Imagino mil conversas. Todos os dias! Basta estar a caminhar, ou a conduzir, ou a dirigir-me para algum lugar, e lá estou eu a conversar. Mentalmente. Imagino-nos com facilidade, um em frente ao outro, nas mais variadas situações. Imagino o que me perguntas, o que me questionas, o tanto que me questionas, e imagino a minha resposta, formulo-a e reformulo-a, escolho as palavras, risco aqui e sarrabisco acolá, até encontrar a forma mais satisfatória e mais verdadeira de te responder.
Por vezes é com comTigo que dialogo, directamente, sem intermediários, o que torna as coisas infinitamente mais simples porque sei que entre nós não há equívocos. Pelo menos de Ti para mim, porque em sentido oposto nada há mais que uma confiança, por vezes cega, outras mais (es)forçada, mais desejada que efectiva. Mas como Tu me conheces bem, sei que não adianta de nada por-me a adoçar a realidade, ou a forma como vejo a realidade, ou a forma como sinto a realidade, e limito-me a despejar-Te os meus anseios, os meus receios e as minhas dúvidas e esperar que Tu me resgates de mim.
Mas não é apenas comTigo que eu tenho as minhas conversas imaginárias. é também com aqueles que me acompanham, ou deixaram de acompanhar. É também com aqueles cujas conversas foram interrompidas pela vida, com quem tive gestos mal interpretados, atitudes menos correctas, e por isso me aparecem a pedir-me justificação. E imagino-nos sentados, a conversar, calmamente, a trocar motivos, a trocar desculpas, e a ficarmos bem um com o outro. Imagino mesmo os nossos diálogos, ponto por ponto, escuto as suas argumentações e apresento as minhas, reformulo as suas argumentações com outras hipóteses, outros caminhos, e reajusto as minhas, concluo muitas vezes que fui amargo de mais, ou tolerante de menos, e corrijo a minha postura, e prometo-me que, agora que tudo está esclarecido, não voltarei a cometer o mesmo erro.
Fui aprendendo que esta é uma boa forma, muitas vezes inconsciente, de me medir com o outro. De me corrigir, de tentar perceber, de tentar incorporar de alguma forma todos os mal entendidos, que apesar de frequentemente serem fruto de minudências, quando acumuladas correm o risco de deixar lastro e inquinar amizades. São também uma boa forma de antecipar razões e motivos e preparar discursos que possam ser coerentes com essas razões e motivos. Antecipando o choque do confronto, preparo-me melhor para os golpes e, quando surge a necessidade de pedir desculpa, faço-o com muito maior naturalidade porque essa necessidade já encontrou lugar em mim, já partiu de mim, não é tanto uma imposição alheia.
Também por isso, muitas vezes ofereço esses diálogos interiores como confissão. Não poderia ser de outra maneira. A minha culpa advém do confronto entre o que sou e o que sou chamado a ser, entre o que penso que sou e efectivamente sou, entre o que gostaria de ser e de fazer e de dizer e sentir e a minha repercussão efectiva nos que me rodeiam. Se alguma destas coisas falha - e falha muitas vezes! - e se eu tenho consciência dessa falha - e tenho-a muitas vezes! - nada mias me resta senão pedir desculpa e avançar. Interiormente, vou fazendo-o. Olhos nos olhos, vou tentando encontrar a melhor oportunidade para o fazer. E nem sempre o consigo.

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