Ao jantar, em Santiago, conversava com o Padre Almiro sobre as diferenças entre o Caminho e a Peregrinação a Fátima. Antes que eu formulasse a minha recém descoberta constatação, ele confirmou-a: "a peregrinação a Fátima é espiritual, nasce da dor e complementa-se na oração; o caminho de Santiago tem outro tipo de espiritualidade, nasce do próprio caminho. Mas não é devoção."
Este ano, em que no espaço de 15 dias tive a oportunidade de caminhar para ambos os destinos, não mudou o que sinto. Se me convidassem para fazer ambas as peregrinações, optaria sempre por Santiago. Tem muito mais a ver comigo. O caminho mais como descoberta e menos como cumprimento de promessa; o caminho mais como partilha e menos como sofrimento silencioso, e silenciado; o caminho mais como alegria de sentido e menos como sentimento de dor.
Isso não quer dizer, no entanto, que não tenha um profundo respeito pelos peregrinos de Fátima. Num recente programa de televisão, entrevistaram uma série de peregrinos, questionando as suas motivações. Todas elas eram cumprimento de promessas, e nove em dez promessas tinham sido feitas não para benefício próprio mas de um filho, de um neto, de um pai... Questiono muitas vezes a bondade da lógica dessas promessas, que andam mais perto do filho mais velho que do filho pródigo. Torço sempre ao nariz à logica mais ou menos mercantilista do "eu dou se me deres, ou porque me deste" que anda longe da lógica de um Pai cujo amor resulta da mais pura gratuidade. Penso sempre que são coisas dos homens, não coisas de Deus. Mas somos homens e é como homens que sofremos e desesperamos e não conseguimos ter a cabeça em cima dos ombros. É como homens que não conseguimos ver para além dos nossos limites. Mas também é como homens que amamos para além dos nossos limites. E parece-me que peregrinar para Fátima é sempre um ato de amor. Despoletado pelo desespero. Mas ainda assim, um ato de amor.

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