Há já muito tempo que abandonei a pretensão de ser percebido na minha maneira de amar. Cada um terá a sua, fruto do seu entorno pessoal, do amor e do desamor que experienciou, às vezes com dor, outras com inusitada felicidade, e eu, claro, não escapo à regra. 

Eu amo com pudor. 

O amor é uma porta que se abre apenas por dentro, que exige um consentimento e uma disponibilidade interior que nada nem situação alguma consegue forçar. É um diálogo, mútuo, íntimo, profundo, e porque é diálogo é propício a malentendidos, que, porque é profundo, são sempre dolorosos, que, porque são íntimos, nem sempre são portadores da clareza que facilmente tudo resolveria no amor. Há todo um cuidado, revestido de atenção, que se exige no amor. Um constante lidar com pinças onde as palavras, os gestos, as atitudes, os olhares, adquirem um peso que apenas no amor é o seu, específico, exclusivo, absoluto. A forma como olho, como falo, como escuto, como me entrego, a quem amo, é por isso diferente, também dependente da relação específica que tenho com quem amo. Não se ama da mesma maneira os pais e os filhos, os amigos de longa data e os de ocasião, e mesmo de entre todos estes, cada pessoa, cada relação tem uma vida própria que resulta da nossa história comum, da nossa partilha, da interioridade que nos habita.

Eu acredito que é perfeitamente possível amar apesar da distância física. Como não? Alguns dos meus filhos estão fora há algum tempo; não visito frequentemente os meus pais e os meus irmãos; raramente vejo alguns dos meus amigos mais perenes; não sou de estar sempre a telefonar e a combinar coisas e, com toda a sinceridade, prezo muito o meu espaço e o meu silêncio e a minha necessidade de não fazer sala, que normalmente carecem de uma urgência maior que a de me ver rodeado de pessoas, mesmo as que amo. Claro que adoro quando estamos na galhofa à volta da mesa, claro que preciso do encontro dos olhares, claro que o meu coração apenas sossega convenientemente quando vou sabendo que estão bem, que são felizes e que vivem as suas vidas de peito aberto. E claro que sei que, ao mínimo sinal, corremos todos uns para os outros sem qualquer reserva ou questão. Mas é muito bom quando amamos sem mútua dependência. Absolutamente de borla.

E termos a consciência que, por muito que amemos, não possuímos. Nunca.

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