Ensinou-me a minha mãe, provavelmente sem sequer se ter dado conta disso, que eu não preciso da perfeição para amar. Frequentemente deparo-me com pessoas para quem estas duas coisas estão associadas: perfeição e amor. Acham que apenas a beleza é digna de ser amada, que no amor e na amizade tudo tem que ser sintonia, tudo tem que ser confluência, como se fosse apenas possível existir amor entre duas pessoas absolutamente coincidentes - o que as tornaria uma só, e esse amor necessariamente egocêntrico. E temem sempre a discussão, o confronto. Essas pessoas não percebem como posso, por exemplo, não gostar mesmo nada de determinada atitude de alguém e ainda assim gostar muito dela. Não entendem como, numa discussão, entro em claro confronto com as suas ideias e me bato pelas minhas - exacerbadamente, quase sempre, e isso é algo que tenho sempre que corrigir - e finda a discussão continuo tudo como dantes, como se tivéssemos pontos de vista absolutamente convergentes.
Há uns anos, conheci uma amiga que me ajudou a perceber isto muito claramente. As suas opções de vida estão em clara oposição com as minhas e, no entanto, ensinou-me com a sua atitude que poderíamos ser bons amigos partilhando visões completamente distintas. Nas nossas conversas eu descobria sempre uma maneira nova de olhar o mundo, a partir de uma perspectiva completamente nova, completamente descomprometida, que me abalava e me obrigava a questionar-me e me levava a descobrir até que ponto aquilo que eu defendia era mesmo o que eu queria defender.
É um risco, ser amigo de alguém assim. E, acima de tudo, é fonte de preocupação para aqueles que connosco partilham a vida e por isso temem que a vida dê uma volta de cento e oitenta graus. Mas é imensamente gratificante. Pensar sobre a vida, meditar sobre as minhas grandes questões, confrontar-me com alguém que respeito mas que tem uma visão completamente diferente da minha, é tremendamente desafiante, mas é determinante para que as fundações, as minhas fundações, aquelas que suportam o meu quotidiano, sejam verdadeiramente as minhas. E por vezes não tenho assim tanta certeza que isso acontece.
É por isso que todos os meus amigos são maiores que eu. Porque procuro, instintivamente, pessoas que tenham a capacidade de me confrontar comigo próprio. E todos os dias aprendo com eles.

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