Adão e Eva andam cá por dentro. A fazer estragos. Lembrei-me deles hoje de manhã, de repente, quando andava à procura de uma explicação para esta necessidade que por vezes tenho de me esconder. Não dos outros. Mas, justamente, dos meus. Dos que me conhecem, dos que se importam, dos que me importam, porque os outros, nestas coisas, não me dizem nada, nem eu sinto que tenha algo a dizer-lhes. Mas os meus, aqueles que eu considero meus, sejam amigos ou familiares, esses dizem-me tudo, ou, pelo menos, a eles eu quero dizer tudo, sinto que devo dizer tudo, e por vezes não gosto nada do que lhes teria a dizer, se dissesse, ou do que teria a partilha, se partilhasse.

Adão e Eva esconderam-se de Deus, no paraíso, não porque tivessem medo do que Deus lhes pudesse dizer, não por medo do ralhete ou do imenso poder que Deus tem. Não foi do poder de Deus, que se esconderam. Foi do amor de Deus. Foi da vergonha que sentiram quando descobriram que não tinham sido capazes de corresponder à confiança, à ternura, à entrega de um mundo perfeito que Deus tinha construído apenas para eles. E isso, mais que qualquer ralhete, foi-lhes insuportável. E como eu os compreendo!

Ontem tivemos formação de monitores do RAIZ. E depois fomos jantar e jogar bowling. Juntos. Todos. Na formação, feita de partilha e escuta mútuas, eles tinham dito que querem ser monitores porque sentem que no Espaço RAIZ acreditam neles, nas suas capacidades, na sua responsabilidade, e eles sentem-se bem por isso. E por isso acreditam que são capazes de o transmitir aos mais novos, na esperança de serem para eles exemplo e testemunho de como se pode e deve ser. E que eles, pouco depois, no jantar, provaram mais uma vez que já sabem ser.

Gostarmos de alguém, confiarmos em alguém, colocarmo-nos nas mãos de alguém, confere um poder incrível: o de nos amar apesar de nós. Por isso, para mim, nada há de pior que ver a desilusão no olhar de quem se confiou a mim, de quem me amou, de quem tudo fez para que eu não falhasse... e falhei. Não é por medo que me escondo. Não é porque temo que a partir de agora deixe de confiar em mim. Não é porque tema que vá perder aquele amor, ou aquela amizade profunda que nos une. É justamente porque sei que não o vou perder que me sinto tão envergonhado e me escondo. Porque sei que, mais uma vez, não consegui estar à altura de quem me ama. Porque sei que vai olhar para o abismo em que me encontro para me dar as asas de que necessito. Ainda que não o mereça.

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