Gostei sempre de filmes épicos. Aqueles em que se luta até ao limite das forças, contra todas as probabilidades, contra tudo e contra todos, sempre em nome do amor. Então se for com morte certa, se ficar apenas um para a história, melhor ainda. Com extraordinária facilidade sinto-me catapultado para o centro dos acontecimentos e também eu me vejo lá, orgulhosamente lá, a lutar sozinho, a morrer sozinho e, sobretudo - porque isto é o que verdadeiramente me seduz - a ser finalmente reconhecido como um herói por aqueles em nome de quem abnegadamente lutei.

É evidente que se o que me emociona é o reconhecimento final, a minha luta é tudo menos desinteressada. Até porque normalmente sou mais sensível a este tipo de epopeias quando estou mergulhado até ao pescoço em algum tipo de alhada da qual não consigo forma de me livrar de cabeça erguida. Então, nada melhor que um ato heróico que me faça tirar da mediocridade e elevar-me à justificadíssima, evidentíssima, condição de herói da humanidade. E é justamente esta sensação de viver na mediocridade que nos deve fazer pensar.

Se não me deixa de espantar que jovens ocidentais se sintam atraídos pela absoluta loucura que conduz aos atentados que tomam conta dos acontecimentos globalizados, interrogo-me acerca do estado psicológico e moral em que se deve encontrar quem se descobre seduzido por tamanha radicalidade. Eu até entendo o clima de nada a perder que lhe está subjacente. Perturba-me sempre, mas consigo entender a mecânica psicológica do suicídio. Sobretudo para quem tem fé, morrer não é, de longe, o pior que pode acontecer. A desesperança, o sem sentido, o sem futuro, o sem razão, sobretudo se quotidiano, sobretudo se solitário, consegue ser um inferno de horrores para quem o sofre. E viver assim é viver em terra árida. E viver assim é ficar permeável a uma qualquer ideologia, a uma qualquer promessa, a uma qualquer loucura que nos rouba de nós próprios e nos conduz à insanidade total. Pessoas assim, que sentem que nada têm a perder, são as mais perigosas de todas, porque acreditam que o melhor que lhes pode acontecer é morrer. E se morrer dentro dos trâmites do seu próprio código de honra - que para os de fora não faz qualquer sentido - melhor. Não tem a ver com virgens prometidas, não tem a ver com fanatismos de fé. Tem a ver com conquistar um sentido para a vida, que arrebate da solidão profunda em que se encontra e a substitua pela razão de viver.

Não acredito nada, absolutamente nada, que a melhor resposta seja com armas na mão e ameaças e proibições. Provavelmente até seria aquela que eu decidiria se estivesse em lugar de decidir, mas essa não é a resposta. É outra. Mais a montante, mais silenciosa, como silencioso é o percurso que os leva a chegar àquele desespero. A resposta só pode ser tentar dar sentido à vida, só pode ser impedindo a estrutura mental do "nós" que se sobrepõe aos "outros", só pode ser restituindo a dignidade a quem todos os dias sufoca à procura dela. E isso apenas se faz pela inversão do que nos tem guiado há gerações: a lógica do poder.

Acredito que é tempo de voltarmos à civilização do amor, da ternura, da disponibilidade, da atenção ao outro, à lógica do serviço ao outro, de o colocarmos no centro da nossa atenção. Soa mal, não soa? Soa a anacrónico, não soa? Soa a sacristia, não é? E ninguém quer isso, que fica mal, é tão pouco apelativo, tão pouco moderno! E afinal, nós, os cristãos, os católicos, estamos finalmente tão perto da modernidade, até temos finalmente um Papa fashion, iríamos agora recuar em nome de quê? De Jesus? Do Cristo? Que ideia!

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