Nunca mo tinham perguntado assim, de forma tão clara e direta, tão olhos nos olhos, tão alma na alma, suspendendo as palavras até que ecoasse a minha resposta: "gostas do que vês quando te olhas ao espelho?". A pergunta, como qualquer boa pergunta, não era bem uma pergunta mas uma necessidade de constatação. Antecipávamos ambos, pelo que nos conhecemos, a resposta, e seria uma enorme surpresa se tivesse sido outra. Foi justamente porque sabíamos a resposta que a pergunta tinha sido feita. E foi devidamente dada.

Nunca me considerei definitivo. Em nada. Em ninguém. Em nada porque desde muito novo que me habituei a reconstruir a minha paisagem quotidiana. De cada vez que mudava de casa - e foram muitas - mudavam também os cheiros e os toques e os sons e as vistas e agarrava-me ao que permanecia, apesar de tudo, eu e (fugazmente) os meus. Em ninguém porque com as casas vinham os vizinhos e os amigos e os colegas da escola e os professores e os amigos, e tudo isto era definitivo... até à próxima vez.

Sempre me considerei provisório. Em tudo. Em todos. Em tudo porque fui obrigado a desenvolver aptidões que rapidamente se ajustassem ao que me envolvia. Era preciso cantar? Canta-se. Era preciso tocar? Toca-se. Era preciso fazer rir? Palhaça-se. Rapidamente e em força, que amanhã é um outro dia e - nunca se sabe! - um outro lugar. Em todos porque todos sempre foram mais. Mais estáveis, mais inteligentes, mais consistentes, permanentes. E ser provisório é viver intensamente. Tudo. Sempre. Que amanhã é outro dia. Um outro lugar. Um outro alguém. E não há sequer tempo para causar uma segunda impressão.

Até que fui pai. E descobri como posso ter o imenso dentro de mim. E aprendi como posso ser o imenso para alguém.

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