Sempre que o tempo e o trabalho o permitem, tenho começado os meus dias caminhando na Foz. As manhãs frias, a omnipresença das nuvens carregadas de água e o vento frio, curiosamente, potenciam a minha reflexão e consequente oração matinal, como se um ambiente belo mas agreste fosse necessário para me repensar, como contraponto aos dias solheiros e quentes, que me despertam a enorme gratidão a um Deus que me ama.

"Devias ter tido mais cuidado. Foste um bocado rude, hoje, na reunião."

Desde que nos conhecemos que é assim. O meu grilo falante, sempre atento, sempre cuidadoso, sempre preocupado em que mostre apenas o melhor de mim e guarde aquilo que, francamente, não interessa a ninguém. Volta e meia, quando me descaio, lança-me um daqueles olhares fulminantes e eu sei que acabei de meter água. Por vezes, quando estou mais sereno, acato e tento remediar logo na altura. Outras, no entanto, ando demasiado zangado comigo mesmo para que isso aconteça e continuo, cheio de mim, no meu processo de perda. Porque é disso que se trata, de fazer ganhar ou deixar perder.
É muito esta linguagem tácita, silenciosa, que dispensa as palavras, que tem alicerçado o nosso casamento. Adoramos conversar um com o outro - é, confesso, uma das minhas maiores fontes de confiança em relação ao nosso futuro - mas nem sempre precisamos de o fazer. Um olhar, um silêncio, um esgar, e temos o eco um do outro, ao qual se juntam anos e anos de conversas e discussões e partilhas e caminho construído a dois. Por vezes, na maior das tempestades, somos o único reduto: vemos o que o outro não consegue ver, mergulhado na desesperança e no derrotismo. Desde a altura em que nos descobrimos um, que nos temos e sabemos que nos temos. É uma segurança que se fundamenta na construção de tudo o que tem sido a nossa vida, recheada, como qualquer vida, de pequenos e grandes momentos, alguns dos quais apenas quando colocados sobre o altar encontram o seu sentido.

Há dias em que é mesmo importante que eu comece os dias por caminhar na Foz!

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