Hoje sei que vou ter esta foto a assaltar-me o dia. Tanto quanto percebi trata-se de duas pessoas que morreram no recente acidente de Bangladesh. Como acontece muitas vezes em muitas coisas da vida -  particularmente nas coisas do amor, qualquer que seja a forma de amar que testemunhamos - esta é uma imagem que encerra em si o mais profundo paradoxo, onde o belo e o horrível estão, à primeira vista, em pé de igualdade.

Francamente, não creio que a minha morte seja a pior coisa que me pode acontecer. Nunca o considerei. Acredito que há coisas muitíssimo piores que nos podem acontecer, no topo das quais está, com toda a certeza, a morte de um filho, que todos tememos tanto que remetemos para os confins mais confins de nós próprios para conseguirmos viver.

Numa primeira fase da minha vida, por causa dos imensos livros de aventuras e de guerras heróicas que li, talvez por causa até do cavaleiro da fraca figura que ainda hoje me continua a apaixonar, sempre me pareceu uma boa coisa morrer de forma digna. Mais tarde, com a descoberta da fé, descobri que essas mortes dignas e heróicas enraizavam naquele que é o verdadeiro modelo da entrega: Jesus, o Cristo. A partir dessa altura,  percebi que a questão não seria a forma como morro mas como escolho viver.

Não sou capaz de pensar sequer no horror que deve ter sido sentir um prédio inteiro desabar sobre si e, com ele, toda a vida. Não consigo sequer imaginar o turbilhão das ideias, das sensações, das memórias que assaltarão quem sofre o que estas pessoas sofreram. E não consigo ler, também, o que terá motivado que alguém, naquele momento tão intenso, porventura o mais intenso da sua vida, se tenha agarrado a outro alguém. Poderá ter sido o desespero, poderá ter sido o medo, poderá ter sido a tentativa de salvar esse alguém, ou de não morrer sozinho, de não enfrentar o que viria de mãos vazias, sem qualquer aconchego, sem qualquer calor. Ainda que breve. Ainda que fugaz. Ainda que final.

Acredito que muita pessoas farão o que eu fiz ao ver esta foto: passado o choque, sorrirão. Eu sorri. Porque, de alguma forma, ao me questionar, ao me interpelar, esta foto ajuda-me a acreditar que, se a solidão não é boa companhia para viver, se-lo-á muito menos para morrer.

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