Não é fácil aceitar o que a vida nos vai dando. À medida que o tempo passa vamo-nos tornando mais refinados nas nossas exigências e convencemo-nos que temos direito àquilo que é pura gratuidade. Talvez por isso Job seja a minha inspiração quotidiana. Quando as coisas correm menos bem, respiro fundo, e tento descortinar algo de positivo por entre a escuridão. E isso tem repercussões.
Recentemente fui preterido por ser demasiado otimista, por gostar e confiar demasiado nas pessoas, por esperar delas sempre o melhor. É verdade. Dos que me rodeiam espero sempre o melhor e quando isso não acontece procuro sempre justificar as suas atitudes,  num exercício muito fácil: basta colocar-me no lugar delas e ser o mais verdadeiro possível.
Acredito que a fidelidade a mim próprio, àquilo que eu verdadeiramente sou, me tem aproximado do que tento ser. Curiosamente, é um processo inverso ao que eu pensava que deveria ser o mais natural: primeiro descobriria o que quero ser e só depois caminharia para aí. No entanto, à medida que o tempo passava, eu descobria sempre que estava cada vez mais longe da minha meta. Mesmo sem o perceber na altura, Taizé foi absolutamente decisivo na minha alteração de rota. Ao fim de alguns dias, calada a gritaria interior dos primeiros silêncios forçados exteriormente, pude ir abrindo a porta para me descobrir. Isso, com o tempo, com muito tempo, permitiu que me tenha vindo a revelar-me a mim próprio.
É-me muito importante, esta descoberta de mim. Porque me permite pacificar-me. Permite-me perceber que, afinal, escolho confiar mesmo nas pessoas, que, afinal, escolho mesmo ser otimista, e estou pronto a assumir o que daí advém. É por isso natural que integre de uma forma absolutamente pacífica aquilo que noutros tempos seria entendido como uma rejeição.
Ainda na semana passada, no âmbito de uma palestra sobre a família, me perguntaram se estes anos têm sido compostos apenas por rosas, se não tivemos dificuldades. Sorri, claro. Que mais poderia fazer? Mostrar as marcas dos pregos e da lança aos incrédulos? Para quê? Na realidade, habituados que estamos todos a que todos se queixem de tudo e de todos, por vezes não percebemos que a forma como escolhemos olhar para o que nos acontece é quase sempre mais determinante que o acontecimento em si. E que a forma como acolhemos ou não o que a vida nos vai dando é absolutamente decisiva para a nossa felicidade. Somos nós quem escolhe se o copo está meio cheio ou meio vazio.
Com a passagem do tempo, vou percebendo que o que Job me ensina não é que devemos permanecer fiéis a Deus apesar das provações mas que, para quem encontra em si o lugar onde Deus habita, as provações não passam de acontecimentos passageiros. E que é isso o que nos permite aceitar o que a vida nos vai dando. Com um quase sempre inquietante e incompreendido sorriso nos lábios.

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