20151130
Ontem era dia de estudarmos juntos. Filosofia. O que, para a cabeça do meu-mais-novo é uma tremenda complicação. Ainda ontem me dizia que o sonho dele é trabalhar com motores. Montá-los e desmontá-los, perceber a fundo como funcionam e o que faz mover o quê. E que sonho mesmo era montar ele um carro de raiz, o carro dele, de princípio a fim. E fazê-lo com os filhos. Disse-o numa conversa como quem-não-quer-a-coisa, nem sequer se apercebendo que foi a primeira vez que me falou a sério dos seus sonhos de futuro que não envolvessem qualquer disparate adolescente. Mas ontem era dia de filosofia. De nós cegos, portanto, numa cabeça que encontra muita maior tranquilidade nas físicas e matemáticas e que fica à rasca quando tem que argumentar e consolidar posições. Ontem era sobre determinismos e liberalismos e livre arbítrios. E foi muito interessante. Falamos das nossas opções, das nossas responsabilidades pelas nossas opções, das nossas cada vez menores desculpas e justificações à medida que a vida vai decorrendo.
A determinada altura falei-lhe de uma conversa que tive há uns anos com um padre amigo. Acerca dos amores de padre, do celibato, do pretenso encerramento do coração a que os padres estão obrigados. ele dizia-me que em nada o seu celibato era diferente do meu. Que, tal como com qualquer pessoa, não conseguia impedir o seu coração de se apaixonar, não conseguia impedir a sua alma de intuir uma ligação profunda a alguém, que não conseguia deixar de se colocar a velha questão "e se..." e de se sentir encostado à parede com esses abalos sérios, de se sentir obrigado a tomar decisões, de ter a consciência que há decisões que não são definitivas porque vão sendo pensadas e reflectidas e geridas consoante as circunstâncias. E dizia-me ainda que até aquele momento a sua decisão tinha tido sempre o mesmo sentido, o da continuidade do compromisso, em nome do amor profundo que sentia por Jesus Cristo, que o enchia por completo, a ponto de não desejar ser outra coisa que não padre. Mas que, no seu íntimo, não excluía definitivamente que, a determinada altura, a sua decisão fosse outra.
Ontem, enquanto estudávamos, chegamos à conclusão que não controlamos o que sentimos no mais profundo de nós mesmos. Mas controlamos o que fazemos com o que sentimos. Controlamos as nossas decisões, as nossas escolhas, os nosso actos. "Seria bem mais fácil se tudo estivesse determinado à partida. Pelo menos a responsabilidade não seria nossa." Pois é, filho. Mas a autonomia é fundamental. E com ela vem a responsabilidade, e com ela vem a dificuldade de escolher, e com ela vem a certeza que nem sempre somos o que queremos, nem sempre somos o que os outros querem que sejamos, nem sempre somos o que deveríamos ser. Mas o importante é que saibas que, nessa tua procura, nesses teus encontros e desencontros, tens sempre com quem procurar e tens sempre para onde voltar para que possas parar e voltar a procurar. Nem que seja a propósito de uma aula de filosofia.
20151126
Sentamo-nos brevemente.A conversar. Para conversar. Tínhamos estado, momentos antes, à vez, com uma amiga comum, que conhecemos em circunstâncias muito diferentes, mas que nos atou a ambos com o mesmo laço. A determinada altura ela percebeu que quando falávamos, em momentos e lugares diferentes, de modelos, era um do outro que falávamos. E disse-nos. A ambos. Em momentos diferentes. Falou-nos da surpresa que tinha sido para ela referirmo-nos um ao outro em termos muito semelhantes. De amizade, de admiração, de modelagem alicerçada por um percurso de vida que, apesar de distante no espaço e no tempo, tem muitos pontos similares.
Foi mais um pretexto para nos sentarmos e conversarmos e partilharmos e voltarmos a aprender um com o outro. Poderia ser meu filho mas nem é como filho que o vejo, nem é como pai que me vê. Somos amigos, vamos sendo, cada vez mais, companheiros de caminho, com toda a cumplicidade que quem caminha sabe que se cria, e como frutifica.
Há uns tempos, numa formação para voluntários, foi-me pedido que referisse um caso de sucesso e um outro de frustração. No sucesso lá estava ele, o Fredo, que não me canso nunca de referenciar como exemplo de perseverança para quem anda nestas coisas. Se mais não fosse, ele já teria valido tudo a pena. De frustração, um outro, igualmente amigo, de outras caminhadas, que a determinada altura escolheu outros percursos que o conduziram inevitavelmente à morte: o Gusto. Um percurso que poderia ter sido outro, que tinha tudo para ser outro, que inclusivamente foi outro para os seus irmãos, mas que ele escolheu, e assumiu, de corpo inteiro, pelo menos até àquela noite em que nos encontramos, eu na carrinha amarela, ele na fila para a carrinha amarela, na estação de São Bento.
Na verdade, não há casos de sucesso ou de insucesso. Na verdade, não há casos. Há pessoas. Na verdade não metemos ninguém numa máquina de fazer felizes, não metemos pitadas aqui nem adicionamos condimentos acolá aperfeiçoando receitas infalíveis. Na verdade nunca deixo de ter o coração nas mãos, os olhos no céu e os pés na terra. São muitos os miúdos que me passaram pelas mãos que passaram depois pelas cadeias ou andaram a monte, a viver de esquemas que eu prefiro nem conhecer para que os possa acolher abertamente quando quiserem voltar a ser acolhidos. Na verdade é de pessoas que se trata, cheias de vida, cheias de passado, cheias de vícios, cheias de facilidades prometidas e de sonhos que rapidamente se transformam em desencantos e frustrações e motivos mais que maiores para viverem rapidamente. Na verdade, se podemos fazer alguma coisa - e é quase sempre a única coisa que podemos verdadeiramente fazer - é fazer-lhes sentir que, qualquer que tenha sido o seu percurso até aqui, o que importa é a partir daqui. Da sua resposta dependerá, muitas vezes, efetivamente, a sua vida. Perguntem ao Fredo. Ou ao Gusto. E escolham quem lhes pode responder.
20151125
Interrogo-me o que me faz carregar esta procura. Permanentemente! Uma vezes como se fosse um fardo, um fado, um destino, jamais satisfeito na sua plenitude, jamais saciado. Outras desafiador, motor, impulso, que me leva a tentar ir sempre mais longe, para além daqueles que acredito serem os meus limites, e que, quando corre, bem, me catapulta para um outro patamar. Uma procura que me é, antes de mais, interior, profundamente interior, que está cá antes de qualquer pensamento, antes de qualquer processamento lógico, antes de qualquer racionalização mas que me é tão ou mais natural que eu próprio, que provavelmente já seria antes de mim, porque desde que me conheço não me conheço noutra condição que não esta.
Questiono-me o que me faz sentir esta sintonia. Esta profunda sintonia. Esta sensação que tudo está, finalmente, no seu lugar, que todo o universo conspira para que eu encontre, finalmente, o meu lugar, para que eu, finalmente, sinta que pertenço, que estou por direito próprio, que sou por direito próprio, e não por concessão de alguém que acedeu a que eu pudesse estar, pudesse ser, por comiseração. Talvez seja o silêncio, talvez o mar, ou o olhar, a oração, talvez seja tudo isso, ou nada disso, talvez não me seja exterior mas venha do âmago, das entranhas, no lugar da alma, onde também habita Deus. Talvez por isso me serene o mar, e o silêncio da oração, e o encontro com o teu olhar... que me silencia a inquietude e me sacia a alma.
20151124
Já não sei caminhar sozinho. Já não consigo caminhar sozinho. Fazem-me companhia os que me habitam, que vão conversando comigo, que vão discutindo comportamentos e atitudes, que vão corrigindo palavras menos cuidadas, posturas menos sensatas, com as quais vou argumentando sucessivamente, escutando atentamente os seus argumentos, pesando-os, valorizando-os, até que eu possa fazer as minhas próprias conclusões. E decisões. E não me habitam apenas pessoas. Também tenho filmes cá por dentro e músicas e fotos e extratos de livros que ando a ler ou que já li e que volta e meia vou buscar para poder comparar, para poder escolher, para poder decidir sobre este ou aquele assunto, importante ou secundário, relevante ou supérfluo, que isso não importa para nada.
Nada do que faço ou digo ou leio ou vejo é em vão. Nada. Absolutamente nada! Nenhuma atitude, nenhuma conversa, nenhum alheamento, voluntário ou não, nenhum silêncio, nenhuma palavra, nada, absolutamente nada, deixa de te, em determinada altura, relevância para mim. Nem que seja por comparação. Pode não ser agora, pode não ser sequer daqui a um ano, posso recordar-me onde li, onde vi, onde ouvi, ou posso ignorar ou esquecer, mas o que é facto é que nada, absolutamente nada do que me acontece é irrelevante. E do que eu faço acontecer.
Em todos os dias de reflexão tenho diante de mim miúdos que não estão nem aí. Não querem saber das coisas de Deus, nem da fé, muito menos da Igreja, não querem saber de histórias da Bíblia nem da sua importância nas nossas vidas, não conseguem ver nas nossas discussões nada de útil ou minimamente importante para as suas vidas. Quando, como sempre acontece, entramos na capela, fecham-se no seu silêncio - que enganosamente temos o cuidado de interpretar como de respeito para que a sua indiferença não nos incomode - e desejam arduamente que aquele tempo acabe para que possam voltar para as suas brincadeiras, para as suas palermices, para a programação da noite dessa sexta feira, que isso é o que verdadeiramente importa. Houve um tempo em que isso me incomodou. Houve um tempo em que eu exigia atenção, e participação, e abertura, e estabelecia um "diálogo", arrancado a ferros, que, de certa forma, me justificasse. E o problema era esse. Justamente esse. Eu procurava era a justificação de mim, do meu papel, da minha importância naquele dia de reflexão.
Aprendi a semear. Apenas isso. Tento semear. Vou mondando a terra, ao longo do dia, uma erva aqui, uma pedra acolá, vou escutando, atentamente, o que um e outro dizem, a forma como dizem, a forma como conversam e brincam e jogam bola ou às cartas, vou brincando eu também, com eles, mondando a terra, lentamente. E lançando a semente. Não me preocupo já com vê-la crescer. Acredito que outros o hão de fazer, noutras circunstâncias, noutras vidas, quando as verdadeiras questões chegarem e eles se recordarem, não de mim, não daquele dia de reflexão, mas que algures, num qualquer dia, alguém que nem se recordam lhes falou numa samaritana e num encontro com Jesus num poço e da transformação que aí aconteceu. E nessa altura, sem o saberem, sem sequer suspeitarem, caminharemos juntos.
20151123
Serenar, organizar as ideias, ver, agir. Em conformidade.
Comecei ontem a ler um livro do Miguel Sousa Tavares. Como me acontece muitas vezes quando o leio, as suas descrições de um lugar dão-me uma vontade de, logo ali, naquela altura, fazer a minha mochila e partir para aquele lugar que ele tão bem descreve. Apetece-me ouvir os pássaros que ele ouve, estar no alpendre onde ele está, no pequeno apartamento que alugou num sítio que nem sei bem onde fica e escutar a noite como ele escuta.
Raras vezes, sou assaltado pelos "e se...": ... e se tivesse a coragem de partir? ... e se largasse tudo, de repente, sem comos nem porquês?... e se fizesse apenas o que me desse na real veneta sem ligar para as consequências?... e se vivesse, efectivamente, cada dia como se fosse o último?
Um dia destes, enquanto via uma apresentação da missão a Timor, tive que me levantar e procurar um outro lugar onde pudesse estar mais longe dos olhares dos que me rodeavam. Senti uma saudade imensa de Quelimane, daqueles miúdos, daquela forma de vida, daquela entrega total e absoluta sem pensar em mais nada, sem perguntar mais nada, sem desejar mais nada. Senti ma vontade tremenda de voltar a partir, desta vez por mais tempo, desta vez fazendo mais, desta vez sendo mais decisivo, desta vez não de visita mas armando tenda e habitando, no meio deles.
Paradoxal, não é? Querer partir apenas para chegar e ficar. Querer soltar amarras apenas para as poder voltar a prender num outro cais. Querer largar para poder voltar a agarrar.
No sábado recebi outra notícia tremenda: um amigo, de há muitos anos, descobriu por acaso que tem um cancro. Mau. Muito mau. Mais um abalo neste tempo que tem sido pródigo em abalos e que, como sempre me acontece em tempos de abalos, me remete para Job. E pensei logo no que faria se fosse eu. Se ficaria por cá a morrer aos pedaços ou se faria o que sempre intui que faria numa situação destas: iria morrer longe, como os elefantes. Sabia a resposta. Sei a resposta. E os meus também a sabem.
20151121
Vi-o sair, nitidamente mais cabisbaixo que o costume. "Então? Está tudo?" "Nem por isso." Pressenti o seu desejo de conversar, apesar de nunca termos trocado mais que palavras de circunstância numa qualquer reunião de pais das nossas filhas.
"Que se passa?" "A minha mulher morreu."
Nada nos prepara para ouvir isto, muito menos de chofre, muito menos numa conversa que não era suposto acontecer. A tristeza do seu olhar era agora indescritível, e eu perguntava-me como não pudera ver isso antes.
"Estávamos tão bem, agora... a nossa filha a trabalhar... tínhamos ido de férias em setembro... dia 22 morreu no hospital... cancro... sinto-me perdido em casa... sozinho..."
Parece que se acantonou de armas e bagagens por estes lados. Sonho com ela recorrentemente, penso nela mais que o costume, porventura mais que o que devia, como se fosse uma sombra permanente sobre o ombro. Sempre presente.
"...hoje não vou poder ir: morreu o irmão de um amigo e eu quero ir dar-lhe um abraço..."
Tem pesado nos meus dias, pairando, como uma nuvem, quase impercetível, quase inconsciente, mas presente, sempre presente.
"... parabéns, mano velho... hoje farias 51 anos..."
e a foto do Paulo, e a voz do Leonel, e as memórias de volta, passados tantos anos, inacreditáveis, ainda inacreditáveis, "o Paulo morreu", e a necessidade de estar lá, junto dele e de todos eles, que sempre me disseram tanto...
"... esperam que o Jorge acorde amanhã..."
e eu, calado como sempre que se fala do Jorge, a moer para dentro, como sempre que se fala no Jorge, a acordar ainda a noite é pequena, como sempre que se fala no Jorge e ele me faz companhia e me rouba o sono... Ainda ontem, estupidamente, pareceu-me vê-lo, de mochila às costas, como estupidamente me parecia ver o Paulo meses depois, e a Carmen, e o Gusto... como se eu sofresse de (mais) uma deficiência qualquer que me impossibilitasse de olhar a realidade e a conseguir vê-la tal qual ela é e não como desejaria eu fosse, não como a construção que faço a partir dela
20151118
Na semana passada, conversava com um dos meus filhos acerca de carros. Nós somos assim: conversamos de tudo e de nada, de fé e política, de convicções e diversões, de filmes e cartoons, de carros e jogos, de testes e filosofia... não temos uma cartilha de conversas importantes e secundárias, todos os motivos, todas as horas, todos os momentos, são bons para aprendermos juntos. Mas naquela altura era de carros que falávamos. Adolescente como é, cheio de "velocidade furiosa" na cabeça, contava-me o seu fascínio por eleanors, e mustangs e outros que tais. Eu contrapunha com classes E e series 5 e ele dizia-me - como me dizem todos eles - que eu estava a ficar velhote.
É verdade! Mas não é apenas isso.
As minhas benditas caminhadas matinais junto ao mar têm feito o seu caminho cá por dentro. Têm sido uma oportunidade para reeducar os sentidos. Logo que desço da avenida para junto ao mar o som muda com uma rapidez impressionante e fico apenas com o som das ondas, das gaivotas e do vento - o coaxar das rãs só lá para a primavera - vou-me apercebendo das subtis mudanças da paisagem, a progressiva descoloração dos arbustos, o lavar do mar pelo aumento de agressividade das ondas, até da mudança nas pessoas que passam por mim consigo reparar! É todo um mundo novo que eu andava a perder e que, lentamente, naquela hora matinal, vou tentando recuperar. E como gosto de o fazer!
Tenho uma visão recorrente de há muitos anos. Na verdade, não sei bem se é uma visão ou um sonho ou uma cena qualquer de um filme ou de um livro que acabou por ficar gravada na minha memória. Mas sei que aquela paisagem agreste à beira mar, elevada, com uma casa térrea no meio do nada e eu, devidamente acompanhado, fazem parte do meu imaginário de futuro, do meu projecto de futuro, se quiserem. E sobretudo, serenidade. Muita serenidade. Os meus livros que há décadas guardo para ler na velhice, a boa música jazz, clássica, folk... a minha guitarra. De tudo isso, apenas me falta o lugar... e a serenidade. Mas desta estou já a tratar. O lugar, a seu tempo, chegará.
20151116
Gostei sempre de filmes épicos. Aqueles em que se luta até ao limite das forças, contra todas as probabilidades, contra tudo e contra todos, sempre em nome do amor. Então se for com morte certa, se ficar apenas um para a história, melhor ainda. Com extraordinária facilidade sinto-me catapultado para o centro dos acontecimentos e também eu me vejo lá, orgulhosamente lá, a lutar sozinho, a morrer sozinho e, sobretudo - porque isto é o que verdadeiramente me seduz - a ser finalmente reconhecido como um herói por aqueles em nome de quem abnegadamente lutei.
É evidente que se o que me emociona é o reconhecimento final, a minha luta é tudo menos desinteressada. Até porque normalmente sou mais sensível a este tipo de epopeias quando estou mergulhado até ao pescoço em algum tipo de alhada da qual não consigo forma de me livrar de cabeça erguida. Então, nada melhor que um ato heróico que me faça tirar da mediocridade e elevar-me à justificadíssima, evidentíssima, condição de herói da humanidade. E é justamente esta sensação de viver na mediocridade que nos deve fazer pensar.
Se não me deixa de espantar que jovens ocidentais se sintam atraídos pela absoluta loucura que conduz aos atentados que tomam conta dos acontecimentos globalizados, interrogo-me acerca do estado psicológico e moral em que se deve encontrar quem se descobre seduzido por tamanha radicalidade. Eu até entendo o clima de nada a perder que lhe está subjacente. Perturba-me sempre, mas consigo entender a mecânica psicológica do suicídio. Sobretudo para quem tem fé, morrer não é, de longe, o pior que pode acontecer. A desesperança, o sem sentido, o sem futuro, o sem razão, sobretudo se quotidiano, sobretudo se solitário, consegue ser um inferno de horrores para quem o sofre. E viver assim é viver em terra árida. E viver assim é ficar permeável a uma qualquer ideologia, a uma qualquer promessa, a uma qualquer loucura que nos rouba de nós próprios e nos conduz à insanidade total. Pessoas assim, que sentem que nada têm a perder, são as mais perigosas de todas, porque acreditam que o melhor que lhes pode acontecer é morrer. E se morrer dentro dos trâmites do seu próprio código de honra - que para os de fora não faz qualquer sentido - melhor. Não tem a ver com virgens prometidas, não tem a ver com fanatismos de fé. Tem a ver com conquistar um sentido para a vida, que arrebate da solidão profunda em que se encontra e a substitua pela razão de viver.
Não acredito nada, absolutamente nada, que a melhor resposta seja com armas na mão e ameaças e proibições. Provavelmente até seria aquela que eu decidiria se estivesse em lugar de decidir, mas essa não é a resposta. É outra. Mais a montante, mais silenciosa, como silencioso é o percurso que os leva a chegar àquele desespero. A resposta só pode ser tentar dar sentido à vida, só pode ser impedindo a estrutura mental do "nós" que se sobrepõe aos "outros", só pode ser restituindo a dignidade a quem todos os dias sufoca à procura dela. E isso apenas se faz pela inversão do que nos tem guiado há gerações: a lógica do poder.
Acredito que é tempo de voltarmos à civilização do amor, da ternura, da disponibilidade, da atenção ao outro, à lógica do serviço ao outro, de o colocarmos no centro da nossa atenção. Soa mal, não soa? Soa a anacrónico, não soa? Soa a sacristia, não é? E ninguém quer isso, que fica mal, é tão pouco apelativo, tão pouco moderno! E afinal, nós, os cristãos, os católicos, estamos finalmente tão perto da modernidade, até temos finalmente um Papa fashion, iríamos agora recuar em nome de quê? De Jesus? Do Cristo? Que ideia!
20151112
No sábado, por entre reuniões de trabalho, almocei com gente tida como importante. No entanto, sentia-me completamente em casa. Como sempre acontece naquela família, tivera sido muito bem acolhido, sintonizo-me com a sua forma de ser e de estar, identifico-me com a sua forma de trabalhar e servir, e quando isso acontece, esqueço com extrema facilidade os cargos ligando-me apenas às pessoas. Na altura, enquanto a conversa vai fluindo, isso não me incomoda absolutamente nada: sorrio quando tenho que sorrir, concordo quando tenho que concordar, tento argumentar quando isso não acontece, como se estivéssemos verdadeiramente entre família, onde os cargos que se ocupam são sempre circunstanciais e perfeitamente secundários. O problema é que quando isso acontece tendo a preservar-me pouco, porventura a revelar-me em demasia, a cometer alguns erros - que apenas a mim me comprometem, no entanto - e nem sempre saio bem visto da coisa.
Mais tarde, quando passei a conversa em revista, quando revisitei aquele almoço, cheguei à inevitável conclusão que provavelmente teria ganho mais se tivesse sido mais comedido, se jogasse à defesa, se tivesse mantido algumas cartas na manga para as poder lançar quando melhor me conviesse. Mas, sinceramente, já não tenho idade nem pachorra para isso. Se nunca tive grande apetite para esse tipo de joguinhos, apercebo-me que à medida que a idade vai passando, me sinto cada vez menos disponível para esse tipo de fitas. Claro que tento sempre evitar o ridículo - às vezes sem o conseguir - tento sempre ter algum juízo, porque apesar de me sentir em família, não é propriamente a casa da mãe joana. Mas estou já uma fase da vida em que prefiro, de longe, ser aceite ou não pelo que sou, que investir no que gostaria que fosse, e muito menos no que os outros gostariam que eu fosse.
Principalmente no meio do nevoeiro.
20151111
...e de repente, depois de uma série de anos de calmaria, ondas vindas de vários quadrantes atingem-me o barco. Parece que tudo mexe, parece que nada mais será como antes, parece que os deuses se reuniram em conluio para me agitarem as águas e testarem as minhas escolhas. A nível pessoal, profissional e agora até a nível nacional, as verdades que ainda ontem o eram inquestionavelmente hoje são já ultrapassadas pela realidade que, apesar de incrédula, é indesmentível.
Conversávamos ontem ao jantar acerca da imprevisibilidade da vida e das nossas reações quando tudo parece escapar ao nosso controlo. E vamos sempre ter à incógnita do amanhã e ao Carpe Diem, que ainda ainda assim tem múltiplas interpretações: se há quem ache que o que importa é viver tudo hoje e com isso cometa as maiores loucuras, outros acham que o importante é a qualidade da marca que deixamos nos outros e com isso viva voltado para fora. De comum às duas visões, a premência da vida que teima em escapar-se-nos por entre os dedos e a deixar-nos um sabor amargo na boca sempre que desperdiçada.
A minha filha disse-nos ontem que tinha estado com a Lurdes, que se tinha comovido com a sua serenidade, com a sua sabedoria profunda, com a sua capacidade de entrega aos outros, apesar de lhe ter sido diagnosticado um cancro terminal há vários anos. Como tem acontecido ultimamente, fomos ter ao Jorge, que tem sido um abalo duro para todos nós. Outra filha minha disse que era muito confuso para ela quando pensava que mesmo que ele recupere e fique bom - um cenário cada vez menos provável - haverá pelo menos três semanas da vida dele que serão inexistentes para si. Outro filho disse que pela primeira vez na vida se tinha questionado a sério acerca do rumo que tinha tomado para si... escutava-os, como sempre, completamente embevecido, como quase sempre, completamente grato pelo que fomos construindo juntos ao longo da vida.
Há alturas em que tenho a noção clara que estou em viagem, apenas em viagem. Que não comecei aqui, que não vou acabar aqui, que o que se passa por aqui, o que é dito e vivido e sentido e desfrutado é a antecâmara de algo muito maior. Não me rouba a alegria nem a tristeza nem o choro ou o riso. Não me rouba a preocupação nem o gozo nem o desânimo ou a força. Não rouba vida à minha vida, que é composta de dias e semanas e segundos e anos e meses e minutos e até de um outro tempo sem tempo, que até acredito que é o tempo onde se passa aquilo que é verdadeiramente importante.
Mas dá-me a certeza que nada, absolutamente nada, do que sou, se esgota aqui.
Há conversas que nunca acabam. Poderíamos estar ali, uma vida toda, com o tempo todo, com o sol todo, e a brisa, e a paisagem, e tudo o que nos rodeia, que haveria sempre qualquer coisa que ficaria por dizer. E partilhar. e sentir. Quando, a custo, nos afastamos - e é sempre a custo que o fazemos - ecoa ainda tudo o que não foi dito. É o que dissemos que é passado em revista, uma e outra vez, num e noutro sentido, mas é no que ainda não dissemos que me detenho. Porque não foi dito. Terá sido condicionado? Terá sido voluntário? Talvez não tenha sido ainda o tempo de o fazer, talvez seja ainda cedo, talvez seja agora demasiado tarde, talvez ainda seja necessário mais caminho, talvez...
Provavelmente, seria mais fácil se as palavras não tivessem que ser ditas. Se tudo funcionasse por osmose, sem termos que fazer nada por isso, sem ter que ser escolhido e por isso pensado e decidido e deliberado, mas fluísse apenas, permitindo a certeza da evidência, clarificando com a certeza da evidência, sem mais nada a não ser o que é. Mas aí perderíamos o olhar e as alterações do olhar que respondem ao acelerado bater do coração, que reage ao súbito afloramento do sangue que impele as coisas desejadamente escondidas, involuntariamente reveladoras porque tomam conta do que preferiríamos que permanecesse escondido dos olhares alheios, tantas vezes até do nosso próprio olhar. E as palavras ditas têm esse péssimo hábito de ganhar vida própria quando menos o desejamos revelando mais que o que desejamos revelar, fazendo de nós tontos balbuciando uma qualquer desculpa alegando um qualquer mal entendido que se tornou demasiado bem entendido por todos.
Provavelmente, as palavras não ditas são as que permanecem, quando nos afastamos, e permanecem, apesar da distância que aumenta, e permanecem, impedindo que as nossas almas acompanhem os nosso corpos, e permanecem, apesar de... Talvez as palavras não ditas sejam aquelas que nos fazem caminho, nesta solitude acompanhada, que prepara o meu olhar para o teu olhar quando finalmente permitir que escutes tudo o que tenho para te dizer.
Provavelmente, seria mais fácil se as palavras não tivessem que ser ditas. Se tudo funcionasse por osmose, sem termos que fazer nada por isso, sem ter que ser escolhido e por isso pensado e decidido e deliberado, mas fluísse apenas, permitindo a certeza da evidência, clarificando com a certeza da evidência, sem mais nada a não ser o que é. Mas aí perderíamos o olhar e as alterações do olhar que respondem ao acelerado bater do coração, que reage ao súbito afloramento do sangue que impele as coisas desejadamente escondidas, involuntariamente reveladoras porque tomam conta do que preferiríamos que permanecesse escondido dos olhares alheios, tantas vezes até do nosso próprio olhar. E as palavras ditas têm esse péssimo hábito de ganhar vida própria quando menos o desejamos revelando mais que o que desejamos revelar, fazendo de nós tontos balbuciando uma qualquer desculpa alegando um qualquer mal entendido que se tornou demasiado bem entendido por todos.
Provavelmente, as palavras não ditas são as que permanecem, quando nos afastamos, e permanecem, apesar da distância que aumenta, e permanecem, impedindo que as nossas almas acompanhem os nosso corpos, e permanecem, apesar de... Talvez as palavras não ditas sejam aquelas que nos fazem caminho, nesta solitude acompanhada, que prepara o meu olhar para o teu olhar quando finalmente permitir que escutes tudo o que tenho para te dizer.
20151110
Na minha família de cientistas, os meus olham para mim com a mesma naturalidade com que se olha para um elefante vestido com um tutu cor de rosa. Volta e meia, enquanto eles estão a discutir enzimas e bactérias e outras coisas que tais, eu, meio para os provocar meio a sério, digo-lhes que encontro mais certezas nas coisas do Espírito Santo que naquilo que eles estão a dizer. Para além da natural provocação - que me dá um gozo especial quando os meus cunhados irlandeses estão cá (eles são mesmo cientistas!) - eles sabem que acredito naquilo que afirmo, e eu deixo que isso os escandalize.
Quando consigo provocá-los a ponto de discutirmos a sério, tenho o cuidado de substituir o Espírito Santo pela alma, o que, não sendo para mim a mesma coisa, permite no entanto despir a carga teológica da discussão e abrir caminhos comuns, defendendo a minha dama porque a verdade é que eu acredito mesmo nas coisas da alma, na importância da alma, na inevitabilidade da alma, que a essência do que somos e faz de nós as pessoas que somos está mesmo na alma. Claro que todos temos uma história de vida e condicionantes psicológicos e aportes físicos e sociais que nos vão construindo e desconstruindo sucessivamente numa séria de processos encadeados que têm o seu quê de racional como de circunstancial e que, apesar dos nossos esforços, têm tanto de programação como de improvisação, Graças a Deus, porque é justamente isso que torna a vida tão rica e tão desejável. Mas mesmo com tudo o que nos rodeia, mesmo com tudo o que vem de fora para dentro, há uma reserva que pensamos que nos diz apenas respeito a nós próprios mas que eu acredito que, pelo contrário, diz respeito aos outros: a nossa alma.
Claro que para falarmos da alma temos que o fazer num outro patamar que deixa os meus cientistas desconfortáveis. Aqui nada é palpável, nada é visível, nada é comprovável. Sentimos, sabemos que sentimos, por vezes até conseguimos racionalizar o que sentimos, mas atingimos sempre a margem do desconhecido, que pode ou não desembocar na escolha do caminho da fé. E aí é que o caminho se torna difícil para quem faz da racionalização e da observação e da comprovação o seu quotidiano, a sua vida, não raras vezes a sua razão de viver. Passar do que controlam através dos sentidos para a entrega da alma exige uma humildade que não lhes é permitida. E que lhes exige, por isso, uma capacidade de abandono e entrega ainda maior que ao comum dos mortais.
20151105
Existem muitas maneiras de sermos culpados. Basta procurar. É como numa operação stop: podemos ter tudo em ordem, pode o carro ter vindo da vistoria há duas horas, podemos ser o condutor mais cuidadoso do mundo, mas se o polícia acordou mal disposto não temos nada a fazer. Há sempre uma luz que pisca, há sempre uma luz que não pisca e devia piscar, há sempre um traço contínuo que se ultrapassa, há sempre um sinal que foi roubado mas devia estar lá e nós não o vimos. Há sempre uma maneira de sermos culpados.
Adoro escutar. Pela quantidade e, sobretudo, pela qualidade das pessoas que se abrem comigo, fui aprendendo que este deve ser um dos meus dons. Que me esmero em colocar em prática. Algumas vezes ainda fico demasiado absorvido pela data limite que o trabalho sempre nos impõe, mas tento ir ficando mais atento a quem se aproxima - ainda que ao longe - tento ir lendo nos olhares - ainda que se desviem - tendo ir disponibilizando um lugar para que, quem quiser, quando quiser, se quiser, se possa sentir acolhido. E quando chega a altura, paro tudo, nem que seja por breves minutos, nem que seja por alguns dias, e aquela conversa, aquela partilha, aquela preocupação, passam a fazer parte dos meus silêncios orantes, das minhas procuras interiores, habitando-me juntamente com quem se partilhou comigo.
It takes two to tango. E isso pode ser um problema. Porque existe uma verdade lapaliciana que defende que para existir quem escute é preciso haver quem queira partilhar. E isso pode ser um problema. E isso é um problema.
Existem muitas maneiras de sermos culpados.
Basta procurar.
20151104
"Ele estava ontem com questões existenciais. Pelas mensagens que lhe enviam, ele não sabe se não deveria alterar a sua rotina para ficar mais em consonância com a dor que deveria sentir."
Sorri, para dentro, e percebi bem o seu dilema. Os outros esperam sempre que tenhamos um determinado tipo de atitude, que demonstremos um determinado tipo de dor, ou de alegria, ou de indiferença, e, muitas vezes sem o desejarem, julgam-nos por isso. Eu aprendi há muitos anos a não dar especial relevo às expectativas dos outros. Vejo, escuto, interrogo-me, faço o meu próprio julgamento, e tento seguir caminho. Normalmente sem sequer me preocupar em explicar as minhas decisões, o meu comportamento, as minhas atitudes. A não ser que magoe alguém por isso - e aí uma explicação é exigível - nunca me apetece justificar-me, nunca sou bom em justificar-me, nunca consigo justificar-me sem ter aquela sensação que ninguém tem nada a ver com isso. A não ser que eu o queira, a não ser que eu lhe tenha dado o meu consentimento para o fazer.
Mal soubemos do Jorge corremos ambos para o hospital. Quando soubemos que nada mais poderíamos fazer senão esperar e rezar, fomos ambos, a custo, para casa e tentamos todos, a custo, prosseguir com as nossas vidas. Mesmo com o Jorge permanentemente na nossa cabeça, temos tido gargalhadas francas, sorrisos sinceros, momentos verdadeiramente felizes. Porque acreditamos que é estúpido sentirmos culpa por termos momentos de alegria e felicidade, porque desejarmos muito que o Jorge estivesse connosco não pode imprimir um cunho de miserabilismo nas nossas vidas, porque o Jorge, se pudesse, seria o primeiro a rir connosco.
Os meus filhos aprenderam cedo a terem que lidar com a perda. Pode parecer herético, mas começaram por ter que lidar com a morte do Aquiles, o meu cão desde que eles eram miúdos, e isso ajudou-os, mais tarde, a lidarem com a perda do avô que eles adoram. Aprenderam com a morte que na vida há lugar para o imenso, seja esse imenso traduzido em forma de dor, de choro, de gargalhada ou rejúbilo. Aprenderam que o imenso da vida é para ser imensamente vivido, e que apenas isso torna a vida imensa. Aprenderam que todos somos passageiros nesta viagem em que tudo é passageiro, excepto aquilo que nos transforma verdadeiramente e que levaremos como bagagem para a etapa seguinte. E por isso aprenderam que a autenticidade do choro e do riso valem mais que todas as aparências do mundo.
20151102
Não foi a primeira vez. Ali estávamos nós, como estamos em cada dia 1 de Novembro, no cemitério, junto daqueles que jazem à nossa frente, acompanhados daqueles que ali estarão, em princípio, daqui a algum tempo. Nenhum outro lugar me consciencializa com tanta evidência do ciclo da vida. Lembro-me que há um par de anos, neste mesmo dia, olhava para a Tia Micas e tinha a percepção clara que ela imaginava que estaria ali, dou outro lado, no próximo 1 de Novembro. E ontem lá estava ela, efectivamente.
Estava um fabuloso final de tarde, ontem. O cemitério não tão cheio - "os velhos vão morrendo e os novos não vêm a estas coisas" - o Padre Rosas a celebrar, e eu a olhar à minha volta, a ver os meus velhos que me rodeavam, a ver alguns dos amigos de sempre a prestarem homenagem aos seus pais, amigos, familiares, e eu a olhar para o céu, a conseguir ver o laranja forte do sol nas nuvens carregadas de água "está um belíssimo final de tarde!" e a pensar no Jorge, que normalmente andava por ali, atarefado, organizando e vigiando para que tudo corresse bem, e que agora não fazemos ideia de como está, de como irá estar, se terá futuro ou não, de que lado estará ele no próximo 1 de Novembro...
A minha avó, os tios, a minha sogra, os meus pais, agora o Jorge, têm-me forçado o olhar para um outro lado da vida, que normalmente não vejo, que normalmente escolho não ver, entretido com a construção do meu futuro e do futuro dos meus, e que me levanta outro tipo de questões, e que me pede outro tipo de respostas, e que me coloca perante a incerteza da vida, a finitude da vida, a importância de viver efectivamente a vida.
Não me recordo de ter medo da morte. Sempre intui que me poderiam acontecer coisas bem piores que a minha própria morte. Confirmei essa intuição quando a minha filha esteve mal, quando pensei que morria de desilusão provocada, quando não dei qualquer valor a voltar, seja para onde fosse. Não tenho medo da morte. Tenho um medo tremendo de desperdiçar a vida.
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Bambora
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