nossa própria história. Há, em toda a sucessão dos acontecimentos de Jesus, uma reinterpretação da nossa história de vida. E há, em toda a sucessão dos acontecimentos da nossa vida, uma reinterpretação da via sacra de Jesus. Como os relemos a partir do fim, todo o processo nos é inquinado. Sabemos de antemão que Ele é Deus e subestimamos o seu sofrimento, sabemos de antemão que Ele será condenado e desvalorizamos o seu silêncio, acreditamos na sua ressurreição e acreditamos absurda e intimamente que Ele se teria prestado a toda aquela encenação, menorizando-nos. Se o mesmo fizéssemos à nossa vida, que leitura faríamos? Aconteceram-me várias mortes, nestes últimos tempos. De novos e velhos. Prolongados e repentinos. Amigos e familiares. Eu, que durante anos apenas testemunhei vida, ultimamente dou comigo numa sucessão de velórios e funerais e interrogações profundas sobre o profundo sentido da vida. A última das quais foi no domingo passado, Domi
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Adoro descobrir coisas novas em coisas velhas. Por vezes ando uma vida inteira focado num determinado aspeto de algo, ou de alguém, sem sequer me ocorrer uma outra leitura, uma outra perspetiva, uma outra verdade escondida ao meu acostumado olhar. O Tempo, em Eclesiastes, é uma das leituras da minha vida. Desde sempre a liguei à sabedoria do Mestre Tempo, aquele que, escapando-se-nos ao controlo, prossegue o seu inexorável caminho. Sempre o tive, intimamente, como aliado, como bom motivo para ir esperando, pacientemente, o que algum dia haveria de ser meu. Fosse alguém, alguma coisa, ou o reconhecimento que sempre procuro sem nunca o admitir. Eu tenho tempo é uma frase que quem me ama me escutou já algumas vezes. A questão é que eu, efetivamente, vou tendo tempo. Que nem sequer se esgota neste tempo mas acredito continuará num outro tempo. É essa a minha esperança, também. Mas eu também tenho responsabilidades sobre o tempo que me é dado. E nisso nunca tinha pensado a sério. Até a
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É frequente, quotidiano, diria, ser tocado por uma imagem, uma foto, uma música que vejo na internet, ou na rua. Ou um filme, particularmente se tiver uma abordagem peculiar sobre algo que, naquela altura, estiver em processo em mim. Mas sou, basicamente, intrinsecamente, um homem da palavra.  Aquilo que faz eco cá por dentro, que pode andar dias, semanas, ou meses a fazer caminho cá por dentro é, a esmagadora maioria das vezes, a palavra. Que pode ter sido dita, lida ou escutada.  A que me magoa mais - e por isso permanece indefinidamente - é a dita. Por mim, claro. É quando me armo aos cucos e me deixo levar pelo entusiasmo do engraçadismo - que no meu caso tem sempre raiz na estupidez natural - e me apercebo, demasiado tarde, que acabei por magoar alguém. O que disse e a quem disse fica gravado indelevelmente. Aprendo a viver com isso. Mas não consigo - não quero? - esquecer. Tive um infeliz episódio no princípio deste ano letivo e ainda agora tendo a desviar o olhar da pesso
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Ontem tivemos um dia quase todo nosso. Apenas nosso. Eu andava ansioso por esta oportunidade. Ele também, embora a sua sensibilidade e discrição o impeçam de o dizer. Metemo-nos no carro e fomos às compras. Os dois. Apenas os dois. Uma tarde de homens. Um bom pretexto para falarmos de dores e alegrias e frustrações e sucessos e insucessos que o quotidiano força a silenciar. Por pudor, por falta de tempo, por comodismo, por não conseguirmos sempre chorar juntos o que deveríamos chorar juntos. Se este não tem sido um ano fácil para nenhum de nós, para ele tem sido particularmente difícil. Porque a sua personalidade tem algumas caraterísticas: sensibilidade extrema, atenção cuidada e cuidadora, silêncio criterioso. Por isso sofre em silêncio, à distância, e quando lhe perguntamos se está bem a sua resposta é invariável: como o aço. Não fosse o seu olhar e até poderíamos acreditar. Ontem era para conversarmos dele. Como quem não quer a coisa. Alternando assuntos sérios com larachas e c
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É dos livros. O horror ao vazio. E eu não escapo à regra. Antes a acentuo. Alguns dos meus maiores disparates são cometidos quando pressinto a possibilidade desse vazio. De alguém em mim. De mim em alguém. É-me extremamente difícil lidar com essa sensação de perda profunda, que eu faço tudo para iludir, inclusivamente as maiores asneiras. É como se fosse agora e velhote o que nunca fui em miúdo: um puto birrento a bater com os pés no chão porque não consegue encaixar a realidade. Ou encaixar-se nela. Na semana passada chorei numa eucaristia. Bastou que o sacerdote tivesse falado nas pessoas que perdemos. Bastou-me recuar alguns meses para recordar perdas de pessoas muito queridas, já mortas. E precisei de recuar muito menos para recordar perdas de pessoas para quem morri. Porque há perdas irrecuperáveis, umas por causa da morte, outras por causa da vida. Por muito que as tente varrer para debaixo do tapete e as tente remeter para as calendas, há sempre um momento de maior fragil
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Desde que, há muitos anos, li o Onze Minutos do Paulo Coelho, que o desapego volta e meia vem à baila. Na altura, foi muito útil, por causa da fase da vida em que os meus filhos se encontravam. Eu tenho uma clara tendência para a obsessão quando amo, e tenho muitas vezes a vontade de fazer com as pessoas o que faço com as minhas coisas. guardo-as cuidadosamente, apenas para mim, chegando até a escondê-las dos olhares dos outros. O que me vale é que com as coisas - e com as pessoas - cedo me apercebo que essa tendência é profundamente doentia e depois obrigo-me a abrir mão e a encontrar prazer no prazer dos outros com as minhas coisas. E as "minhas" pessoas. Naquela altura, os meus filhos estavam a entrar na adolescência e eu tive mesmo que aprender a abrir mão deles. Eu sou fortemente protetor e é-me extremamente fácil confundir proteção com abafamento, e tenho que estar muito atento à forma como lido com aqueles que amo para não passar do oito ao oitenta. Amar sem posse
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Ontem, no final da oração, comentava com um amigo que a visa sacra, como aquela que acabáramos de fazer, era a minha oração preferida. Desde sempre. E ele, que participara numa pela primeira vez, respondeu-me que gostara do tom de esperança que eu dera no final da oração. Vim a pensar nisso. Em ambas as coisas. Eu sei claramente porque gosto tanto da via sacra mas nunca me tinha apercebido do tal tom de esperança que ele referia. Eu percebo bem o desespero, o dramatismo, os passos todos que Jesus dá, e eu com ele. A ideia de alguém dar a vida por alguém, de forma abnegada e sofrida, é a minha definição de heroísmo. Se a esse gesto somarmos o silêncio de que Jesus sempre se fez acompanhar, a sua não violência e até a sua não resistência, percebe-se porque ao seu heroísmo adiciono aquele quê de incompreensível que todos os super heróis têm. Um super herói muito especial que, de entre os seus superpoderes e a sua humanidade, escolhe a sua humanidade com tudo aquilo que tem de frágil.
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Quando me encontro a sério com Deus sou uma pessoa melhor. Sempre! Pode ser por muito tempo, pouco tempo, tempo quase nenhum, mas sempre que esse encontro íntimo acontece, em mim, é verdadeiramente transformador. Fornece-me sonhos, alimenta-me projetos, revela-me futuros possíveis alcançáveis e desejáveis e todo eu sou impulso e motor e vontade de começar. É particularmente nessas alturas que consigo ser luz para os que me rodeiam, de tal modo mergulho na intensidade do amor que esse encontro despoleta em mim. É frequente, nessas alturas e nesses locais, falarem-me dessa luz que eu aparentemente sou. E, com a mesma frequência, eu tendo a acreditar. No entanto, a grande questão de fundo da minha vida  nunca teve a ver com intensidade. Eu sou intenso em tudo o que faço, intensíssimo em tudo o que sinto. Abomino a superficialidade, nem que seja a da pele, e desejo sempre ir mais além, onde reside - e descubro muitas vezes - o que verdadeiramente importa. Em mim e nos que me rodeiam. T