Há um motivo para temer sempre um olhar de desilusão dirigido a mim: já vi vários. Dolorosos. Todos eles.

Quando me interesso o suficiente por alguém - e é-me sempre muito fácil interessar-me por alguém - não costumo ter grande dificuldade em saber lê-lo. E quando essa dificuldade existe, rapidamente constitui um desafio que exige ainda uma maior entrega e atenção da minha parte. E, se estivermos ambos em contacto o tempo suficiente - e se a pessoa em causa for interessante - dou ao tempo o tempo necessário para aprender a lê-la. Antecipar os seus olhares, conseguir perceber quando está bem ou mal, e guardar ainda assim a distância necessária para ser chamado sem me impor, é vivido por mim quase como uma missão e, tarde ou cedo, a vida acaba por promover o encontro mútuo, quase sempre mutuamente enriquecedor.

Há quem chame a isso inteligência emocional. Seja! Até concedo que poderá ter tudo de emocional, mas não terá grande coisa de inteligência. Porque o olhar que incide sobre os outros transforma-se em completa cegueira quando incide sobre mim próprio. Não é nada raro andar completamente enganado acerca do que penso ser a minha realidade, completamente iludido, completamente no mundo da lua, sem qualquer sintonia com o que efetivamente se passa. Todos à minha volta vêem que é alhos e espantam-se quando eu vivo como se fossem bugalhos. Mas com o seu ar de espanto permanente posso eu bem. O pior mesmo é quando a inteligência finalmente carbura e eu descubro a verdade. Que, quase sempre, não queria ver e por isso a fantasiava tão cuidadosamente. Que, quase sempre, acerta na mouche e exige medidas duras, que evitava tão cuidadosamente.

Já vivi o suficiente e já tive que aprender o suficiente para perceber que há feridas que nunca passam, que permanecem, apesar dos esforços, apesar dos curativos, apesar de toda a vontade do mundo em alcançar a cura. Mas que devem ser enfrentadas, para que, finalmente, possa entrar alguma luz.  

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