Vi ontem uma primeira reportagem que a SIC está a passar acerca do cancro. A determinada altura, um paciente - que me pareceu daquelas pessoas extraordinárias que tudo suportam - dizia que enfrentava com facilidade as dores próprias. Difíceis eram as das mulheres da sua vida: a mãe, a mulher e a filha.

Pensei logo no que faria se fosse comigo.

Há pouco tempo estava na cavaqueira com a minha filha mais velha e até nos rimos: quando se sente apertada, sob stress, a sua vontade mais incontrolável é dormir. Tal como eu.

Desde sempre que sou habitado por heróis e super heróis e cavaleiros e donzelas fechadas nas mais altas torres dos altos castelos. Desde sempre que me imagino a salvar donzelas em perigo e a protegê-las contra todos os perigos do mundo. Desde sempre que eu me vejo do lado dos fortes, dos salvadores, dos protetores. E estive desde sempre do outro lado!

Via a reportagem e só pensava na colonoscopia que fiz recentemente. Enquanto estive deitado, à espera para ser levado pelas enfermeiras, só pensava como era difícil para mim estar naquela situação onde tudo me dói: o despir-me, o vestir aquela bata azul, a forma condescendente como falam comigo, a agulha a entrar na pele, ser transportado na maca a ver os candeeiros brancos a passar por cima de mim, o pânico do que se passará enquanto estou sedado e completamente à mercê... depois da intervenção só pensava que detestaria repetir tudo aquilo. Depois a enfermeira veio e disse-me que não conseguiu ver tudo e que tenho que repetir daqui a seis meses e eu engoli em seco, e... lá terá que ser.

Ontem, enquanto via aquele rapaz, em tratamento há tanto tempo, a dizer que não tem tempo para morrer e a viver de semana e meia em semana e meia, senti-me envergonhado. Jamais seria assim, jamais teria aquela força, jamais enfrentaria o que haveria para enfrentar. E a escolha mais difícil de fazer seria tremenda: permitiria que os meus me acompanhassem no sofrimento ou aceitaria enfrentar tudo com eles? O que lhes doeria mais? Permitir-me-ia ser amado na fragilidade?

Tenho ainda muito que caminhar!!!

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