Fui visitar a minha avó. Ontem. Domingo. Já há algum tempo que não o fazia. Não me é natural. Lembro-me perfeitamente de, há cerca de cinco anos, me ter apercebido que provavelmente não terei avó por muito mais tempo e me ter imposto passar a visitá-la. Intencionalmente, de quinze em quinze dias. Quase nunca, de quinze em quinze dias. Nunca me é fácil decidir-me visitá-la. De todas as vezes tem que ser uma decisão auto-imposta, porque é minha avó, porque tem que ser, porque fica mesmo feliz quando chego, porque conversamos bastante, apesar da sua memória começar a falhar, porque é minha avó e não tenho outra, por que é minha avó e eu sou neto... É uma decisão sempre muito mais racional que afetiva, embora a afetividade venha ao de cima logo que velho aqueles olhos ainda vivaços e o seu sorriso aberto me acolhe. Nunca fico muito tempo. Apenas o suficiente para conversarmos, perceber que ela está bem, para ela se recordar que eu fui lá, para me livrar da culpa de não a visitar.

Poderia estender tudo isto aos meus pais. Que ainda não visito de quinze em quinze dias, talvez porque são muito mais novos e acredito que ainda os terei por muito tempo. Talvez, quando chegar a altura da minha avó, eu substitua a visita dela pela visita deles. Que irá ter, inevitavelmente, o mesmo caráter auto-imposto, a mesma preocupação de ver e ser visto, a mesma frugalidade temporal, o mesmo desejo de libertação da culpa de não ter uma vontade forte de os visitar.

Não sei o que aconteceu, algures no meu percurso, que me roubou esta vontade de estar por perto. Apesar do percurso algo atribulado, tenho algumas boas memórias da infância, e nos dias bons até chego a pensar que me deixaram um legado bom. Mas há qualquer coisa que não está, que não ficou, que não existe, que tem que ser auto-imposta para que sossegue a alma. Provavelmente, quando partirem, chorarei baba e ranho e lamentar-me-ei do tempo que não nos dedicamos. Até porque não tenho qualquer dúvida que eu amo os meus pais e a minha avó e sei que eles me amam.

Apenas não somos muito próximos.

Comentários

Mensagens populares deste blogue