O medo de ser feliz faz-me muita confusão. Aquela coisa de "estou muito bem, alguma coisa está para me acontecer" que impede as pessoas de saborear o momento, de sentir verdadeiramente, abertamente, sem medos ou reservas, como se tivessem medo de subir muito alto só para não caírem. Todas as pessoas que conheço que têm esta tendência são muito mais lestas em sentido contrário, exacerbando o negro como se nunca tivessem visto luz, quase como se encontrassem nessa escuridão o sentido para os seus males. E o pior é que vivem tão à espera que algo mal aconteça que quando acontece - e acontece sempre a todos nós - dizem, cheios de razão: "Vês? Eu não te dizia? Tu nunca vês a realidade!"

Há pouco tempo, num extraordinário encontro de formação, uma das nossas irmãs disse-nos que, durante o seu processo de discernimento, lhe foi pedido para escolher a passagem bíblica que definiria a sua vida. De seguida, deu um breve tempo a cada um dos presentes para pensar qual seria a sua e pediu-nos para o partilharmos. Eu, que nunca tinha pensado nisso nesses termos, não tive dúvidas e escolhi Job 2, 10.

Job foi quem primeiro me seduziu na Bíblia e foi o livro que mais me acompanhou desde que me lembro. A forma como via o que ia acontecendo na sua vida, a naturalidade com que aceitava as coisas boas e as coisas más, contra tudo e contra todos, e a confiança que mantinha em Deus, apesar de todas as vicissitudes, serviram-me muitas vezes de consolo e, fundamentalmente, de guia. Creio que é também por causa de Job que não tenho medo de viver tão intensamente.

Porque razão não o deveria fazer?

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