colónia


Mapas preparados, muitas coisas embaladas, tudo para que não falte nada. Na bagagem interior, no entanto, é que vai o essencial: uma tremenda dose de boa disposição, uma tremenda dose de paciência e, fundamentalmente, uma tremenda dose de improviso.

Pelas minhas conta, este é o meu décimo terceiro ano consecutivo de colónias. Cheguei aqui como chego sempre a estas coisas: contrariado, arrastando os pés, mas lá vou chegando por afinidade, por amor,  por quem tem a arte e o engenho de o fazer: a minha mais-que-tudo. Aos dessa primeira colónia, já quase lhes perdi o rasto. Sei que alguns são já pais e mães, sei que alguns estão ou estiveram na prisão, sei que alguns vingaram na vida e são cidadãos como todos os outros: com maiores ou menores dificuldades, com maiores ou menores sonhos cumpridos. Quando passo por qualquer um deles é sempre uma festa. Qualquer que tenha sido o seu percurso, é sempre bom revermo-nos. Mesmo aqueles que se portavam mal e eram mandados para casa, hoje cumprimentam-me efusivamente e recomendam as colónias aos seus filhos, primos, irmãos ou vizinhos, como uma das melhores experiências das suas vidas.

É um mundo estranho, este. Que não é fácil conquistar, mas, uma vez conquistado, não e fácil largar. Contrariamente ao que muita gente pensa, este é um mundo de afectos fáceis, exacerbados, onde ora se revolta e se insulta, ora no momento seguinte se é capaz da maior doçura. É um mundo onde o futuro é já no dia seguinte, pois não se sabe o que virá a seguir. É um mundo onde tudo é precário: o emprego, o dinheiro, a comida, a casa, as pessoas com que se partilha a casa, os afectos, as famílias. Aqui, raras são as pessoas que têm uma vida estável, ainda que com sacrifício. Raros são os miúdos que chegam ao 9º ano e menos ainda são aqueles que aí chegam sabendo efectivamente alguma coisa. Raros são aqueles que se preocupam com o futuro, que a maioria assume já como previamente definido de tal forma está plasmado no que encontram todos os dias diante dos seus olhos.

Mas uma das coisas que, invariavelmente, mais me marcam, é a enorme disponibilidade dos nossos alunos. A facilidade com que estabelecem pontes com um mundo completamente estranho para si, a facilidade com que abdicam  do conforto, que normalmente consideram fundamental, a facilidade com que dormem no chão, tomam um duche gelado e lavam loiça atrás de loiça e limpam casa de banho atrás de casa de banho, é impressionante. Tenho a convicção profunda que se fossem visto pelos seus pais eles ficariam chocados: uns porque não andaram a criar filhos para isto, outros porque não pensavam que os filhos fossem capazes de tanto!

É também a eles que devo a minha vontade de ir, todos os anos, às colónias.

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