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A mostrar mensagens de novembro, 2014
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Esta foi uma semana daquelas. O único dia em que jantamos juntos foi no já longínquo princípio da semana e não nos temos visto mais que por alguns momentos. Tenho andado a correr como um doido, reuniões aqui, ensaios ali, preparações em todo o lado. Como se não bastasse, partiram-me o vidro do carro e levaram-me o tablet. Provavelmente, quem o fez é amigo ou conhecido ou vizinho daqueles que estavam comigo na faculdade de Direito a assistir a uma palestra sobre os excluídos. Ironias! E no entanto... Hoje, quem me visse na minha cada vez mais preciosa caminhada matinal junto ao mar, pensaria que sou (ainda mais) maluco, tal o sorriso. Esquisito, não? Digo muitas vezes aos meus miúdos que conhecer Jesus rouba-nos desculpas. Deixamos de poder alegar desconhecimento ou distração, deixamos de poder olhar para o lado e ficar de consciência tranquila, deixamos de ter a consciência tranquila em qualquer dos casos, porque é sempre muito mais o que podemos fazer quando comparado com o que r
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Foi mais ou menos na mesma altura, teria cerca de 14 anos, que duas leituras me marcaram e desde então me fizeram companhia: o livro de Job e o Cântico Negro. Na altura foram mais sentidas que entendidas, até porque tanto num caso como noutro, tinham muito de incompreensivelmente belo mas imensamente sedutor, tocando numa interioridade que, naquela fase da vida, estava muito longe de sequer imaginar que existia. Do Cântico Negro, que ouvi a primeira vez sublimemente recitado pelo meu extraordinário professor de Português do 9º ano - e que nunca mais ouvi da mesma maneira! - retive toda a raiva incontida, toda a agressividade, todo o desdém que decorre da inevitabilidade de se percorrer um caminho, que é o único, apesar de todas as dúvidas, de todas as contrariedades, de todos os medos, de todos os bons conselhos, de todos os dedos apontados. De Job, aprendi a confiança, até ao limite, contra todas as evidências, contra todos os dedos apontados, contra todos os bons conselhos, num De
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foi imediato. vi esta imagem e pensei logo em quelimane, naquela casa onde tantas vezes foram buscar uma cadeira para que eu me pudesse sentar e conversar. ignorante, recusei-a quase sempre, não percebendo que naquela cultura a conversa de coisas importantes faz-se sentado, em sinal de respeito, tempo e disponibilidade. soube-o depois, já em maputo, demasiado tarde, digo eu. quando lá cheguei levava uma íntima arrogância no olhar e nos sentidos que nem um ano de formação conseguiu impedir. em abono da verdade, creio que nem meia dúzia de anos o conseguiriam, porque é preciso estar lá, viver com eles, sentir-lhes o cheiro, brincar e conversar com eles, para termos uma pálida ideia do que vamos lá fazer. e ainda assim, essa ideia é muito discutível, porque sabemos sempre que iremos voltar, que podemos voltar, que aquele não é o nosso lugar, que é uma questão de suster a respiração e esperar que o tempo passe. enquanto lá estive, apesar de toda a boa vontade, apesar das horas de sono p
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"O próximo é aquele que cuida das feridas". Surgiu assim, do aparentemente nada, e fez-se luz: "o próximo é aquele que cuida das feridas". No clique que se deu cá por dentro, liguei instantaneamente ao que tenho sido nestes últimos tempos. E percebi imediatamente que tenho dado uma série de tiros ao lado. "porquê?" Apesar de não me ter em grande conta em muitas coisas, sei que penso a vida, sei que me preocupo em olhar e ver o que se passa à minha volta, em confrontar o que vou dizendo e sentindo e fazendo com aquilo que me é pedido que diga, sinta e faça. Sei, por isso, que nestes últimos tempos havia sempre algumas pontas soltas que me dificultavam a tranquilidade e me impediam o sossego. Olhava, olhava e voltava a olhar, e não conseguia encontrar o motivo. Só me podia ser externo, por isso. "O próximo é aquele que cuida das feridas." Não era externo. Era uma questão de olhar, de direcionar o meu olhar, de ver o que deveria ver e não aquilo
Creio que ninguém me consegue fazer desejar recolher como Damien Rice. Tem tudo a ver com inverno, com chuva miudinha, com uma boa conversa, uma lareira acesa, e o suave crepitar da madeira, e o suave o incenso que liberta, uma boa garrafa de vinho, uns cobertores e tempo, muito tempo, para que a conversa possa ser devidamente saboreada, degustada, como se de um bom Porto se tratasse. Tem tudo a ver com regressar a casa, à nossa casa, onde nos sentimos aconchegados e eternos, protegidos de tudo aquilo que nos assalta a alma e perturba os dias. Uma casa que nada tem a ver com paredes e janelas e muros mas onde tudo são recantos, nossos, que falam a nossa linguagem, sussurrada, suspirada, transpirada por tudo o que vivemos e trocamos e conversamos uma e outra vez com o mesmo gozo e a mesma surpresa da primeira vez, porque para quem se ama como nos amamos qualquer vez é a primeira vez. Tem tudo a ver com a noite, com o escuro da noite, aqui e ali apenas entrecortado com a luz reflet
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Foi a segunda vez que o ouvi. E gostei do que ouvi. Embora não me deslumbrasse, que eu ando nestas coisas há tempo suficiente para não me deixar deslumbrar facilmente. Tem uma visão nova, desempoeirada, que questiona as coisas da fé e da Igreja, e isso faz-me sempre bem. Porque questionar a fé e a Igreja é questionar-me a mim próprio e aquilo em que acredito, e questionar-me a mim próprio é contribuir para construir alicerces mais sólidos e profundos. Até aí tudo bem. A questão foi quando eu lhe pedi "por acaso não estará disponível para...". Vi logo nos seus olhos, na maneira como os desviava dos meus, no contraste da sua linguagem corporal com a que evidenciara enquanto proferia a sua palestra, o que a sua boca não conseguiu responder. Disse-me que sim quando eu lia distintamente que não. Tudo bem. Também eu sou muitas vezes encostado à parede, preso na armadilha que as minhas próprias palavras cuidadosamente me armaram. Nada de novo, portanto. Ontem, quando tentei confi
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Dia mais complicado! Passei o fim de semana alegre e confiante: tinha resolvido dois berbicachos aos quais faltava apenas a confirmação. Afinal, o primeiro apanhou uma gripe e deixou-me na mão, e ainda estou à espera que o segundo diga alguma coisa. Há dias assim, eu sei, e normalmente estou preparado para eles. E devia saber que eles nunca vêm sós. No ER a coisa hoje foi caótica: não havia monitores, os meus miúdos estavam todos, e todos impertinentes, e passamos hora e meia em que mais parecíamos protagonistas dos Gladiadores, comigo a tentar dominar as feras e elas sistematicamente a levarem a melhor. Por momentos pareciam hienas, as feras, porque se riam na minha cara ;-). A experiência tem destas benesses. Já passei por muito, por muitas alturas de verdadeiro desespero, e aprendi a não julgar o tempo apenas pelo momento. Bem sei que as coisas doem é no momento, mas também sei como é importante conseguir manter a perspetiva correta dos problemas e aprendi, à força de cabeçada,
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Ontem fui a um museu. Em Fátima. Ao qual espero não voltar. E ao qual espero que os meus filhos não vão, O que é esquisito, confesso. Este museu estava carregado daquelas coisas da Igreja que eu preferia que a minha Igreja não tivesse. Mantos e coroas, ouro e diamantes, bordados caríssimos, cálices de prata, tudo aquilo que não nos acrescenta coisa alguma, antes tira, dando razão a todos quantos não percebem como somos capazes de pregar tão no vazio. Eu sei bem que muitas daquelas coisas foram oferecidas, mas é justamente isso o que me causa confusão. Que um padre, bispo ou um papa sinta qualquer necessidade de ter um cálice de prata ou que, como já um deles me disse, o compre para justificar una qualquer necessidade de dignidade. Disseram-me já que os paramentos têm que conferir dignidade, assim como o cálice a patena, mas não me conseguiram explicar porque um cálice de prata é mais digno que o cálice do filho do carpinteiro. Da primeira vez que cheguei a Santiago depois de fazer
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"Tu ouves-te quando me dizes o que dizes?" não. nem sempre. e essa é apenas parte da questão. porque quando a guarda baixa, nem sempre o que me sai da boca passou pelos devidos lugares. não foi devidamente processado, sai diretamente do coração, ou da alma, ou, sei lá, de onde saem aquelas coisas que sentimos, e não passou pela cabeça, pelo cérebro, pela razão, esse garante que o que te digo hoje dir-to-ei da mesma forma amanhã. ou depois. não. nem sempre ouço o que digo. sei que ressoa sempre, sei que fica sempre, cá por dentro, a matutar, a maturar, e que muitas vezes descubro-lhe apenas o sentido muito tempo depois de o ter dito. e que por vezes até gosto do que disse. e que noutras gostaria de não o ter dito mas é tarde demais. é sempre tarde demais quando me descubro no reflexo que projetei em ti. seria muito melhor, e mais fácil, e mais seguro, que reencontrasse o meu reflexo apenas depois de passado pelo crivo do que deveria ser. mas tu tens isso. pões-me à von
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Sempre que o tempo e o trabalho o permitem, tenho começado os meus dias caminhando na Foz. As manhãs frias, a omnipresença das nuvens carregadas de água e o vento frio, curiosamente, potenciam a minha reflexão e consequente oração matinal, como se um ambiente belo mas agreste fosse necessário para me repensar, como contraponto aos dias solheiros e quentes, que me despertam a enorme gratidão a um Deus que me ama. "Devias ter tido mais cuidado. Foste um bocado rude, hoje, na reunião." Desde que nos conhecemos que é assim. O meu grilo falante, sempre atento, sempre cuidadoso, sempre preocupado em que mostre apenas o melhor de mim e guarde aquilo que, francamente, não interessa a ninguém. Volta e meia, quando me descaio, lança-me um daqueles olhares fulminantes e eu sei que acabei de meter água. Por vezes, quando estou mais sereno, acato e tento remediar logo na altura. Outras, no entanto, ando demasiado zangado comigo mesmo para que isso aconteça e continuo, cheio de
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Tenho andado às voltas com as orações dos Dias de Reflexão. No início, ingenuamente, acreditei que todos os miúdos que tinha diante de mim sabiam do que eu estava a falar. Afinal, estávamos num colégio católico e eu assumi, à partida, que todos o eram ou que, pelo menos, o eram as suas famílias. Naquela altura - já lá vão mais de meia dúzia de anos - fiquei espantado quando percebi que alguns não tinham qualquer noção das parábolas e do que elas implicam na nossa vida. Rapidamente formulei o meu esquema e o meu discurso e adaptei-me às circunstâncias. Apercebi-me então que o jogo de cintura que os anos todos de catequese juvenil me deram revelaram-se fundamentais. Acredito cada vez mais que não há experiência de vida que, mais cedo ou mais tarde, não tenha a sua utilidade. Este ano, até porque iniciamos uma nova abordagem, as orações continuam a preocupar-me. Como havemos de chegar àqueles que temos diante de nós. Que volta havemos de dar para não desvirtuar a profundidade e a riq
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Sinto-me sempre abençoado quando me apercebo do grito que pode ser na minha vida um acontecimento ou um testemunho aparentemente menor. Hoje, numa deliciosamente curta conversa com uma das minhas filhas, ela disse-me que não se vê nada numa vida competitiva. Que as suas espectativas vão muito mais no sentido de se empenhar na sua profissão mas conciliá-la com a família que ela tanto deseja, que a aposta numa carreira profissional de sucesso. Ao dizer-me isso revelou-me uma serenidade que me deixa mesmo feliz. E confirmou até que ponto somos parecidos. Lembro-me sempre da única vez em que comprei um carro novo e algo potente. Ia na autoestrada e, com a estupidez tão tipicamente masculina, pus-me a conduzir depressa apenas porque podia. Às tantas apercebi-me de como estava tenso, - eu que gosto tanto de conduzir, ao ponto de me servir de terapia de relaxamento - reduzi a velocidade para a minha zona de conforto, e usufrui, aí sim, das potencialidades daquele carro. Como invariavelm
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Uma das minhas maiores lamentações é a minha incapacidade de aprender de uma vez para sempre. Eu ainda gosto de acreditar na minha capacidade de aprender. De estar atento ao que se passa à minha volta e disso tirar as lições necessárias, venham elas de onde vierem, porque a vida ensinou-me que as maiores verdades são-nos oferecidas pelas pessoas e momentos mais inesperados. No entanto, enredado no quotidiano, facilmente me esqueço delas. No último dia de reflexão que tive com uma turma do 9º ano, a partilha do Bom Samaritano conduziu-nos à questão da não violência. O que levará alguém a não reagir? O que levou Jesus a não se defender das acusações que Lhe levantaram? O que teria levado Gandhi a persistir naquela não violência tão gritantemente silenciosa? E aquela imagem do homem, sozinho, desarmado, diante dos tanques de Tiananmen, permanece na memória de todos nós, os que assistíamos a milhares de quilómetros de distância.  De todas as filmagens referentes aos campos de extermín