Quando fui para a faculdade  estudar Ciências Religiosas, uma amiga fez-me um aviso que nunca mais esqueci: "Tem cuidado. Num curso desses ou a tua fé tem raízes e sai fortalecida ou corres o risco sério de a perder." Ao longo dos vários anos da faculdade tive sempre bem presente este aviso. Que se revelou verdadeiro. Quando estudava a História da Igreja, a Eclesiologia e outras disciplinas deste género, deparei-me com muitos acontecimentos nossos, da Igreja, que estavam bem longe de Jesus. E isso pode ser verdadeiramente perturbador. Afinal, eu estou completamente imerso na Igreja, faço parte dela, quero fazer parte da sua história, da sua realidade, e nem sempre o legado é aquele que eu gostaria que fosse. Recentemente, isso tornou-se gritantemente evidente com os inúmeros casos de pedofilia que ocorreram no nosso seio. Perante esses acontecimentos, só me resta a vergonha - que nem sequer é alheia mas também minha porque não me posso por de fora quando me é convenientemente - e o silêncio dorido e respeitoso por todos aqueles que sofreram. E, naturalmente, impedir que volte a acontecer. Mas nem tudo é mau. E com este Papa posso até afirmar que tudo é um pouco melhor. Confesso que não acolhi particularmente bem a sua chegada. Eu tenho um fascínio pela erudição - aliás, tenho um fascínio por tudo aquilo que eu sou incapaz de alcançar - e deliciavam-me as horas dedicadas à leitura de tudo o que saía do Papa Bento XVI. Adorava a sua batalha por recuperar o lugar do sabedoria católica junto dos meios eruditos, junto das faculdades e das ciências. E no início o Papa Francisco parecia-me um passo o sentido oposto, do simplismo, do superficial. E era, em parte. Na realidade, o Papa Francisco é um passo em sentido oposto ao que temos tido, mas apenas porque é um passo de regresso a casa. Por isso, à medida que o fui lendo e, sobretudo, fui testemunhando o desassombro com que nos faz regressar aos que habitam as margens e afronta os que se atravessam no caminho do evangelho, fui admirando cada vez mais aquele homem que não hesita nem revela medo. E fico genuinamente feliz quando vejo como são justamente esses que habitam as margens que valorizam mais as suas palavras e os seus gestos. Bastaria isso para ter a certeza que estamos de volta ao caminho certo.

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