Li recentemente, num artigo de um padre cuja opinião eu respeito, que somos habitados pelo infinito. Que a nossa sede de Deus advém justamente dessa sede de infinito, dessa insaciável e incomensurável incompletude, que por vezes apenas encontra algum repouso na confiança e entrega totais. Eu, por exemplo, apenas encontro o meu repouso autêntico quando recordo Jesus: "faça-se a Tua vontade e não a minha". É na entrega abandonada, confiante e recheada de esperança que descubro o reconfortante colo do Pai. Mas não acontece muito, confesso. Apenas nas situações de desespero total e absoluto. Fora desses momentos é o infinito que inapelavelmente me habita. É a procura constante, o fazer e refazer, o encontro e desencontro, o toca e foge permanente que me faz sentir que ora sou, inteiro, de corpo e alma, ora vou sendo, corpo e alma em permanente desavinda.

Ler de um padre que a incompletude pode ser fome de Deus é importante para mim. Porque muitas vezes caio na tentação de invejar aqueles que, pelo menos à minha vista desarmada, são um feliz bloco monolítico, onde tudo está devidamente acomodado onde devia estar, sem lugar a dúvidas existenciais. Invejo a sua serenidade, a sua clareza, as suas certezas absolutas, a tranquilidade do seu sono, a sua (para mim tão inacessível) coerência de vida. A minha coerência reside apenas na permanência da procura... e na constante insuficiência da resposta.

Há uns anos fiquei muito feliz quando, em Taizé, me possibilitaram uma outra leitura de Lucas 7, 47: "pois digo-te que lhe são perdoados os seus muitos pecados, porque muito amou; mas àquele a quem pouco se perdoa pouco ama". Sempre li o perdão como grande recompensa ao grande amor. Mas em Taizé colocaram a tónica no amor: peca muito quem ama muito. E o perdão, que nunca é recompensa, é uma dádiva ao que muito ama justamente porque quem ama  aceita viver no risco de amar. Ao que pouco se tem a perdoar é porque pouco arriscou viver, preferindo enterrar o seu tesouro à eventualidade de o perder.

Resta-me esta confiança. Que o olhar incompreensível dos homens dê lugar ao olhar amoroso do Pai.

Comentários

Mensagens populares deste blogue