"Olá, sou o Zé".  Não me custa imaginar que do outro lado alguns dos que me lêem respondam, ainda que em silêncio: "olá Zé". É assim que me apresento, invariavelmente, há uma data de anos, justamente porque é assim que me sinto desde sempre. Zé. Só Zé. Simplesmente Zé. Despretensiosamente Zé. Agora é-me fácil, o mais natural possível, para mim, ser este Zé. Mas nem sempre foi assim. Aliás, só muito recentemente tem sido assim. Tornou-o possível a famosa crise masculina dos cinquenta, numa altura em que, face a acontecimentos que me foram profundamente significativos - alguns internos, outros externos - eu entrei em pânico por me perguntar o que diria ao meu Deus quando, como eu acredito que acontecerá. nos encontrarmos olhos nos olhos. Na altura, o Mero e o Lino, num breve espaço de tempo, tiveram esse encontro - e o Jorge faltou ao encontro, felizmente! - e eu perguntava: e se fosse eu? O que diria? Como o diria? Quem seria? e entrei em parafuso. Se normalmente coloco tudo em questão, nessa altura não ficou pedra sobre pedra: tudo derrubei, tudo procurei, fui ao fundo das gavetas que jaziam no fundo dos baús que eu cuidadosamente varrera para debaixo do tapete durante toda a minha vida. E vi-me e escutei-me e questionei-me e perdi-me e reencontrei-me, invariavelmente agarrando as mãos que me eram estendidas e que me certificavam que eu, apesar de mim, era amado. Desde então mudaram algumas coisas mas creio que o essencial permanece, e permanecerá, espero eu. Continuo o mesmo puto maravilhado com a sensação de viver no bazar de brinquedos, continuo à procura de algo mais, continuo a agradecer o imenso que tenho e, agora, a agradecer o que vou conseguindo ser. Louvo a Deus todas as manhãs e agradeço-Lhe todas as noites. Por quem me rodeia, sobretudo. Continuo a sonhar muito, a projetar muito, a querer pouco, a conseguir pouco, e, agora, a ser feliz com isso. Porque sou eu. As camelices são as minhas camelices, as insuficiências são as minhas insuficiências. os defeitos são os meus defeitos. E as escolhas são as minhas escolhas. Conscientes, ponderadas, comprometidas, umas, inconscientes, levianas e descomprometidas outras. São as minhas escolhas, não as renego, mesmo quando incompreendidas. Sobretudo quando incompreendidas. Porque descobri que, quem me ama, ama-me mesmo sem conseguir compreender tudo em mim. E ama-me mesmo não gostando de tudo o que compreende.

"Olá, sou o Zé". Já não me assusta dizer-Lhe. A minha batalha, agora, de todos os dias, é poder vivê-lo como espero, um dia - que venha longe! - dizê-lo: de peito aberto e cabeça erguida e, sobretudo, confiança no Amor.

Comentários

Mensagens populares deste blogue