A inevitabilidade do encontro

 


Poucas coisas me impressionam mais que a solidão. Não aquela procurada, sabiamente interlocutora na e da intimidade, ponto de encontro e de observação, da retoma do fôlego que permitirá o reavivar da caminhada. Esta é, paradoxalmente, uma solidão habitada, plena, prenha de sonhos de futuro. Impressiona-me a outra solidão, a dura, crua, aquela que, empenhada em revelar o tão laboriosa e cuidadosamente escondido, é feita de confronto, de dor, de impossibilidade de fuga ou ocultação. Fatalmente, esta é a solidão que a ausência de palco revela, a que sai da penumbra e aparece à medida que a maquilhagem vai sendo retirada e, com ela, o sorriso e a alegria que, postiçamente, foram usados ao longo do dia. Perante esta, que sorri maldosamente do outro lado do espelho, a nudez desvelada é absolutamente devastadora. E, com sorte e sabedoria, profundamente transformadora.

Creio que todos temos encontro marcado com a solidão. Na verdade, espero que todos tenhamos encontro marcado com a solidão. Porque apesar da dor, uma vida vivida sem esse desvendar de si que apenas pode ser feito a sós significa, provavelmente, uma vida desperdiçada. Há uma inevitabilidade no encontro profundo com a verdade, a nossa verdade, aquela que apenas a cada um diz respeito, e impõe respeito, sob pena de vivermos como perfeitos desconhecidos de nós mesmos. Um encontro que não pode nem deve ser adiado indefinidamente, na vã esperança que custe menos, que doa menos, que o tempo atenue as feridas que escondemos e das quais nos escondemos. Contudo, apesar de não ser esse o efeito provocado pelo tempo, acredito mesmo que o tempo poderá jogar a nosso favor. Porque o tempo também cura as feridas, por mais profundas que sejam. Mas isso apenas acontecerá se, chegado o momento certo – e são tantos e tão variados os momentos certos – não temermos ter a solidão por companheira. E se, apesar da verdade do nosso olhar sobre nós, nos permitirmos renascer.

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