Vivemos sempre numa pequena comunidade familiar. Como vizinhos de porta tivemos os meus sogros e uma data de tios, uns com filhos outros sem. Durante anos, beneficiamos imenso dessa proximidade: os meus filhos nunca souberam o que era levantar cedo para ir para o infantário, sempre tiveram a comidinha caseira quando andavam na primária e sempre tiveram alguém à sua espera com um almocinho quente ou um lanche preparado cheio de mimo quando chegavam da escola. Nós, pelo nosso lado, também nunca soubemos o que era vir trabalhar deixando os filhos com febre num infantário, sempre tivemos quem cuidasse deles, quem os acompanhasse de perto, quem os mimasse como apenas quem tem muito tempo sabe mimar. Ganhamos todos: nós, pelo descanso e confiança, os nossos filhos, pelo cuidado e acompanhamento, os meus sogros e tios, porque tinham sobre quem se debruçar no entardecer da sua vida.
Agora, de alguma forma, as situações inverteram-se: são já eles quem precisa de cuidado e de mimo, e somos nós quem está em condições de os irmos providenciando. São eles quem, agora, nos batem à porta, quem tem as refeições quentinhas e os miminhos ao fim do dia, quando todos chegam a casa.

No meio disto tudo, eu fico sempre um pouco à margem. Por pura incapacidade. Disponibilizo-me para o que é necessário, mas não tive nunca a capacidade de me tornar presente, qualquer que fosse o momento, qualquer que fosse a circunstância, como a Isabel tão bem faz. Mesmo perante a disponibilidade dos meus filhos (particularmente das minhas filhas, que são mais desembaraçadas neste campo), eu fico sempre muito aquém, refugiando-me excessivamente no meu pequeno mundo e, sobretudo, desculpando-me com as minhas enormes dificuldades. Bem sei que a infância marca muito e o facto de eu, nos primeiros anos de vida, ter passado por uma imensidão de moradas, dificulta a minha ligação natural a tudo o que não é o meu núcleo familiar. Os outros dificilmente deixam de ser os outros, e apenas consigo ultrapassar esta limitação fazendo um esforço consciente de que assim não está correto.

Esta Quaresma está a ser particularmente desafiante. Todas as juras de amor e conversão têm sido postas à prova, quase todos os dias, e quase sempre perdi.
Parece que estou no bom caminho.

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