Trabalho há tempo suficiente com malta nova para saber que as imagens que muitas vezes são projetadas não correspondem à verdade. Na verdade, não são nem anjos imaculados nem diabinhos à solta, são pessoas em construção num universo muitas vezes demasiado confuso e multidisciplinar para que eles consigam perceber o chão que pisam. Por isso, normalmente, no que toca a malta nova, tenho ambos os pés no chão. Não que não me deixe contagiar e entusiasmar e sonhar e projetar com eles. Pelo contrário, sou muitas vezes quem (ainda) despoleta essa alegria e esse voar para além do que lhes é dado a viver. Há miúdos, então, que pelas suas circunstâncias precisam muito mais de sonhar que de pão para a boca, que esse vão tendo, apesar de tudo. Sim, voo com eles e a partir deles. Muitas vezes. Mas sei que, na melhor das hipóteses, seremos andaimes, nada mais que isso. E que é justamente andaimes, o que deveremos ser. E andaimes unipessoais, feitos à medida de cada um e, mesmo com cada um, adaptáveis a cada circunstância. Quando lidamos com malta nova não há pronto a vestir e muito menos medidas definitivas. É importante por isso, que tenhamos ambos os pés no chão e acolhamos a montanha russa, que pode acontecer num mesmo dia. Ora têm uma atitude que nos faz encher de orgulho, ora têm uma outra que nos leva a perguntar como é possível tamanha barbaridade acontecer. 

E isto é, a meu ver, um sinal de respeito. Por cada um deles. É atendermos a quem vão sendo, a cada momento, sob determinada circunstância. Porque é com cada um deles, com cada circunstância que trabalhamos, é com essa realidade concreta dessa pessoa concreta que temos diante de nós. Não, não são anjos nem demónios, mas pessoas, com confusões e sentidos de humor, não raras vezes mais exacerbados que os dos adultos. Por isso não me parece, de todo, conveniente idealizá-los ou diabolizá-los - encarcerando-os numa qualquer etiqueta - mas trazê-los e às suas circunstâncias para a discussão do que se deve ser e do que não se deve ser. Porque é nessa realidade que ambos nos movemos: educadores e educandos. Estar a desvalorizar qualquer um desses fatores - educador, educando, circunstância em que a a relação acontece - é fazer histórias que poderão ser muito bonitas mas nada têm a haver coma  realidade. É sermos andaimes de construções de areia, que se desfazem logo que nos retiramos.


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