À medida que vou envelhecendo, parece que um certo Natal vai envelhecendo em mim. Lembro-me com alguma nostalgia de uma véspera de Natal em que era quase hora da ceia e eu ainda estava na baixa do Porto, mergulhado num trânsito caótico, feliz da vida enquanto todos à minha volta estavam com ar desesperado. Na altura, Natal era também muito isso para mim: confusão, compras, movimento, música no ar e luzes a piscar. E depois, já em casa, era aproveitar a magia a que apenas os filhos emprestam ao Natal, com a sua felicidade extrema, com os seus gritos de alegria, com a sua inocência que, uma vez partida, já não regressa da mesma maneira. A nossa felicidade era a antecipação da sua felicidade, a nossa alegria era o gozo prematuro da sua alegria, a nossa maior prenda de Natal eram as suas prendas de Natal.

A determinada altura a vida impôs um outro tipo de condições. Os presentes já não eram bem os desejados mas os possíveis, e com isso o Natal começou a ser por mim vivido com um certo amargo de boca e com algum sentimento de culpa. Por muito que apele à racionalidade, há facetas em mim que nunca se hão de deixar de se sobrepor ao raciocínio lógico, e, por muito que me dissessem ou tentassem fazer-me sentir que não tinha importância nenhuma, a mágoa não deixa de existir apenas porque sim. E o Natal, a partir daí, ganhou uma outra cor, que acabou por se juntar ao crescimento dos filhos e à perda daquela magia que antes tinha.

Recordo com muita saudade um Natal de há dois ou três anos atrás em que fui convidado para cantar numa das estações do Metro do Porto. Acompanhado de uma data de miúdos do Primeiro Ciclo do Colégio, fomos para a estação da Casa da Música e cantamos durante duas ou três horas para as pessoas que passavam a caminho das suas vidas. Eu, que, como sempre acontece, acedi a custo a participar naquela iniciativa, descobri nela uma outra maneira de saborear o Natal, estampada nos olhares quer dos miúdos que cantavam comigo, quer nos dos transeuntes que paravam, sorrindo, para nos escutar.

O Natal, sem esta componente de entrega mútua e de celebração litúrgica, faz hoje muito pouco sentido para mim. Talvez esteja a ficar velho. Ou a precisar de netos ;-)

PS: nunca escrevi tanto, nunca tive tantos leitores (30000 visualizações) como ao longo deste ano. A escrita é normal: preciso de escrever, principalmente quando estou confuso, em dificuldades, agradecido, preocupado, calmo, nervoso, com problemas, durmo mal, como bem, converso, me arrependo, faço asneiras, partilho, estou apaixonado, amo... 2015 foi um ano repleto disso tudo e de muito mais; os leitores assustam-me. Sempre. Mas vou ficando cada vez melhor em esquecê-los quando escrevo. Ainda que isso me possa trazer problemas.

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