Com a inauguração do novo Espaço, veio a já esperada onda de velhinhos. Para já apenas chegam, ávidos de conversa e de atenção, com um enorme sorriso, apreciam o espaço e inscrevem-se, cheios de vontade de voltar. Apesar de gostarmos muito de os acolher, para nós, tudo isto está, neste momento, repleto de incógnitas. Não estamos habituados a trabalhar com pessoas destas idade, e quando o objectivo é que permaneçam algumas horas junto de nós, muitas questões se levantam. A primeira chegou justamente com o primeiro velhinho, que, visivelmente debilitado, vinha numa cadeira de rodas. Calculamos logo que seja preciso acompanhá-lo quase permanentemente, nas idas à casa de banho, nos lanches, nas conversas. É bem diferente de lidarmos com os miúdos irrequietos e vivaços, que transbordam energia e vida, e que nos têm preenchido os dias. Por isso iremos tentar apostar no intercâmbio entre ambos, em criar oportunidades para a troca de experiências, de convívio comum, que tão arredado anda da nossa sociedade. A intenção não é separar mas unir, enriquecer mutuamente, tornar aquele Centro o local que falta nas casas e nas famílias de cada um.

Curiosamente, enquanto uns entram nas nossas vidas outros decidem experimentar sair. Uns tios nossos, velhinhos e sem filhos, decidiram experimentar umas férias - forçadas - num lar. Será temporário, pois mantêm a casa deles à qual regressarão ao fim de semana, mas nos seus olhares já se vê a desilusão e o medo. Apesar de irem para um lugar com condições bem melhores que as que têm em casa, apesar de irem para um lugar onde podem estar bem mais acompanhados, apesar de irem ter um lugar apenas deles - têm lá um apartamento - para todos os efeitos saem da sua casa porque não conseguem quem cuide deles como eles precisam. E isso é sempre uma derrota. Há já vários anos que a Isabel vai a casa deles todos os dias depois do jantar e aí permanece mais de uma hora a conversar, a cuidar dos medicamentos, a lavar-lhes os pés, com uma entrega tal que me recorda todos os dias porque a amo tanto. No entanto, apesar da sua dedicação, não nos é possível estar lá em casa deles todo o dia, nem sequer que eles venham para nossa casa. E ultimamente os acidentes vão-se sucedendo: a comida que queima, a porta que fica aberta indefinidamente, os óculos que não se recordam onde estão, os medicamentos que se trocam... Apesar do imenso que nos custa, sabemos todos que é chegada a hora de ser tomada uma decisão, sob pena de se tornar demasiado tarde.

Desde miúdo que aposto na minha velhice. No tempo em que terei tempo, no tempo em que poderei ler, caminhar, viajar, namorar, desfrutar da vida como se não houvesse amanhã - até porque qualquer dia não haverá. Estes contactos com os velhinhos não me roubam essa esperança na minha própria velhice. Pelo contrário! Acredito ainda mais que vou ser um velhinho bem feliz. A minha mais-que-tudo diz que não, que vou ser chato como o caraças. Curiosamente, os meus filhos também dizem o mesmo. E quem me conhece bem também. Mas eu não acredito. O que eles têm é ciúmes de eu vir a ser um velhinho feliz.

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