20221129


Vou lendo aqui 

https://www.americamagazine.org/faith/2022/11/28/pope-francis-interview-america-244225

com calma, saboreando, a entrevista que o Papa deu a um orgão de comunicação social norte americano. Não li tudo, ainda, porque gosto de ir toando notas, refletindo, por partes, deixando que as palavras ecoem em mim e tenham a necessária repercussão na minha vida. Nada do que leio na e da Igreja me é estranho, me é inócuo, promove sempre uma reação - por vezes meramente instintiva - da minha parte. Ou concordo, ou discordo, mas tomo sempre uma posição. 

Na parte desta entrevista que já li, quando inquirido acerca da Conferência Episcopal americana, o Papa responde que para ele o que é importante é a relação sacramental entre o Bispo e a sua comunidade. O resto é organizacional.

Sorrio. Não poderia esta mais de acordo. E extrapolo: o importante é a relação íntima de cada cristão, de cada pessoa com o Pai, com Jesus Cristo, mergulhado no Espírito. A Igreja é, para o cuidado e o crescimento desta minha relação de fé, absolutamente essencial, sacramentada, é o lugar onde a minha fé bebe, se desenvolve e se vive (dentro e fora das suas paredes, mas é de Igreja com letra maiúscula que estou a falar). Mas acredito que nada nem ninguém, nem mesmo a Igreja, tem a capacidade de coartar essa ligação intimíssima, profundíssima, pessoalíssima entre o Pai e cada pessoa que procura esse encontro com o Pai. Seja qual for a sua circunstância.

E estou a ver a cara torcida de muitas pessoas quando faço esta afirmação.

20221124


Tenho, não o hábito, mas o propósito, de rezar todos os dias. Para além de fazer parte do que faço - toda a minha vida profissional gira em torno de Deus - faz parte do que sou - toda a minha vida acontece, efetivamente, com Deus dentro. Rezar é-me, por isso, tão natural quanto respirar. No entanto, há dias em que sinto uma imensa saudade de rezar! A verdade é que os dias se vão sucedendo uns aos outros, as pequenas questões, os pequenos trabalhos, o pequeno quotidiano vai avançando, e eu vou saltando pelos dias, com a leveza de um hipopótamos, de nenúfar em nenúfar, tentando manter o equilíbrio impossível, dando-me por satisfeito por chegar ao final do dia vivo e, ainda por cima, satisfeito com o mínimo de eficácia conseguido. E sinto imensa falta da paragem, do nosso mútuo diálogo interior, na serenidade, no encontro profundo, na mútua redescoberta. Sinto a falta do clima interior de Taizé, daquele ritual de chegada à capela, do meu destapar - tiro o gorro, o cachecol, dispo o casaco, descalço as botas e estou pronto para acolher o Senhor - que é preenchido pela oração. Não é que precise de Taizé para o fazer; é que preciso de parar e de me destapar para o  fazer. É outra coisa. É diferente. E preciso de ler. De parar para ler. De serenar para ler. E de ler para serenar. Preciso de um novo ritual. De um outro ritual, Que possa dar o devido espaço ao silêncio, ao recolhimento, à leitura, à oração.

20221102



Volta e meia sinto-me sozinho nesta Igreja que amo e à qual dedico grande parte da minha vida. Não é coisa que me custe assim por aí além, nem é coisa de agora. É de sempre. Provavelmente porque sou um tardio na fé, porque nasci no seio de uma família que ainda não era católica, porque apenas com cerca de 15 anos, e por vias travessas, descobri a imensidão de Jesus, provavelmente por isso tudo e mais alguma coisa, há aspetos na Igreja que eu não entendo e por isso não posso defender. Um deles, que vem recorrentemente à liça, é a questão do purgatório, que está ligado às almas que se pretensamente se salvam graças à nossa oração, que está ligada às intenções das missas e isso tudo.
Eu acredito num Deus infinitamente bom, num Deus que espera até à ultima para acolher quem O busca, um Deus que não depende em nada dos homens a não ser para Lhe abrirmos a porta. Acredito, por isso, em termos meramente hipotéticos, na existência do Inferno, que é "apenas" a negação de Deus. Outra das coisas em que acredito, e que está intimamente ligada a tudo isto, é que estaremos, todos, face a face com Deus, olhos nos olhos, e por Ele seremos acolhidos, da mesma forma, com o mesmo amor, com a mesma disponibilidade e alegria por parte do Pai, independentemente do que tivermos feito nesta vida. Acredito que nada disso terá importância perante um Pai que corre ao nosso encontro para nos abraçar sem sequer nos perguntar o que fizemos e porque o fizemos. Por tudo isto, acredito que, mesmo aqueles que O negaram irão finalmente (re)conhecê-lo e, face ao seu olhar de Amor, a Ele se irão entregar. Todos, repito. Todos de igual maneira, com o mesmo amor, com a mesma alegria. 
Não percebo, por isso, onde encaixa aqui o purgatório. Não percebo as orações pela salvação das almas, como se o amor de Deus estivesse dependente da quantidade de pessoas que por elas reza (não serão estes, aqueles de quem ninguém se lembra e por quem ninguém reza efetivamente, os últimos? E não é para os últimos o olhar do Pai?). Não percebo porque se reza pelas pessoas na missa e muito menos porque se paga para que se reze por elas (quer dizer, até percebo, mas não são bons motivos). 
Eu rezo com os meus mortos, não pelos meus mortos. Rezo com eles porque sei que eles já estão junto do Pai, e por isso têm já uma clarividência que a mim me escapa, que têm uma sabedoria de que necessito, que são já Amor no Amor do Pai, e que por isso me perdoam de todas as vezes que meto água - sem sequer se cansarem de me perdoar essa imensidão de vezes. Rezo com eles porque rezo com os santos, para que me ajudem a ver, para que me ajudem a serenar, para que me ajudem a tentar caminhar o melhor possível. Mas não rezo por eles. Quem sou eu para o fazer?

Bambora

  Não é estranho que nos digam que «ser homem é muitas vezes uma experiência de frustração». Mas não é essa toda a verdade. Apesar de todos ...