Comecei ontem a ler o Último Segredo, do José Rodrigues dos Santos. Li já quase todos os livros dele, faltando-me apenas, por falta de tempo, O Anjo Branco. Gosto muito do seu estilo, que me torna sempre dependente ao ponto de pegar nos seus livros e apenas os deixar quando os acabo. Aprendo sempre alguma coisa, também porque gosto da pesquisa que ele faz e da forma como a mistura com a história. Para mim é uma espécie de Dan Brown para melhor, com mais rigor, com melhor escrita, com uma maior mestria na gestão das suas histórias. Não o considero, contudo, um grande escritor, daqueles profundos, que nos mexem cá por dentro, que tem a capacidade de nos pôr a questionar as nossas opções de vida.

Este O Último Segredo retoma o tema dos documentos e conclusões supostamente escondidas pelo Vaticano, cheio de organizações super secretas compostas sempre por católicos obscuros que podem contar com um sanguinário que está disposto a obedecer a alguém em nome da fé cega numa qualquer instituição. Os acontecimentos sucedem-se a partir de uma qualquer medo que uma suposta verdade seja finalmente revelada e que faça com que a Igreja se desfaça como um castelo de cartas.

Creio que faria muito bem a estes escritores - e, por maioria de razão, a muitos católicos que entram em frenesim com estes livros - que fizessem um bom curso de catequese ou uma licenciatura em Ciências Religiosas antes de se darem ao trabalho de escreverem estes livros ou de panicar com eles. Uma boa meia-hora com o Prof. Franklin e a primeira coisa que com certeza aprenderiam era a desmistificar a Bíblia com todos os seus números e enredos históricos e ironias e histórias chocantes e milagres e palavras que significam algo de muito diferente, que antes de serem escritas foram contadas por pessoas do seu tempo - e um cristão tem que viver sempre no seu tempo, caso contrário é um lunático - com a sua cultura, com a sua própria circunstância, com a sua forma de ver as coisas, com o seu olhar particular sobre o mundo, porque eram justamente isso: pessoas, que por vezes até o faziam no meio de verdadeiras crises de fé.

Não ver a Bíblia como tendo sido escrita por pessoas - inspiradas por Deus, é certo, mas que eram fundamentalmente pessoas - é não perceber nada de Jesus Cristo, é não perceber que Deus se fez homem, pessoa simples de entre as pessoas simples, justamente para nos ensinar que é na medida em que conseguimos abraçar essa radical simplicidade, é na medida em que conseguimos ser-para-os-outros e viver uma vida de serviço, que justificamos a humanidade que nos diviniza.
Enquanto teimarmos ver a Bíblia como um livro sagrado, intocável, inquestionável, fundamentalista, enquanto nos negarmos, nós próprios, a mergulhar de espírito aberto nas suas páginas, sujeitamo-nos a que venha um qualquer profeta dos tempos modernos e nos consiga dar a volta em duas penadas. O que já seria grave se quem ficasse a perder fosse "apenas" o próprio. O que acontece muito, infelizmente, é que a confusão se gera normalmente entre aqueles que têm a responsabilidade de testemunhar, na vida vivida, o Deus no qual acreditam.
E aí quem fica a perder somos todos nós.

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