20110608
Não consegui resistir. Não é nada meu costume colocar por aqui coisas com destinatário. Aliás, normalmente nem penso nisso: escrevo o que me dá na real gana e o máximo que acontecerá é referir-me a algo que ainda anda cá por dentro na sequência de uma conversa mais interessante. É o caso.
Em determinada altura da nossa vida queremos muito ser bem acolhidos. Em nome desse desejo comprometemo-nos com o que não gostaríamos de nos ter comprometido, dizemos e fazemos coisas das quais nos arrependemos antes sequer de abrirmos a boca. Tudo em nome da "normalidade".
Como digo algumas vezes - não muitas, depende da qualidade do meu interlocutor - essa normalidade foi-me vedada à partida.
Porque gaguejo sou anormal, e porque já o sou por essa via, qualquer tentativa de ser normal sempre me pareceu descabida. Claro que houve alturas em que não foi (não é) fácil lidar com os risinhos e o baile que apanhava, mas cedo me apercebi que gaguejar era, à partida, uma ferramenta muito boa para distinguir quem valia a pena de quem era tempo perdido. Mais tarde, fui aprendendo a fazer da gaguez uma vantagem: descobri que as pessoas tendem a prestar atenção quando falo - é do suspense!! - aprendi que podia brincar com o facto. Mais importante ainda, aprendi que independentemente do tempo que levaria a falar, dos olhares de impaciência que me dirigem e dos incómodos que causava, tinha coisas que não poderiam ficar caladas dentro de mim. E decidi falar, apesar de tudo. E aprendi a encarar a gaguez com uma bênção, não como um defeito.
Ás vezes penso que para quem é normal as coisas são muito mais difíceis. Por um lado são pessoas únicas na sua individualidade, nos seus sonhos, na sua forma de viver a vida; por outro lado, sofrem quando não se julgam aceites pelos outros e não conseguem ainda perceber até que ponto isso pode ser bom, particularmente numa civilização onde tudo é cada vez mais igual, mais homogeneizado, mais cinzento. E, justamente por causa disso, menos tolerante, menos paciente, imensamente menos rica.
Ter a capacidade de se ser o que se é efectivamente, é uma daquelas verdades lapalissianas que são fundamentais para se poder alcançar a felicidade.
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