Costumo dizer que escolhi ser cristão porque o meu Deus nunca me pergunta de onde venho nem o que fiz mas quer saber, fundamentalmente, para onde quero ir. No domingo, a homilia sobre o Pai Bondoso acrescentou algo a isto: o nosso Deus é um Deus que se alegra quando estamos.

Houve muitíssimas alturas na minha vida em que foi fundamental sentir-me acolhido, que não me perguntavam de onde tinha vindo. Ansiava por uma espécie de reset, um renascer, um refazer-me para que pudesse voltar a tentar ser. São sempre alturas em que a imagem que o espelho nos devolve é demasiado cruel para poder ser enfrentada de mãos vazias, em que apenas a solidão nos faz companhia, até porque todos os outros estão - como nós próprios, aliás - mantidos à cuidadosa distância do sorri e acena. É o tempo em que o peso da máscara se torna de tal forma insustentável que começa a cair... e a arrastar a nossa vida com ela. É o tempo em que o que mais desejo é viver numa daquelas torres de apartamentos onde toda a gente é anónima para que não tenha que dar de caras com alguém conhecido. É o tempo em que urge recomeçar!

Apesar de estar numa fase da vida em que começo a gostar da minha herança, não me é nada difícil entender quem tem essa necessidade de voltar sem que lhe façam perguntas. É que por vezes basta acolher, basta abraçar, basta sorrir... e deixar as questões para depois. E aí concordo com o que o meu pároco disse na homilia de domingo passado. Também eu tento estar. Sem querer saber de onde vem. Sem perguntar para onde vai. Vou descobrindo que estar é muito importante. Acolher quem chega e dar tempo, dar espaço, permitir respirar(se) e descobrir(se). Com tempo. Tentando manter a distância necessária para que possam sentir a minha presença sem a impor. Confesso que muitas vezes, nesse equilíbrio difícil, confundo e algumas delas eu próprio fico confuso. Muitas vezes pensam que é desinteresse, que não quero saber, que não estou nem aí. Muitas vezes até eu penso que poderá ser assim. Mas a alegria que sinto, ainda que à distância, ainda que apesar do tempo, quando alguém renasce, desmente-mo. E a felicidade que sinto também confunde aqueles que me são mais de dentro, que não perceberam em mim qualquer preocupação ou movimento para que o renascer fosse mais que uma mera possibilidade.

Sei que somos formatados para fazer. Sei que a fé sem obras não é nada. Sei que gostamos muito da obra feita, por pessoas permanentemente atarefadas. Sei que quando eu não ando a correr de um lado para o outro sou assaltado logo pelo medo de ser dispensável, de terem finalmente descoberto que o que eu faço qualquer um faz e faz melhor. Sei que quando deito a cabeça na almofada é a listagem de tarefas que percorro na tentativa de saber se justifiquei o ordenado desse dia.

Mas sei também que tudo isto é muito estúpido.

Que para quem sou importante, o que é importante é se eu fui capaz de estar.
Sempre que fui preciso.
Sem perguntar de onde vinha
ou para onde ia.

Simplesmente, estar.
Para poder ser com...

Comentários

Mensagens populares deste blogue