20190712
Uma das coisas boas de se ter muitos filhos é que podemos comprovar, com o coração, como as pessoas são diferentes. E o que faz dela quem são não são compartimentos estanques.
Uma delas conversava comigo um dia destes e, face a alguma circunstancial indefinição, sentia necessidade de voltar a redefinir algumas prioridades. Como nas suas inquietações é muito parecida comigo, eu sabia perfeitamente do que estava ela a falar. e sugeri-lhe que pegasse numa folha de papel e escrevesse o que a preocupava, esquematicamente, por forma a ser mais clara a resolução. Que normalmente é mais simples do que pensamos ser.
Hoje de manhã estava justamente a pensar nessa nossa conversa enquanto prosseguia com a minha rotina matinal, encantado da vida. Os meus filhos acham piada aos meus passos que são, quase invariavelmente, os mesmos todas as manhãs. Tenho as coisas no mesmo sítio, faço as coisas pela mesma ordem, e quando falta alguma delas ajusto-me sem dificuldade mas com alguma sensação de perda. Talvez encontre na previsibilidade da rotina a segurança que preciso sempre ter para avançar. Como corpo e alma são, frequentemente, coisas distintas em mim, talvez a rotina do corpóreo seja necessária para que a alma se possa aventurar. Sobretudo porque sabe que pode sempre voltar.
Nunca tinha pensado nisto!
20190711
Sol na eira, chuva no nabal. Eis uma expressão que utilizo muitas vezes. Em forma de conselho. E que faria bem melhor se guardasse, religiosamente, para uso próprio.
Lembrei-me dele esta semana. Fruto de conversa, de desilusão, de alguma discussão. De indefinição. Minha, claro, que quero sempre o melhor de dois mundos. Impossível, claro. Não é possível servir a dois senhores. Nem partilhar o impartilhável. Acaba-se, irremediavelmente, dividido. E, se partilhar é multiplicar, dividir é diminuir, é cortar pela metade, é não ser nada, muito menos o que se espera, deseja muito, ser. É ficar a perder, é ninguém ganhar, é ser metade do já pouco que se é.
20190709
Volta e meia regresso ao twitter. Porque gosto. E porque preciso.
Gosto do twitter porque lá nada tem filtro. As pessoas escrevem o que diriam na tasca. Como se ninguém ouvisse, como se ninguém lesse, como se não ficasse registado. E leio as coisas mais incríveis! Quando se trata de futebol, então, é completamente irracional. Pessoas que vou vendo e ouvindo e até respeitando pelas suas opiniões e postura perante a vida, aqui perdem completamente as estribeiras e são capazes das maiores barbaridades.
Por isso preciso de ir ao twitter. Para desmistificar. Para me lembrar que todos nós dizemos coisas que preferiríamos calar e que teríamos calado se respirássemos convenientemente, dando tempo para que os nossos dois dedos de testa funcionassem. E se não tivéssemos palco.
Assim, perante a estupidez alheia, não me sinto tão só.
Gosto do twitter porque lá nada tem filtro. As pessoas escrevem o que diriam na tasca. Como se ninguém ouvisse, como se ninguém lesse, como se não ficasse registado. E leio as coisas mais incríveis! Quando se trata de futebol, então, é completamente irracional. Pessoas que vou vendo e ouvindo e até respeitando pelas suas opiniões e postura perante a vida, aqui perdem completamente as estribeiras e são capazes das maiores barbaridades.
Por isso preciso de ir ao twitter. Para desmistificar. Para me lembrar que todos nós dizemos coisas que preferiríamos calar e que teríamos calado se respirássemos convenientemente, dando tempo para que os nossos dois dedos de testa funcionassem. E se não tivéssemos palco.
Assim, perante a estupidez alheia, não me sinto tão só.
Nunca consegui entender o racismo.
A diferença é sempre complicada. Para mim, que gaguejo, sei um bocadinho o que isso é, Numa escala muito pequena, claro, porque normalmente a gaguez até desperta alguma simpatia e cativa quem me escuta. Mas ainda assim é diferença, causa estranheza e reações que não ocorreriam se não existisse. E eu vejo-as. Todas. Mas não há grande estigma nisso. O que não acontece com o racismo.
Trabalho com miúdos brancos, negros, ciganos, ricos, pobres, com inteligências e aptidões diferentes, com religiões diferentes, sem religiões, com boas referências de vida, com péssimas referências de vida. Sou um privilegiado, portanto. A todos eles conheço pelo nome e conhecem-me. Conheço um pouco as suas famílias e os seus percursos. Há algo que os une: são miúdos. Têm os mesmos anseios, as mesmas brincadeiras. E são muito diferentes. Nos seu instintos, nos seus sonhos, na sensação de proteção ou de luta, nos seus anseios, naquilo que eu gosto de chamar o horizonte de futuro. Todos sabem o que á partida os espera. A uns basta que deixem correr o marfim para que a vida lhes sorria, assim, sem esforço; outros sabem que, se adormecerem no pedaço, acordam numa cadeia qualquer ou com filhos aos 15 anos.
O racismo é o tratamento primário da diferença. É preguiçoso, porque se fica pela aparência. É mau porque não liga nenhuma a quem existe por detrás da aparência. É terrível porque não deixa que a pessoa exista, por si só, apenas a sua aparência. E isto é válido para negros, ciganos, indianos, betos, gunas, gays, mulheres, homens, padres, comunistas, portistas, benfiquistas... o que quer que seja que seja algo diferente de nós próprios.
20190701
Suicidou-se. Não morreu, suicidou-se. É muito diferente! Para quem fica. E quanto mais íntima a ligação, maior a diferença, exponencial a culpa. Suicidou-se.
Recuo sempre. Ao choque, inacreditável, de um outro suicídio, ou pretenso suicídio, porque nunca soube a certeza, porque nunca perguntei, porque na altura não me pareceu assim tão importante. Devia ser. Se ainda hoje recuo imediatamente àquele dia, devia ser importante saber. Sei que me recordo como se fosse hoje a questão que imediatamente me assaltou. Onde estava eu? Porque não me ligou? Porque não falou comigo? Será que tentou? Quando foi a última vez que conversamos? Como foi a última vez que conversamos? Conversamos? Tive tempo, dei tempo para conversarmos?
Ontem, depois de conhecida a notícia, dei comigo a pensar na eutanásia. Preferia mil eutanásias a um suicídio. Talvez na ilusão que no processo da eutanásia a solidão está ausente. Uma visão romântica, de certeza, mas ainda assim, arrisco que a solidão no suicídio deve ser absolutamente esmagadora.
Não é a mesma coisa morrer de morte morrida e de morte auto-infligida.
Conheço o desespero. Fomos apresentados numa noite escura, quando dobrava a esquina do desamor, rumo à solidão. Conheço a forma como se insidia, como se faz presença pequena a princípio, avassaladora totalidade, se lhe sermos confiança. Sei como sorri, como nos puxa para o lado para nos sussurrar ao ouvido, como nos apresenta o charco como única possibilidade de futuro.
E conheço o amor. O arqui-inimigo do desespero. A quem dei ouvidos. E o derrotou.
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