Tinha acabado de entrar no carro com os meus filhos quando ouvi bater no vidro. Olhei e não quis acreditar, tal era a alegria. Desde há vários anos que nos vamos vendo apenas no Facebook e agora aqui estava ela, igualzinha apesar dos anos que passaram, a mesma cara de gaiata, o mesmo sorriso aberto e contagiante, os mesmos olhos vivos e sempre atentos, como desde sempre me recordava. "Continuo com mau feitio" dizia ela por entre gargalhadas enquanto olhava para o seu marido procurando confirmação. Rimo-nos imenso, desejamo-nos mutuamente bom ano e fomos à nossa vida. Com um sorriso maior no olhar.

Tenho sempre muitos mixed feelings no que respeita à amizade. Ora bate intensamente, ora adormece até novas instâncias e de repente desperta com uma saudade imensa e me apetece enviar mensagens a toda a gente. Ainda ontem vi uma data de pessoas que estavam num qualquer programa online e lá tive eu que começar meia dúzia de olás para logo a seguir os apagar sem os ter enviado. Esta hesitação, esta dúvida, este medo de me armar aos cágados e não saber guardar a distância que me é, ainda que tacitamente, pedida, é-me permanente. Nunca sei bem se se recordam de mim, que memórias guardam, que tipo de tratamento deu o tempo à distância que a vida impôs entre nós. Gosto de pensar que a maioria das memórias serão boas, que recordarão o que eu recordo: as partilhas, as orações, as caminhadas, o que cantamos, os retiros onde aprendemos imenso... Mas e depois? Digo olá e desligo, até daqui a mais meia dúzia de anos? E que possibilidade terei eu de dar continuidade à responsabilidade de uma amizade reatada? O que mudou agora que permitiria o que na altura a vida não permitiu?

Estava eu a sair de Serralves quando nos cruzamos. Sorriu para mim, sorri para ele e reconheci-o apesar do tempo que passou. Cumprimentamo-nos, trocamos situações, despedimo-nos pouco depois com votos de Boas Festas e um sorriso no olhar. Se ele não tivesse dado sinais provavelmente passaríamos um pelo outro sem ter dado lugar ao encontro, apesar de eu o ter reconhecido.

Hoje enviei olás. Poucos. Há dias em que a saudade não cabe no peito.

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