Eu gosto dos últimos. Sempre gostei. Talvez porque sejam os meus, o meu meio, aquele onde me situo com maior facilidade, aquele onde eu posso ser eu de peito aberto. Nos últimos existe apenas a realidade, quase sempre de forma bruta, pouco trabalhada, primária, e isso confere alguma tranquilidade. Com os últimos tanto posso receber um abraço como um banano, vindos do nada. Há ali autenticidade. Nos gestos, nas palavraa, nas ações. Gostas, gostas; não gostas, adiante que atrás vem gente. Não é uma questão de gosto, portanto. Talvez de inquietação. Talvez porque quando a balança pende demasiado para um lado eu tenda a olhar para o outro lado. Talvez porque muitas vezes prefiro olhar o olhar das pessoas quando olham um acontecimento que olhar o acontecimento em si. A verdade é que ao longo do fim de semana me dei a perguntar quem são, hoje, os últimos. Sobretudo para nós, cristãos, católicos. Quem são hoje os últimos? Pensamos imediatamente nos que atravessam o mediterrâneo tendo a vida por um fio, pensamos naqueles com que nos cruzamos a dormir nas soleiras das portas, eu penso logo nos miúdos, nos meus miúdos do RAIZ. Esses são os que me vêm à cabeça. Mas, armado em advogado do diabo, dei comigo a pensar nos outros, naqueles em quem normalmente eu não penso quando penso nos últimos. Nos trumps desta vida que fecham fronteiras, que vivem à custa dos outros, que exploram os outros, que conhecem as aparências e nelas chafurdam. Nos Patinhas desta vida para quem a felicidade se encontra nas notas e cotações da bolsa. E dei comigo a perguntar-me se aí habita Deus. E dei comigo a constatar que, claro, aí também habita Deus. E dei comigo a perceber que ser-me-ia infinitamente mais difícil ajudá-los a descobrir Deus que àqueles que de tudo necessitam. E concluí que também esses fazem parte, com certeza, dos últimos. Que merecem o nosso olhar. Apesar de tudo.

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