Há, no devir, uma sabedoria que me escapa todos os dias.

Desde muito miúdo que, embalado por uma cena de uma banda desenhada de índios e cowboys, quis muito ser chefe índio, com cachimbo e tudo. Na sua aldeia era a ele que todos recorriam em busca da sabedoria. Ele, de cachimbo na boca, pensava longamente nas perguntas e respondia com o mesmo ritmo: vagarosamente, como se até o tempo se curvasse à sua sabedoria.
Ainda hoje me recordo destas férias verdadeiramente grandes. Na cama de rede que pus no meu quintal, embalado pela demanda da sabedoria, li As Mil e Uma Noites de ponta a ponta - que só muito mais tarde percebi - e comecei a ouvir rádios fm e antena 2 - em minha casa apenas se ouvia os parodiantes de lisboa. Foi aí que comecei a tentar acompanhar os ritmos do tempo em que vivia. E foi aí que, mentalmente, comecei a sair do bairro.

Hoje de manhã, debaixo do duche, pensava neste e noutros percursos meus. Recordava aquela meia dúzia (na realidade foram sete) de decisões que se revelaram absolutamente decisivas. Recordava particularmente aquelas que me levaram aos buracos em que me fui metendo. Tentei refazer os meus percursos posteriores, se a minha decisão tivesse sido a correta. E cheguei à conclusão a que muitas vezes chego quando estou verdadeiramente bem: se as minhas asneiras me permitiram chegar como estou onde estou hoje, aqui e agora, então benditas asneiras. Claro que noutras alturas amaldiçoo essas mesmas asneiras, particularmente quando causaram dor, sofrimento e desilusão.

Hoje estive fugazmente com uma amiga que já não via há muito tempo. A primeira coisa que me disse foi que os meus olhos estavam diferentes: mais repousados, confiantes e alegres. Sorri. E pensei imediatamente que há, no devir, uma sabedoria que apenas o tempo me permite ver. Quando está bom tempo.

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