Contrariamente ao que por vezes penso e digo (estas duas coisas andam quase sempre de mãos dadas) eu sinto o peso da idade de uma forma ostensiva. O primeiro impacto foi, curiosamente, físico. Há uns anos olhava-me ao espelho sempre com uma enorme confusão porque via o meu pai. Somos fisicamente parecidos e à tantas no meu imaginário ele ficou como que bloqueado no tempo e eu apanhei-o. Houve uma altura até em que deixei crescer a barba para que me pudesse ver a mim e não ao meu pai do outro lado do espelho. Depois da aparência foram chegando as limitações: as marcas das noites mal dormidas, as pernas pesadas das viagens, as dores nas articulações. Nada disto se coadunava com a imagem que tinha de mim próprio, e muito menos com o fulgor que me ardia no peito. Há pouco tempo, a maturidade. Que, curiosamente, começou a ser percebida de fora para dentro, a medida que outras pessoas se dirigiam a mim interessados na minha própria visão das coisas do mundo. A incredulidade inicial - porque raio vêm ter comigo pessoas que sabem muito mais que eu? - foi dando lugar à rendição que, se calhar, até poderei ter algo para partilhar.

Tive mais um daqueles fins de semana fabulosos. Dos que me acrescentam, dos que me preenchem a alma, dos que me enchem de orgulho e confiança na malta nova que daqui a quinze dias será dona disto tudo. Miúdos da idade dos meus filhos que, tal como eles, apesar da procura, têm já dentro de si todos os ingredientes que nós, os da minha geração, apenas conseguimos - os que conseguimos - vinte anos depois. Esta malta nova tem já uma mundivisão, um querer, uma capacidade que é já capaz de transformar o mundo. Assim eles o queiram. A determinada altura olhava-os e escutava-os, embevecido, pequenino, privilegiado por poder estar ali.

Vou-me sentindo cada vez menos um miúdo. O que é estranho. Natural. Mas estranho. Vou percebendo cada vez melhor o meu lugar, o meu papel, sentindo cada vez menos necessidade de brincar às casinhas ou me armar aos cágados. A procura, sempre presente, vai sendo no entanto cada vez menos generalista, cada vez mais objetiva, localizada, circunscrita ao que é verdadeiramente esencial. Ontem, num pequeno jogo que implicava que pensássemos a uma distância de vinte anos, percebi com clareza esta nova realidade, na qual os sonhos provavelmente terão que dar a lugar às realidades sonhadas. Não é mau. Nem bom. É o que é. É a vida a seguir o seu percurso. Saiba eu acompanhá-la.

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