Foi um jantar de família memorável.

Para começar, uma das minhas filhas cumpriu a tradição: pagar um jantar quando começa a ganhar o seu próprio dinheiro. É-me sempre um pouco estranho quando isso acontece, mas creio que será mais um passo na aquisição de alguma humildade no meu papel de pai, que ainda é, para mim, o de cuidar. Sou, muitas vezes - demasiadas para os meus gostos (para o meu orgulho) - cuidado pelos meus. Mas o tempo não corre para novo, e estas coisas, como todas na vida, ajudam-nos a ir percebendo a transformação do nosso lugar e dos nossos papéis na família.

Depois, pelo intenso debate, na mesa redonda da refeição (reservamos sempre aquela mesa redonda porque é à nossa medida) acerca da fé, da Igreja, da forma como nos inquietamos e vivemos a nossa vida com Deus dentro. É um tema mais ou menos recorrente cá por casa. Educamos os nossos filhos numa fé sem amarras nem obrigações. Com deveres, sim, com exigências, sim, mas apenas aquelas que emanam de Jesus, da vida de Jesus, e não tanto os preceitos da Igreja, na qual vivemos mas não nos sentimos presos. Esta liberdade na fé, esta responsabilidade na forma de viver no quotidiano da fé, transmitimos aos nossos filhos, incentivando a elaboração do seu próprio pensamento, da sua maneira própria de assumir e viver a fé com os outros.

É um risco, eu sei. Mas assumido. Ainda ontem pudemos constatar como eles têm percursos interiores muito diferentes. Mas muito assumidos. Uns mais dentro do esquema habitual, outros a correr mais por fora, no tempo das grandes questões e inquietações da vida, das grandes escolhas. Todos muito saudáveis, atentos e livres, Graças a Deus!

A liberdade tem vindo a adquirir, na minha vida, uma importância cada vez maior. Na forma como me vejo, como vivo, como acredito, como defino e sigo o meu percurso. Não me custa acreditar que seja esse o motivo para que viver não tenha sido - quase nunca é - um passeio no parque. Não é segurança, o que eu procuro na fé, não é palas para os olhos, não é quietude. Mas também não é desafio e inquietude e ultrapassagem pela esquerda. Paradoxalmente, não é a Deus que procuro. Esse eu tenho como certo, como presente na minha vida, tenha eu ou não consciência dessa presença. Se calhar, o que eu procuro constantemente, quem eu procuro na minha fé sou eu mesmo, ou, se quisermos, é aquele exato ponto onde, no mais íntimo de mim, o humano que eu sou se encontra com o divino que Deus me faz ser. É uma demanda sem fim, eu sei. Desassossegada. É a minha demanda.

Ontem, enquanto jantávamos naquela mesa redonda, enquanto discutíamos todos o que verdadeiramente procuramos, só sentia orgulho pela falta de certezas dos meus filhos. Estão todos em demanda. Na sua própria demanda. Que mais pode um pai desejar?

Deus seja louvado!

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