Alguém me perguntava, num destes dias, se era muito mau não conseguir transmitir aos outros muito do que se passou lá, naquela terra de fim do mundo. Eu sorri e respondi que não, não era muito mau. O que se passa é que há coisas que aconteceram durante aqueles dias que são impossíveis de se transmitir.
Como é que se transmite, por exemplo, que, apesar de estarmos longe como o caraças daqueles que amamos, apesar das saudades que nos cortavam por dentro, apesar do cansaço acumulado, estamos felizes por termos o privilégio de estar naquele lugar, naquela altura, com pessoas fabulosas? Como é que se explica aos outros a explosão de pura alegria que meia dúzia de canções pimbalhescas faz sentir enquanto se arruma uma cozinha, a forma como as defesas de cada um vão dando lugar à partilha, a maneira como estávamos atentos uns aos outros, como sentíamos que as dificuldades, as alegrias, as saudades, as pequenas vitórias e derrotas diziam respeito a todos e cada um de nós?
Não consigo ver esta foto sem sorrir. Muito e muito cá por dentro. Quando cheguei à cozinha e vi como dançavam, a alegria com que o faziam, sem pruridos de qualquer espécie mas dando largas à alegria, como o fizeram de uma forma absolutamente espontânea, como estavam todos, juntos, uns nos outros, apercebi-me que aquela parte da missão - uma das que mais temia - tinha sido um sucesso completo. Apesar de serem pessoas muito diferentes, apesar de estarmos já, naquela altura, perto do fim da missão, apesar dos avisos que nos fizeram que iriam haver alturas em que estaríamos cansados uns dos outros, ali estavam eles, a dar largas à alegria que sentiam por estarem juntos.
Como se fala aos outros desta alegria?
Como se fala aos outros da alegria que eu próprio senti, naquela altura, por ver como os meus meninos estavam bem?
Não se fala.
Tão pouco se guarda.
Não se faz nada.
Com o tempo aprendemos que há coisas assim.
Que são para serem nossas.
Por pura incapacidade de as fazermos sentir aos outros.

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