Ontem, depois de ouvir o discurso do Primeiro Ministro, fui estudar. O dia fora enorme e intenso, às 21.30 tinha duas reuniões ao mesmo tempo - uma do jornal da paróquia outra da Pastoral Familiar - pelo que não tinha tempo a perder: ainda poderia aproveitar uma boa meia-hora. No meu livro de Teologia Espiritual - é a cadeira do momento - tinha algo assim: "Neste processo de transformação a fidelidade do crente é posta à prova: crer, na total escuridão; amar, no abandono; esperar, contra toda a esperança."
Bingo!

Pensei imediatamente naquilo que ia lendo no twitter à medida que ia estudando, os ecos do discurso, o desespero de algumas pessoas, a falta de lata de outras, a prontidão com que muitas se dispuseram a insultar o nosso Primeiro e a mãe dele, a convocação para inúmeras manifestações. Pensei que enquanto estava essa malta toda a vociferar contra a situação - é um direito que se lhes assiste - estava eu a aproveitar uma folga para estudar depois de um dia intensíssimo que só terminaria depois da uma da manhã. Pensei que se trabalhasse mais meia hora para além do meu horário de trabalho passaria a sair bem mais cedo, a ter fins de semana de dois dias e mais tempo livre, o que nem era assim tão importante porque adoro o que faço. Pensei que o melhor era voltar ao estudo e ao trabalho porque o tempo urge e é necessário é batalhar pela vida e não esperar que a vida tome conta de nós.

Sei bem que há pessoas a passar por enormes dificuldades. Que há muitas famílias a quem sobra mês no fim do dinheiro, que há pais e mães no desemprego e em desespero porque não têm onde conseguir dinheiro para dar de comer aos filhos. Sei-o porque contacto com eles, falo com eles todas as semanas, conheço os seus filhos e já decorei as suas caras de fome e roupas esfarrapadas. Mas nunca os vi em qualquer manifestação e muito menos a faltar ao emprego para ir fazer berrarias. O seu maior desejo, nesta altura, era ter um trabalho, era poderem trabalhar mais meia hora, ou uma, ou meia dúzia, que lhe restituíssem a dignidade de poder voltar a sustentar a família.

É duro, eu sei.
Lidei durante muitos anos com empresas e empresários, com exploradores de mercedes cuja falta de escrúpulos envergonharia qualquer ditadorzeco africano. Conheci alguns que não pagavam salários alegadamente por falta de dinheiro mas faziam gala em exibir aos funcionários as fotos das férias paradisíacas. Conheci também maus funcionários, que faziam tudo para não fazerem nada, sempre com esquemas para sacarem mais dinheiro ao patrão, à segurança social, ao diabo a quatro. Nesse meio já vi de tudo, já tive que engolir de tudo, já me revoltei contra tudo e não tenho ilusões.

Por isso nesta altura apenas tenho pena dos que querem efectivamente trabalhar e não conseguem.E esses andam demasiado ocupados a procurar trabalho, nem que seja em biscates, e não têm nem tempo nem dinheiro para manifestações.

Tenho dito

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