Disseram-me ontem, ao final da tarde, que afinal os tinha enganado. Que afinal também eu estava a caminho, lá, no meio deles. Não o meu corpo, que esse estava em casa a essa hora, mas o meu corpo é apenas uma pequena parte do que sou.

No final das férias tive mais uma infeliz notícia da morte de mais uma amiga do nosso velhinho e saudoso grupo de jovens. Cancro, mais uma vez. Juntamo-nos, uma vez mais, no seu velório e, como sempre, reatamos as conversas que ficaram suspensas algures no tempo, conversando como se nunca nos tivéssemos separado. Os que pudemos, cantamos no seu funeral. Bastou um curtíssimo ensaio para sabermos e recordarmos o que iríamos cantar e fizemo-lo de forma profundamente identificada e sentida. Ao olhar para a igreja a abarrotar de amigos seus, pensei como, apesar de tudo, seria bom morrer assim.

Na vida não temo muitas coisas. E a esmagadora maioria das que temo estão muito mais ligadas àqueles que amo que propriamente a mim. Mas temo a solidão. Não a solidão física ou a que encontro quando a procuro, e que por vezes tanta falta me faz, mas aquela que poderá decorrer das minhas acções, das minhas atitudes, do meu desamor. A solidão que é consequência do desinteresse, do egoísmo, do umbigo sem limites. Por isso temo que, um dia,  ao olhar para mim, a única coisa que encontre seja um enorme vazio, um enorme nada, um buraco negro que tudo sugou à sua volta.

Uma das formas de me sentir mais feliz é a da redescoberta que habito e sou habitado. Que apesar de todas as vicissitudes, de todas as incongruências, de todas as fragilidades, tenho pessoas imunes ao tempo, para quem o tempo é o tempo de Deus e não o dos homens, para quem e com quem não existe o ontem ou o amanhã, mas que nos habitam de tal forma que tudo é - somos! - mutuamente, verdadeiramente, saborosamente, presente.

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