Se, como canta Sérgio Godinho, a vida é feita de pequenos nadas, tudo o que envolve a vida afetiva é feito de ainda mais pequenos nadas. Pequenos pormenores, pequenos hábitos, que se vão instalando, e às tantas constituem o que verdadeiramente somos como pessoas... e como famílias!
Quem tem filhos sabe que vivemos tempos desafiantes. Antes, quando os miúdos eram pequenos, era fácil: uma cassete vídeo, todos no sofá, e tínhamos mais uma coisa em comum. Consigo cantar todas as canções dos filmes da Disney - e, garanto, faço-o com um enorme gozo - contar as suas histórias e até tenho as minhas personagens favoritas e filmes favoritos e canções favoritas... Quando vieram os telemóveis e os computadores a coisa complicou-se mais um bocadinho. A tentação de cada um - a começar por mim - se refugiar no seu mundo privado é maior e evitar que isso aconteça requer algum jogo de cintura. Mas complicado mesmo foi quando instalamos a internet sem fios lá em casa. Agora não tinha que estar ligado um computador de cada vez, ou um telemóvel de cada vez, mas cada um de nós podia estar no seu quarto contactável com o mundo mas incontactável em casa. Confesso que, mais por brincadeira que por outra coisa - daquelas brincadeiras que sendo-o, são um pouquinho mais que meras brincadeiras - já enviei sms aos meus filhos, que estavam nos seus quartos, para virem jantar. Só para eles perceberem a mensagem... Ah - mas isto não se diz - também as recebi deles.
Há já muito tempo que, lá em casa, a única eletrónica permitida na cozinha é a do micro-ondas. Isto torna as nossas refeições muito partilhadas e naturalmente ruidosas. É muita gente a falar ao mesmo tempo, e no final é comum termos alguém a cantar, e a tocar guitarra ou djambé, ou tudo ao mesmo tempo.
E depois temos outros complementos, juntos. Nesta altura, em que temos óscares, retomamos as sessões cinematográficas das sextas à noite, com uma forte participação do sofá, das mantas, do chá ou chocolate quente e biscoitos - ou bolachas, ou sandes, ou redon (restos de ontem) conforme o apetite de cada um. Há sempre quem adormeça a meio ou no princípio do filme, há sempre quem se recuse a ir para a cama e fique no quentinho da sala, há sempre quem prefira outro filme, mas lá vamos conseguindo, algumas vezes a custo, articular toda esta dinâmica para que possamos estar mais tempo juntos.
Todos sabemos, sem nunca o dizer, que daqui a um ano as coisas serão diferentes. Duas das filhas acabam o seu curso, terão o seu futuro, os seus próprios sofás e as suas próprias companhias para as sessões de sexta à noite. Mas enquanto isso não acontece, vamos saboreando o enorme prazer destes pequenos nadas, como é ver um filme em família.

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